Líder do PCC no Ceará que estava em presídio de Segurança Máxima é solto
Horas após a soltura, a Justiça expediu um novo mandado de prisão.
Líder da facção paulista Primeiro Comando da Capital (PCC) e dono de uma extensa ficha criminal, Francisco Márcio Teixeira Perdigão, o 'Márcio Perdigão', foi solto na manhã desta sexta-feira (19). 'Márcio Perdigão' estava na Unidade Prisional de Segurança Máxima, na Região Metropolitana de Fortaleza, e foi beneficiado a partir do pedido de habeas corpus impetrado pela defesa dele, representada pelo advogado Bruno Lima Pontes.
A soltura aconteceu devido a uma decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) anulando a prova obtida pela quebra de sigilo de dados telefônicos e telemáticos, que resultou na 'Operação Saratoga', deflagrada em conjunto pelo Ministério Público do Ceará (MPCE) e pela Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS).
A reportagem do Diário do Nordeste apurou que poucas horas após 'Márcio Perdigão' retornar à liberdade, a Justiça do Ceará expediu um novo mandado de prisão contra o denunciado. Agora, o líder da facção está na condição de foragido.
'Márcio Perdigão' estava no Sistema Prisional há nove anos, desde que foi recapturado após uma fuga. Desde 2021, ele foi transferido para o presídio de Segurança Máxima do Estado do Ceará.
O homem é acusado de diversos crimes no Ceará, Piauí e São Paulo, como assalto a banco, sequestro, homicídio e integrar organização criminosa.
PROVA FOI CONSIDERADA ILEGAL
Em 2017, o MP deflagrou a primeira fase da 'Operação Saratoga' contra o PCC. Os alvos eram acusados de crimes, como: tráfico de drogas, associação para o tráfico e organização criminosa. Na época, a operação partiu do acesso aos dados do aparelho de Antônio Gleidson Gomes do Nascimento.
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O juiz de origem (do Tribunal de Justiça do Ceará) recebeu a denúncia e afastou a ilegalidade da prova. A defesa recorreu em instâncias superiores até que, no último mês de novembro, o ministro Rogerio Schietti Cruz, do STJ, decidiu pela nulidade da prova.
"A defesa sustenta a nulidade das provas, diante da devassa em aplicativo de conversa no aparelho de celular sem o consentimento do proprietário e sem autorização judicial. Nesse sentido, afirma que 'os próprios autores do mencionado. Relatório expressam que os dados foram colhidos pela devassa no aparelho celular de uma pessoa que estava apenas detida, e nem mesmo indiciado por qualquer crime'... Assim, aduz que 'as informações colhidas pelos policiais e que motivaram toda a presente força tarefa denominada operação 'Saratoga' partiu de uma devassa ilegal em aparelho celular de pessoa que nem mesmo indiciada por qualquer crime foi".
O STJ entendeu que não haveria prejuízo às investigações se os aparelhos permanecessem apreendidos e que fosse requerida judicialmente a quebra do sigilo dos dados armazenados.
"Entendo que houve violação das normas constitucionais que consagram direitos fundamentais à inviolabilidade das comunicações, o que torna imprestável, no caso concreto, a prova ilicitamente obtida e, por consequência, todos os atos dela decorrentes. É preciso pontuar, contudo, que, a despeito do reconhecimento da ilegalidade da diligência descrita, tal circunstância não conduz à necessária e imediata absolvição do ora paciente", disse o ministro.
"Não se identificou nenhum argumento ou situação que pudesse justificar a necessidade e a urgência, em caráter excepcional, de as autoridades policiais poderem acessar, de imediato (e, portanto, sem prévia autorização judicial), os dados armazenados no aparelho celular do acusado. Ao contrário, pela dinâmica dos fatos e pelo que se infere dos autos, o que se depreende é que não haveria nenhum prejuízo às investigações se os policiais, depois da apreensão do telefone celular, houvessem requerido judicialmente a quebra do sigilo dos dados nele armazenados, o que inclui a agenda com os contatos dos demais envolvidos, sobre os quais recaíram as interceptações".
Rogerio Schietti destacou ainda que o reconhecimento da ilicitude da prova "não tem o condão de macular todo o processo" e que, se eventualmente houver outras provas independentes, o caso deverá "ser analisado com maior profundidade pelo Juízo de primeiro grau ao refazer a sentença".
'FILIAL DO PCC EM CAUCAIA'
Há seis anos, a primeira fase da Operação Saratoga era deflagrada no Ceará. Dois policiais civis e um militar foram presos por envolvimento com a facção criminosa Primeiro Comando da Capital.
Um dos alvos foi Márcio Perdigão, na época já preso.
Outro alvo foi Leandro de Sousa Teixeira, primo de 'Perdigão' e que teria criado no sudoeste de Caucaia uma espécie de 'filial' do PCC.
Leandro tinha domínio sobre a quadrilha, mas continuava devendo fidelidade ao PCC, o que era concretizado a partir do pagamento da 'cebola' (denominação dos criminosos para a mensalidade paga pelos membros da facção que estão fora da prisão) e da negociação e da distribuição de drogas e armas feita em conjunto.
A principal atividade da organização criminosa era o tráfico de drogas, mas também praticava roubos, homicídios, ameaças, receptação e comércio de armas de fogo, com o objetivo principal de manter o domínio da venda de entorpecentes na região.
A investigação do Grupo de Atuação Especial de Combate às Organizações Criminosas (Gaeco), do Ministério Público, iniciada em 2015, se utilizou de interceptações telefônicas autorizadas pela Justiça dos dois primos, entre outros recursos, para desarticular o grupo criminoso.
Através de ligações, os dois homens apontados como líderes do PCC negociavam ações criminosas nas ruas e nos presídios.
Conforme apurou a reportagem, em uma conversa entre os dois primos, em dezembro de 2015, interceptada com autorização judicial, Leandro reclama a Márcio Perdigão de um homem que se identificava como membro do PCC, dentro do presídio, mas era aliado a outra facção. Os primos concordaram que ele podia ser assassinado.
ENVOLVIMENTO DE AGENTES
Outro crime atribuído ao investigado veio a partir de uma ligação de Perdigão a um casal, sugerindo que oferecessem R$ 20 mil a um delegado para liberar dois suspeitos 'parceiros dele'.
Em 2021, cinco policiais militares foram presos na 3ª fase da Operação Gênesis (desdobramento da Saratoga), sob suspeita de protegerem traficantes, ao ponto de escoltar entregas de drogas e de passar informações privilegiadas sobre ações policiais.
Segundo a acusação, a organização criminosa que se instalou no bairro Bom Jardim e em adjacências, em Fortaleza, e no Município de Caucaia, contava com o apoio dos PMs e também era coordenada por Francisco Márcio Teixeira Perdigão.
A 3ª fase da Operação Gênesis ainda identificou que Márcio Perdigão lavava o dinheiro da organização criminosa principalmente em um posto de combustíveis, em Caucaia.