Como ficam as relações entre o Governo Bolsonaro e Legislativo e Judiciário após este 8 de setembro
Cientistas políticos entrevistados pelo Diário do Nordeste analisam o que esperar da crise entre os poderes após reações de Arthur Lira e Luiz Fux
O dia seguinte aos atos do 7 de setembro teve respostas dos demais poderes ao discurso do presidente Jair Bolsonaro (sem partido). Se, por um lado, o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), tentou pacificar os ânimos, a ofensiva do chefe do Palácio do Planalto conseguiu unir a Suprema Corte e resultou em resposta incisiva do ministro Luiz Fux, presidente do Tribunal.
Com reações tanto do Legislativo como do Judiciário, analistas políticos entrevistados pelo Diário do Nordeste avaliam que a tensão entre os poderes deve continuar escalonando no País, o que pode aumentar pressões pelo impeachment do presidente - embora, por enquanto, não haja indicativos de que Lira pretende aceitar algum dos pedidos protocolados na Câmara.
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A cientista política Grazielle Albuquerque, pesquisadora do Sistema de Justiça, define o 7 de setembro como um "ponto de virada" nas relações entre os poderes, que, até então, estavam em uma "paz armada".
"De agora em diante, a tendência é só esquentar. Ainda que tenhamos momentos de menos fervura, não consigo enxergar no horizonte algum arrefecimento. A gente vem subindo o tom da crise institucional", aponta.
Uma tensão que é alimentada pelo presidente Jair Bolsonaro, argumenta o cientista político Cleyton Monte. Principalmente, segundo ele, na relação mantida com o STF.
"A forma com que o Bolsonaro vem conduzindo (a crise) impede o retorno de qualquer harmonia entre o Governo e o Judiciário. Ele está queimando todas as pontes", afirma. "O presidente Bolsonaro aposta no acirramento", acrescenta o pesquisador do Laboratório de Estudos sobre Política, Eleições e Mídia, da Universidade Federal do Ceará (Lepem-UFC).
'Ninguém fechará esta Corte'
O discurso do presidente de Luiz Fux foi o mais incisivo neste dia seguinte aos atos. Ele afirmou que o Supremo "não tolerará ameaças à autoridade de suas decisões" e que a desobediência a decisões, pelo chefe de qualquer um dos poderes, "além de representar um atentado à democracia, configura crime de responsabilidade, a ser analisado pelo Congresso Nacional".
Cleyton Monte destaca que o presidente do STF tem um "perfil moderado" e que tentou, por diversas vezes, um "pacto de moderação" com o presidente Bolsonaro. Contudo, sem sucesso. Sendo o alvo preferencial dos ataques do presidente, também foi da Corte a "reação mais enfática", completa ele.
Grazielle Albuquerque, por sua vez, analisa que o discurso de Fux chama atenção para a União do Tribunal.
"Fux não falou apenas por ele, falou pelo Supremo, o que é raro de acontecer. O bolsonarismo conseguiu unir o Supremo".
Pressão pelo impeachment
Para ela, é necessário sair um pouco do dito nos discursos e olhar para "os movimentos institucionais que podem ser feitos". Na avaliação da cientista política, há três saídas institucionais que podem ser adotadas pelos atores políticos envolvidos na crise entre os poderes.
Duas delas estão no âmbito do Judiciário: o inquérito das fake news, em andamento no STF, e o processo que pede a cassação da chapa formada por Bolsonaro e o vice, Hamilton Mourão - em tramitação no Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
"Essas duas saídas institucionais dão ao Poder Judiciário a responsabilidade de conter um presidente eleito pelo voto, o que é institucionalmente complicado (...) sendo este um poder (escolhido) sem voto", explica. "Seria um ônus muito pesado para o Judiciário".
Diante disso, movimentações recentes de lideranças partidárias podem voltar a dar fôlego a pressões por um pedido de impeachment. "Um impeachment que ganha outros contornos, porque deixa de ser um clamor das ruas e passa a ser uma saída para um problema institucional", detalha.
"Não é mais de um segmento. O projeto do bolsonarismo é um projeto de ataque às instituições. Parlamento e Judiciário precisam preservar o sistema. O Governo indomável com projeto autoritário vira problema dos outros dois Poderes e não mais de um segmento político ou social", completa a cientista política.
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Contudo, a atual conjuntura no Congresso Nacional não favorece o andamento de algum dos mais de 100 pedidos de impedimento protocolados na Câmara dos Deputados.
Reação do Legislativo
Em primeira fala sobre os atos de terça, o presidente da Câmara, Arthur Lira, preferiu um tom de apaziguamento.
"É hora de dar um basta a essa escalada, em um infinito looping negativo", afirmou, dizendo também que "bravatas em redes sociais, vídeos e um eterno palanque deixaram de ser um elemento virtual e passaram a impactar o dia a dia do Brasil de verdade".
Ele também elogiou "todos os brasileiros que foram às ruas de modo pacífico" no 7 de Setembro.
"Mais do que pacificadora, a reação do Lira é de alguém que se mostra como aliado do presidente. Que vai acompanhá-lo, não vai iniciar nenhum processo de impeachment", avalia Cleyton Monte.
Apesar de não ter se manifestado após os discursos de Bolsonaro durante os atos, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), cancelou as sessões desta semana na Casa. Para o pesquisador, apesar de mais crítico a Bolsonaro, a reação do senador ainda é "tímida diante da gravidade da situação".
Peso das lideranças partidárias
Sem condutas incisivas dos presidentes das duas casas do Congresso, as lideranças partidárias devem ter peso na reação do Legislativo à tensão provocada pelo Governo. Partidos com grandes bancadas - como o PSD e o MDB - avaliam posicionamento não apenas quanto ao Governo, mas quanto a um possível apoio ao pedido de impeachment.
O PSDB decidiu, nesta quarta, fazer oposição a Bolsonaro, mas adiou decisão sobre eventual processo contra o presidente.
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As movimentações, para Cleyton Monte, podem pressionar Lira, que não citou impeachment em seu discurso. "O Lira é uma figura pragmática, ele não afundaria junto com o presidente", afirma.
"Ele se mostra aliado até o momento em que a conjuntura dentro da Câmara ainda é favorável ao presidente. Quando esses partidos começam a se afastar, o Lira não vai querer ter esse ônus. Quanto mais pressão, vai tornando mais caro o apoio ao presidente".