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Soltura de lutador de MMA condenado por estupro repercute na Alece e na Câmara de Fortaleza

Condenado pelo crime sexual deverá recorrer em liberdade, após decisão da Justiça do Ceará

(Atualizado às 16:09)
Plenário da Alece e Plenário da Câmara Municipal de Fortaleza
Legenda: Assunto foi levado aos Plenários das Casas Legislativas pelos parlamentares
Foto: Érika Fonseca/CMFor | Junior Pio/Alece

Parlamentares da Assembleia Legislativa do Estado do Ceará (Alece) e da Câmara Municipal de Fortaleza (CMFor) repercutiram, nas sessões plenárias desta terça-feira (10), a soltura do lutador de MMA e motorista de aplicativo Edílson Florêncio da Conceição, condenado a mais de oito anos de prisão por estuprar uma mulher na saída de uma festa de pré-Carnaval de Fortaleza, em janeiro deste ano. 

O homem foi solto pela Justiça do Ceará nesta segunda-feira (9), cinco dias após a sentença ter sido proferida. Segundo a magistrada que concedeu a soltura, ele deve cumprir o resto da pena em regime semiaberto e aguardar o desfecho de possíveis recursos em liberdade. O benefício, de acordo com a decisão, foi concedido em razão dos “bons antecedentes e ao bom comportamento” e por ser réu primário.

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Na Câmara Municipal

No Legislativo municipal, quem deu primeiro comentou sobre o assunto foi o vereador Paulo Martins (PDT), que utilizou seu tempo no pinga-fogo para ir à tribuna da Casa. Durante sua fala, ele disse que seu pronunciamento foi motivado pelo “sentimento de indignação” e “perplexidade” diante do ocorrido. 

O parlamentar mencionou um vídeo, postado pela própria vítima, em que ela relata como ocorreu o crime. “Ontem, ela própria se expôs, se publicizou, diante das circunstâncias do julgamento deste réu, que foi sentenciado em primeiro grau com oito anos e dois meses de detenção”, pontuou.

“Ele saiu do regime fechado de prisão e passou ao cumprimento do regime semiaberto. Ou seja, hoje, ele encontra-se solto. Aí fico imaginando, realmente, a dor de uma vítima de estupro como essa, saber que aquela pessoa que causou esse mal, que não se acaba em um mês, dois ou três, mas que acompanha essa pessoa até o resto da sua vida”, lamentou, propondo uma mudança na legislação para enrijecer punições contra crimes do tipo.

Em outro momento da sessão, foi a vez da vereadora Adriana Gerônimo (Psol), que prestou solidariedade à vítima. A parlamentar considerou como uma “violência brutal” o estupro ao qual a vítima foi submetida e enfatizou a soltura do condenado. “O Poder Judiciário deu direito ao criminoso que a estuprou recorrer em liberdade”, pontuou a vereadora, tratando a situação como um absurdo.

“Quantas outras mulheres são vítimas de estupro seguido de morte e a impunidade continua imperando aqui na nossa cidade? É muito grave e a Câmara não pode silenciar diante de um crime bárbaro como esse”, frisou, caracterizando a própria exposição da vítima como uma “revitimização”. Adriana, que é presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara Municipal, colocou o colegiado à disposição para atuar no caso.

Já a vereadora Bella Carmelo (PL) iniciou sua fala lendo para os colegas de legislatura o relato da vítima exposto na publicação nas redes sociais. Em seguida, a política evidenciou os elementos que serviram para a condenação do réu. “Nada disso foi suficiente para ele continuar preso, porque a Justiça disse que ele tem 'bons antecedentes, bom comportamento, é réu primário' e por isso pode cumprir a pena em liberdade”, disse a vereadora.

Para Bella Carmelo, a soltura oferece riscos para outras mulheres e à própria denunciante. “É um caso brutal, porque além de ser estuprada, ela só não foi morta porque três policiais chegaram antes. Agora ele está solto como se nada tivesse acontecido. Essa é a Justiça do Brasil hoje”, criticou. Ao encerrar a fala, a liberal repudiou a decisão.

Emocionada, a vereadora Adriana Almeida (PT), por sua vez, prestou “apoio, solidariedade e força” para a vítima. “[Ela] ontem lançou um vídeo muito emocionante e impactante para todas nós mulheres. É inadmissível que depois do depoimento que ela fez ontem, colocou toda sua dor”, disse, narrando os momentos do episódio criminoso como descritos pela própria vítima. 

“Será que não tinha indícios suficientes para a gente dizer que uma pessoa dessa não tem a mínima condição de responder em liberdade?”, indagou a petista em seu pronunciamento. Chefe da Procuradoria Especial da Mulher na CMFor, Adriana Almeida colocou a equipe do órgão à disposição da denunciante.

Ainda na Câmara Municipal, a vereadora Mari Lacerda (PT) reforçou o que foi dito anteriormente e constatou um estarrecimento quanto ao que aconteceu. A parlamentar destacou o fato de que a vítima utilizou das redes sociais como uma saída para chamar atenção para a decisão que permitiu a liberdade do condenado por estupro.

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A vereadora elencou o problema como algo estrutural e mencionou um dado do Ministério da Justiça que contabilizou, no ano passado, uma média de 214 vítimas de estupro por dia. “É um número alarmante. Inclusive, é muito difícil falar sobre estupro, e muitas vezes temos dados sub notificados, porque a dor é tão profunda que a pessoa não consegue tornar aquilo público ou fazer a denúncia”, afirmou.

Na Assembleia Legislativa

Também nesta terça-feira, na Assembleia Legislativa, o deputado estadual Sargento Reginauro (União) deu início para a discussão. Ele considerou o caso como “repugnante” e cobrou a união da classe política para acabar com “esse tipo de absurdo” na legislação brasileira. 

Para o político, seria preciso endurecer as leis para inibir a impunidade. “Isso não é uma questão de direita e esquerda, isso não é uma questão de ideologia A ou B, isso é uma questão de proteção das nossas mulheres”, disse.

“Criminosos de estupro não podem estar livres andando em circulação pela cidade para cometerem outros crimes, têm que ficar atrás das grades. Enquanto ele está livre, essa menina está presa, presa na memória e na lembrança do que aconteceu com ela. Isso é degradante”, completou Reginauro.

Em seu pronunciamento, a deputada estadual Larissa Gaspar (PT) defendeu que é urgente que o Congresso Nacional regulamente penas mais duras para estupradores. A parlamentar também prestou solidariedade à vítima e afirmou esperar que o Tribunal de Justiça do Estado do Ceará (TJCE) reveja a decisão. 

“Não bastasse todo sofrimento que foi imposto à Renata, ela agora é revitimizada. Ela revive toda a dor e todo o sofrimento daquela noite, ao saber que tem um estuprador, que a violentou, andando livremente pelas ruas da nossa Capital, pelo nosso Estado do Ceará. Isso só mostra o quanto o sistema ainda é conivente com a violência que afeta a nós mulheres”, enfatizou Gaspar.  

A última a tocar no assunto durante a sessão desta terça-feira foi Jô Farias (PT). Ela disse que utilizou do expediente para manifestar sua “indignação” e “solidariedade” para a vítima e sua família. “Lamento profundamente que nossas estatísticas digam que a cada oito minutos existe uma mulher sendo violentada nesse país”, citou.

“Podia ser qualquer um de nós mulheres: eu, uma filha, uma neta. Por isso, essa luta não pode ser só das mulheres, tem que ser e deve ser dos homens também”, argumentou Farias. “Isso é muito cruel, a gente precisa rever essas leis”, propôs em outro momento da sua fala. 

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