'Era um verdadeiro consórcio com traficantes', diz MP sobre PMs investigados por ligação com tráfico

Foram presos 14 policiais militares nesta terça-feira (29) suspeitos de facilitar o tráfico de drogas na Grande Messejana

(Atualizado às 16:20)
Viaturas da PM estacionadas
Legenda: Patrulhas do Batalhão de Choque cumpriram as ordens de prisão contra os policiais do 16º BPM (Messejana)
Foto: Reprodução/MPCE

Os policiais militares presos nesta terça-feira (29), suspeitos de facilitar o tráfico de drogas em localidades de Fortaleza, liberavam criminosos com mandado de prisão em aberto mediante pagamento. Em um dos casos, a soltura custou ao traficante aproximadamente R$ 3 mil. Os detalhes foram compartilhados em coletiva de imprensa.

A investigação teve início no fim de 2022, a partir de uma denúncia anônima recebida pelo Poder Judiciário. "Esses pseudopoliciais, porque eu não chamo de policiais, são pessoas que já têm a personalidade voltada para o crime", afirmou o promotor de Justiça Adriano Saraiva, coordenador do Grupo de Atuação Especial de Combate às Organizações Criminosas (Gaeco) do Ministério Público do Estado (MPCE).

Nesta terça, foram cumpridos 14 mandados de prisão e 17 de busca e apreensão contra os suspeitos — todos eram lotados no 16º Batalhão da Polícia Militar, em Messejana, no início das investigações.

O inquérito apontou ainda que os policiais tinham um grupo no WhatsApp para trocar informações sobre os crimes que cometiam e que atuavam, sobretudo, em comunidades como o Pôr do Sol e em bairros como Coaçu e Paupina, na Grande Messejana.

Essa denúncia anônima nos trouxe a informação de que um grupo de policiais estava recebendo o que eles denominavam de 'cota de traficantes' que atuavam na Grande Messejana. Começamos a investigar se, de fato, aquelas informações eram verdadeiras, e conseguimos [a resposta]. Não [era] só recebimento de cota, mas extorsões a traficantes e permitir que esses traficantes comercializassem drogas, armas e praticassem todo tipo de violência naquela localidade".
Adriano Saraiva
Promotor de Justiça do MPCE

Além de extorquir os traficantes para permitir que crimes fossem cometidos, os policiais antecipavam quando a Polícia iria fazer alguma abordagem no local, a partir de informações obtidas em sistemas policiais. "Era um verdadeiro consórcio com traficantes", resumiu o promotor do MP.

Também presente na coletiva, o coordenador de Polícia Judiciária Militar e Disciplina da Polícia Militar do Ceará (PMCE), coronel Marcus Monteiro, afirmou que integrantes da Corporação que praticarem crimes dessa forma terão "carreira bem curta". "A carreira dele vai ser bem curta, muito curta mesmo, porque nós estamos fiscalizando, estamos de olho, e vamos combater qualquer tipo de desvio de conduta e irregularidade dentro da nossa instituição", garantiu.

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PMs soltavam traficantes mediante pagamento

Inicialmente, a denúncia apontava que os PMs apenas "protegiam" os traficantes. No entanto, com o tempo, os investigadores descobriram que os suspeitos também liberavam criminosos com mandados de prisão em aberto mediante pagamento.

Materiais apreendidos pela Polícia durante a prisão de policiais militares
Legenda: Com os suspeitos a Polícia apreendeu armas e munições da própria corporação
Foto: Messias Borges

"Eles faziam o levantamento no sistema da Polícia, verificavam determinado alvo com data de prisão em aberto, identificavam esse alvo, abordavam e começavam a negociar a liberação deles sem instalação de procedimento. Isso foi concretizado. Eles exigiam uma quantia em dinheiro e acabavam liberando o traficante. Nesse caso, exigiram acho que R$ 3 mil", exemplificou o chefe da Gaeco.

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Prisões

Dos 16 mandados de prisão, foram cumpridos 14. Dois policiais investigados por compor o grupo criminoso seguem foragidos, segundo o MP. Ao todo, os mandados — incluindo os de busca e apreensão — foram cumpridos em Fortaleza, Itaitinga, Maracanaú, Russas e, também, na capital alagoana, Maceió (onde foi preso um policial que tinha residência naquele Estado).

Um dos policiais presos também foi autuado em flagrante com maconha e cocaína. Além disso, na ofensiva, ainda foram quebrados o sigilo das informações contidas em aparelhos telefônicos e equipamentos de armazenamento portátil e determinada a suspensão do exercício de função pública dos alvos.

A defesa de um sargento preso na operação, composta pelos advogados Micias Bezerra e Francisco José Sabino Sá, informou que "tomou conhecimento da operação policial, na manhã de hoje, que resultou na prisão de seu cliente e que a partir de então solicitará acesso aos autos e todos os elementos de investigação, para ciência do conteúdo".

A Defesa adianta ser improvável que o Sargento esteja envolvido nos crimes investigados, uma vez que está de licença médica para tratamento de saúde, há mais de um ano, em razão de grave enfermidade de que é portador."
Micias Bezerra e Francisco José Sabino Sá
Advogados de defesa

Por fim, a defesa "reitera sua confiança na Justiça Cearense e no respeito ao devido processo legal. Esclarece, ainda, que qualquer tentativa de julgamento antecipado, sobretudo no âmbito midiático, viola os princípios constitucionais da presunção de inocência, do contraditório e da ampla defesa, pilares fundamentais do Estado Democrático de Direito".

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