Julgamento de acusados de matar dono de comércio que desobedeceu ordem do CV em Fortaleza é marcado

A dupla deve ser julgada pelos de crimes de homicídio quadruplamente qualificado e por integrar organização criminosa. A defesa nega o cometimento dos crimes

Escrito por
Messias Borges messias.borges@svm.com.br
(Atualizado às 22:01)
A foto mostra um mercadinho saqueado em Fortaleza. Há caixas de ovos e vassouras jogados pelo chão
Legenda: Após a morte do comerciante, o mercadinho da vítima foi invadido e saqueado por moradores da região, no bairro Pirambu, em Fortaleza
Foto: VC Repórter

Dois acusados de matar o proprietário de um mercadinho, no bairro Pirambu, em Fortaleza, em outubro de 2024, devem ir a julgamento, um ano depois do crime. O comerciante teria sido assassinado por desobedecer uma ordem da facção criminosa carioca Comando Vermelho (CV) de fechar o comércio dele por conta da morte de um integrante do grupo criminoso.

A Justiça Estadual marcou o julgamento de Alan Gomes da Silva e Luis Filipe Rodrigues do Nascimento para o próximo dia 31 de outubro, às 9h30. A dupla deve ser julgada pelos de crimes de homicídio quadruplamente qualificado (por motivo torpe, com meio cruel, mediante recurso que dificultou a defesa da vítima e com emprego de arma de fogo de uso restrito ou proibido) e por integrar organização criminosa.

A 3ª Vara do Júri de Fortaleza considerou que "há indícios de autoria delitiva, consubstanciados nos relatos de que os acusados, Alan Gomes da Silva e Luis Filipe Rodrigues do Nascimento, participaram da execução da morte de Pedro Feijó Albuquerque, crime que teria como substrato o controle da organização criminosa no bairro de domínio".

O júri popular - formado por sete pessoas comuns da sociedade, a serem sorteadas no dia do julgamento - irá decidir se os réus devem ser condenados ou absolvidos pelos crimes.

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O que diz a acusação

O Ministério Público do Ceará (MPCE) acusou Alan Gomes e Luis Filipe de matarem Pedro Feijó, de 62 anos, dentro do mercadinho da vítima, na Rua Dom Quintino, bairro Pirambu, em Fortaleza, na noite de 11 de outubro do ano passado.

"Conforme apurado, os acusados guardam relação com a facção Comando Vermelho/CV, facção que domina o crime organizado na região. A vítima Pedro, por sua vez, era proprietário de um mercantil e resistiu às ordens emanadas pela organização, fato que determinou o fechamento dos comércios após a morte de um membro do grupo criminoso, e ainda tinha uma boa relação com os policiais militares que realizavam o policiamento ostensivo na região", afirmou o MPCE.

Segundo o Ministério Público, no dia do crime, "a vítima Pedro estava no seu mercadinho, quando foi surpreendido pela rápida aproximação de Alan Gomes da Silva e Luis Filipe Rodrigues do Nascimento. Os criminosos, sem nada anunciar, efetuaram disparos de arma de fogo contra a vítima, gerando os ferimentos descritos no laudo cadavérico".

Após a morte do comerciante, o mercadinho da vítima foi invadido e saqueado por moradores da região. A Polícia Militar do Ceará (PMCE) decidiu enviar uma equipe ao local, para acompanhar a família da vítima enquanto organizava o estabelecimento e retirava produtos mais valiosos.

O Órgão Acusatório descreveu que o Comando Vermelho "se propõe a realizar controle sobre a população que reside no Bairro Pirambu, implementa toque de recolher, limita a circulação de pessoas que transitam no local, rechaça aqueles que mantém uma relação cordial com os agentes de segurança pública".

Isso tudo é uma forma de manifestação de autoridade e meio para firmar seu domínio. Qualquer pessoa que resiste às ações da facção criminosa é considerado inimigo, o que torna o homicídio ainda mais reprovável por sua torpeza."
Ministério Público do Ceará
Na denúncia

O que diz a defesa

A defesa de Alan Gomes Da Silva e Luis Filipe Rodrigues Do Nascimento sustenta, nos Memoriais Finais, que, "analisando as provas produzidas durante a instrução processual, depreende-se que os elementos carreados para os presentes autos não permitem o prosseguimento da imputação do crime de homicídio em desfavor do acusado, face a não comprovação da autoria delitiva".

Conforme a defesa, não há provas para condenar os réus, e "cabe ao Ministério Público comprovar a real existência do delito e a relação direta com a sua autoria, não podendo basear sua acusação apenas no depoimento de terceiros que não presenciaram o ato delituoso".

Com base nas declarações e provas documentais acostadas ao presente processo, é perfeitamente possível verificar a ausência de qualquer evidência que confirme as alegações do denunciante. Afinal, não há provas que sustentem as alegações trazidas no processo, sequer indícios contundentes foram juntados à inicial."
Defesa dos réus
Nos Memoriais Finais

Como a denúncia deixa dúvidas sobre a autoria do homicídio, na versão da defesa, os réus devem ser absolvidos: "Não sendo o conjunto probatório suficiente para afastar toda e qualquer dúvida quanto à responsabilidade criminal dos acusados, imperativa a sentença absolutória. A prova da autoria deve ser objetiva e livre de dúvida, pois só a certeza autoriza a condenação no juízo criminal. Não havendo provas suficientes, a absolvição do réu deve prevalecer".

A defesa também afirma que os clientes não integram facção criminosa. "A mera presunção não é suficiente para concluir que o acusado integra organização criminosa. Além disso, é de conhecimento público que a ausência do Estado nas periferias pobres tornou seus moradores reféns de ordens emanadas por essas organizações criminosas, que impõem restrições, regras e ordens próprias, sendo muitas vezes esses moradores obrigados a cumprir tais ordens, não por fazer parte dela, mas por medo de morrer caso desobedeça", ressalta.

Em nota ao Diário do Nordeste, a defesa dos acusados, representada pelo advogado Roberto Castelo Branco, informou:

Informamos que nossos clientes são inocentes de todas as acusações que lhes são imputadas. Confiamos integralmente na Justiça e no Estado Democrático de Direito, e temos a certeza de que a sua inocência será cabalmente comprovada no tribunal do júri, com estrito respeito ao contraditório, à ampla defesa e ao devido processo legal.

Ressaltamos, ainda, a importância de se preservar a presunção de inocência, prevista no artigo 5º, inciso LVII, da Constituição Federal, até o trânsito em julgado de eventual sentença condenatória.

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