TJ mantém condenação do Estado do Ceará por ação policial que causou cegueira em adolescente

Menino foi atingido no rosto por um projétil de menor letalidade e perdeu a visão total de um olho e a parcial de outro.

Escrito por
Igor Cavalcante igor.cavalcante@svm.com.br
Magistrados do TJCE analisam caso no Plenário do TJCE. Colegiado está sentado, vestindo togas. Diante deles, uma mesa de marmore.
Legenda: Caso foi analisado na 2ª Câmara de Direito Público da Justiça do Ceará.
Foto: Zé Vitor/Ascom TJCE.

O Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE) manteve, por unanimidade, a condenação do Estado do Ceará ao pagamento de indenização por danos morais a um adolescente de 14 anos e aos pais dele. O menino foi vítima de uma ação policial que tentava dispersar um grupo usando armas com munição de baixa letalidade. Atingido no rosto, ele perdeu totalmente a visão de um olho e parcialmente a do outro. 

Com a decisão da 2ª Câmara de Direito Público da Justiça do Ceará, o Estado terá de pagar R$ 30 mil à família.

O caso ocorreu em 27 de fevereiro de 2017, quando o adolescente estava em uma praça durante as festividades de Carnaval e seguia para a casa da tia. Naquele momento, ocorreu um tumulto na praça e o menino foi atingido pelo projétil disparado por um policial.

Ele foi socorrido com ferimentos graves. Laudos médicos apontaram a perda total da visão de um dos olhos e a perda parcial do outro.

R$ 30 mil
em indenização deve ser paga aos familiares do adolescente.

A sentença de primeira instância reconheceu a responsabilidade civil objetiva do Estado e fixou indenização de R$ 15 mil por danos morais diretos ao jovem e R$ 15 mil por danos morais indiretos aos pais, totalizando R$ 30 mil.

O Estado do Ceará recorreu da decisão, alegando que a atuação do policial ocorreu em estrito cumprimento do dever legal e em legítima defesa, excludentes de ilicitude que teriam sido reconhecidas na esfera penal. Sustentou ainda que a absolvição criminal faria com que o caso não precisasse ser analisado novamente na esfera cível e que os valores fixados seriam desproporcionais.

Recurso negado

Ao analisar o recurso, o relator, desembargador Luiz Evaldo Gonçalves Leite, destacou que a responsabilidade civil do Estado, prevista na Constituição Federal, é objetiva e independe da comprovação de culpa, bastando a demonstração do dano e do nexo causal.

Segundo o voto, a absolvição penal com base em excludentes como legítima defesa ou estrito cumprimento do dever legal não afasta, por si só, o dever de indenizar, em razão da independência entre as esferas penal e civil.

“A natureza e extensão dos danos sofridos diretamente pelo ofendido em razão da lesão gravíssima, com impacto permanente, bem como os transtornos que os pais experimentaram ao acompanhar o filho em cirurgias e testemunhar as limitações advindas da referida lesão apontam para a configuração de danos morais diretos e indiretos, como reconhecido na sentença de piso”
Luiz Evaldo Gonçalves Leite
Relator do caso

O colegiado também ressaltou que não houve comprovação de excludente do nexo causal, já que ficou demonstrado que o adolescente foi atingido por projétil disparado durante a ação policial.

O acórdão citou ainda entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF) segundo o qual o Estado responde civilmente por morte ou ferimento decorrentes de operações policiais, salvo prova de causa que rompa o nexo causal, o que não ocorreu no caso analisado.

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Quanto ao valor da indenização, os desembargadores entenderam que o montante fixado é proporcional à gravidade da lesão e está em consonância com a jurisprudência do próprio TJCE em casos semelhantes.

Com isso, o recurso do Estado foi conhecido, mas desprovido, permanecendo integralmente a condenação imposta em primeira instância.

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