Legislativo Judiciário Executivo

Isabel Mota: abuso de poder digital ainda é uma incógnita para a Justiça Eleitoral, diz advogada

Conduta ilícita não está expressa nominalmente nas normas eleitorais, mas, segundo advogada, o TSE tem criado “balizadas” para evitar excessos na campanha

Escrito por Igor Cavalcante , igor.cavalcante@svm.com.br
Advogada e professora Isabel Mota comentou sobre as regras eleitorais deste ano
Legenda: A advogada e professora Isabel Mota comentou sobre as regras eleitorais deste ano
Foto: Ismael Soares

Com a pré-campanha dos futuros candidatos a prefeitos e vereadores já “na rua”, o abuso de poder digital tende a ser um dos principais desafios da Justiça Eleitoral no pleito deste ano. A avaliação é da advogada eleitoral e professora de Direito Isabel Mota. Segundo ela, a conduta ilícita não está expressa nominalmente nas normas eleitorais, mas o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) tem criado “balizadas” para tentar reprimir esse abuso.

A análise da advogada ocorreu durante entrevista para a editoria de Política do Diário do Nordeste, da Verdinha e da TV Diário, Jéssica Welma, e para a repórter de Política Alessandra Castro, durante a live do PontoPoder de quinta-feira (12).

Mota pondera que, desde 2002, a postura da Justiça Eleitoral sempre foi de “deixar o debate correr”, evitando interferir na troca de acusações entre os candidatos. “Quase tudo estava valendo (...) e, às vezes, os candidatos ficavam se sentindo injustiçados, porque eles têm tempos desiguais de propaganda, então tinha que perder seu tempo (para se defender), o adversário inclusive podia usar isso estrategicamente para que ele não falasse suas propostas”, relembra.

“Até a Justiça Eleitoral entender que ela estava no centro do debate quando começou essa onda de questionamentos ao sistema eletrônico de votação. ‘Opa, espera aí, não é assim também não’, então ela sentiu na própria carne, se é que se pode dizer assim, como é difícil se defender quando os meios são difusos. E é isso que a gente tem de dificuldade com o abuso digital, primeiro, não está legislado, segundo, é difuso: onde ele foi praticado?”
Isabel Mota
Advogada eleitoral e professora de Direito

“O abuso digital é uma incógnita, porque ele pode acontecer de várias formas, mas a Justiça Eleitoral já está atenta. E, uma coisa, se alguém fizer e for comprovado esse benefício, pode ser cassado, sim”, acrescenta.

Ela ressalta ainda que esse problema é um desafio mundial e, no caso do Brasil, não há uma lei específica. “Não temos regulação de plataforma, estamos muito embrionários. A Justiça Eleitoral tentou se esforçar para que, pelo menos na resolução do TSE, a gente tivesse um caminho para combater o uso da inteligência artificial, para combater o uso de fake news, um início de regramento, mas é só início”, aponta.

Abusos de poder

A advogada citou também outros tipos de abuso de poder que integram a lista dos chamados ilícitos eleitorais. Tais práticas incluem abuso de poder político, econômico e de meios de comunicação. As condutas podem gerar sanções que vão de multa à inelegibilidade dos políticos condenados.

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Ela explicou ainda sobre outros tipos de abusos que, assim como o digital, não estão expressos na lei nominalmente, mas podem ser considerados ilícitos. 

“O abuso de poder religioso realmente não está legislado, mas ele é uma vertente do abuso de poder que inclusive a Justiça Eleitoral já reconhece dentro da modalidade de abuso de autoridade, e que é possível gerar até cassação, se a gente perceber gravidade o suficiente em uma conduta”

“Diferentemente de uma propaganda, aquela conduta que vai configurar um abuso precisa ser grave, porque a gente está falando de voto, que é a maior expressão da soberania de um povo, e se a gente for retirar a soberania desse voto (...) tem que ser realmente uma conduta séria, que realmente caracterize um benefício desproporcional com a utilização daquele fator: do poder econômico, do poder político ou dos meios de comunicação social”
Isabel Mota
Advogada eleitoral e professora de Direito

Pré-campanha eleitoral

A pouco mais de um mês do início da propaganda eleitoral, que é liberada a partir de 16 de agosto, a advogada destaca que as pré-campanhas eleitorais passaram a ganhar mais visibilidade após a reforma eleitoral de 2015, que, entre outras medidas, reduziu o tempo de campanha. 

“Com isso, se viu que, obviamente, o próprio eleitorado precisava já saber de antemão quem eram as pessoas que tinham interesse em se candidatar, porque antes as reformas e minirreformas não conseguiam mexer em questões estruturais e acabavam mexendo mais na parte da propaganda, porque era mais fácil fazer essa alteração legislativa. Isso ocorria e ocorre em desprestígio do eleitorado, que é quem precisa saber quem são as pessoas”, disse.

Com esse redesenho do tempo de disputa, a advogada alerta que pré-candidatos e candidatos precisam ficar atentos para as condutas irregulares, que são fiscalizadas tanto na campanha efetiva quanto antes disso.

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Na pré-campanha, por exemplo, ela aponta que não se pode pedir voto. “Por outro lado, demonstrar disponibilidade para se candidatar nas próximas eleições, pode. As pessoas foram se assenhoreando disso com o tempo e, hoje, já estão bem assenhoradas (...) Então, por conta disso, como as pessoas começaram a ter conforto de realizar pré-campanha, a grande vedete das infrações é a propaganda antecipada”, afirma.

“É aquela situação em que o pré-candidato ou pré-candidata já começa, no lugar de fazer uma propaganda de pré-campanha, demonstrando que vai se candidatar, anunciando o cargo, antecipando debates, entrevistas, aproveitando toda uma gama. Qual o grande limitador da pré-campanha? É o pedido de votos. Esse pedido não pode ser expresso e também não pode ser implícito, a Justiça Eleitoral está atenta para que essa grande criatividade não esbarre nessa vedação”, conclui.

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