Oficialmente indicado pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido) nesta terça-feira (13), o advogado-geral da União André Luiz de Almeida Mendonça, 48 anos, tentará ocupar a vaga deixada pelo ministro Marco Aurélio Mello no Supremo Tribunal Federal (STF). Possível novo membro da Corte, ele precisará ser avalizado no Senado até que ocupe o cargo para o qual foi indicado.
Mendonça é pós-graduado em direito pela Universidade de Brasília (UnB) e pastor na Igreja Presbiteriana Esperança, na capital federal. É ainda doutor em Estado de Direito e governança global e mestre em estratégias anticorrupção e políticas de integridade pela Universidade de Salamanca, na Espanha.
A escolha de Mendonça, contumaz defensor do presidente, representa também um aceno à base evangélica de Bolsonaro, que desde 2019 prometia indicar um nome "terrivelmente evangélico" para o Supremo.
A promessa foi descumprida em outubro de 2020, quando escolheu Kassio Nunes Marques para a vaga de Celso de Mello. Mas agora, com o eleitorado evangélico dividido entre Bolsonaro e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o chefe do Executivo cumpriu o que prometeu.
Quem é André Mendonça?
Nascido em Santos (SP), Mendonça integra a AGU desde 2000, quando encerrou sua atividade como advogado concursado da Petrobras (1997-2000). No governo Michel Temer (MDB), foi corregedor na gestão de Fábio Medina Osório como advogado-geral.
Em outubro de 2002, publicou no jornal Folha de Londrina um artigo otimista sobre a eleição de Lula. No texto, intitulado "O povo se dá uma oportunidade", Mendonça afirma que "o Brasil cresceu e seu povo amadureceu, restando consolidada a democracia não só porque o novo presidente foi eleito pelo povo, mas porque saiu do próprio povo".
"Fato inédito no Brasil. Um país, até então, governado por reis, por presidentes escolhidos em gabinetes ou ainda quando eleitos, lideranças formadas nas camadas sociais mais privilegiadas, sem experiência vivencial com a realidade dos milhões de brasileiros miseráveis e marginalizados (...), pelos próximos quatro anos será governado por um líder popular".
André Mendonça e Jair Bolsonaro
No Governo Bolsonaro, em abril de 2020, Mendonça deixou o comando da Advocacia-Geral da União para assumir o Ministério da Justiça após a saída do ex-juiz Sergio Moro.
Na posse como ministro, foi elogiado pelo presidente.
"Temos aqui um gigante do Vale do Ribeira. Esse pequeno grande homem, de um cérebro, de uma mente invejável. Muito obrigado por existir, meu prezado, depois da Damares [Alves, ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos], terrivelmente evangélico".
Quem trabalhou com Mendonça diz que a religião é algo muito presente no dia a dia dele. Assessores o descrevem como alguém muito educado e atribuem isso à religiosidade. Essa característica agrada a Bolsonaro, que, em uma entrevista recente, disse que o subordinado levou os colegas às lágrimas em uma reunião ministerial quando afirmou sua convicção religiosa.
Polêmicas
À frente do Ministério da Justiça, Mendonça protagonizou episódios polêmicos que o ajudaram a conquistar parte da resistência que encontra até agora no meio político. A maioria deles envolvia a Lei de Segurança Nacional (LSN), um resquício da ditadura militar (1964-1985) que voltou a ser usado contra críticos do presidente a pedido do próprio Bolsonaro.
Segundo relatos de assessores, no começo da gestão Bolsonaro, em sua primeira temporada como ministro da AGU, Mendonça chegou a fazer uma apresentação da LSN, mostrando como a lei estava praticamente morta.
Mas, depois, quando passou a ser instado pelo chefe a defendê-lo daquilo que considerava ofensas, o ministro passou a argumentar que estaria prevaricando se não seguisse a legislação. Um projeto para revogar a LSN está em tramitação no Senado.
Como ministro da Justiça, ele também causou polêmica ao apresentar habeas corpus em favor do ex-ministro da Educação Abraham Weintraub para evitar que um depoimento ao STF no âmbito do inquérito das fake news.
Também no ano passado, ele foi alvo de críticas por causa de um relatório produzido pelo governo sobre a atuação de 579 professores e policiais identificados como antifascistas.
Segundo reportagem do UOL, o Ministério da Justiça, sob comando de Mendonça, produziu um dossiê com nomes e, em alguns casos, fotografias e endereços de redes sociais das pessoas monitoradas.
De volta à AGU
Em março deste ano, Mendonça deixou a pasta da Justiça e voltou a chefiar a AGU. A mudança ocorreu em meio a uma dança das cadeiras promovida por Bolsonaro.
Já novamente como advogado-geral da União, Mendonça voltou a ser alvo de críticas em abril por usar argumentos religiosos para defender no Supremo a reabertura de templos em meio à pandemia de Covid-19.
Ele afirmou que os cristãos estão dispostos a morrer pela fé e fez diversas citações à Bíblia e a Deus. Disse ainda que aquele julgamento não era um debate entre vida e morte e que vivíamos em uma "sociedade tensa" em que parecia ser proibido divergir da posição de outras pessoas.
Indicação
Após sua indicação ao STF ser formalizada, Mendonça divulgou nota em que agradece a Deus "pela vida e por essa possibilidade de servir" o país. Também agradece a Bolsonaro, líderes evangélicos e parlamentares que o têm apoiado.
"Coloco-me à disposição do Senado Federal. De forma respeitosa, buscarei contato com todos os membros, que têm a elevada missão de avaliar meu nome. Por fim, ao povo brasileiro, reafirmo meu compromisso com a Constituição e o Estado democrático de Direito. Deus abençoe nosso país!".
Caminho até a Corte
A indicação é só o primeiro passo rumo a uma cadeira no STF. Para chegar lá, o pastor presbiteriano precisará ser sabatinado e aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado.
Um relator, escolhido entre os integrantes do grupo, produz uma argumentação sobre o candidato. Após a leitura desse relatório, ocorre uma sabatina. O colégio, presidido pelo senador Davi Alcolumbre (DEM-AP), é formado por 27 senadores titulares, além de outros 27 reservas. Tasso Jereissati (PSDB) é um dos titulares, enquanto Cid Gomes (PDT) e Eduardo Girão (Podemos) figuram entre os reservas.
Depois disso da sabatina na CCJ, caso o nome seja aprovado pelos senadores, o escolhido de Bolsonaro ainda precisa ser aprovado pelo plenário da Casa, onde deve receber o voto favorável da maioria absoluta dos senadores (41 dos 81).
Há 127 anos que o Brasil não vê o Senado recusar uma indicação ao Supremo. O Marechal Floriano Peixoto (1891-1894) foi o único presidente que passou por essa situação. O seu governo teve cinco indicações ao STF recusadas pelos senadores, o que ocorreu em grande parte por questões políticas ligadas ao relacionamento do mandatário com os outros Poderes.
As rejeições das cinco indicações para ministro do Supremo Tribunal Federal ocorreram todas em 1894. Os indicados recusados foram: Barata Ribeiro, Innocêncio Galvão de Queiroz, Ewerton Quadros, Antônio Sève Navarro e Demosthenes da Silveira Lobo.
Em busca da aprovação
Para não se frustrar, Mendonça já vinha conversando com senadores para diminuir a resistência a seu nome. O indicado tende a ter mais dificuldade diante da nova tensão entre os Poderes provocada por declarações golpistas de Bolsonaro, que, sem provas, acusa fraudes nas eleições e chegou a acenar com a possibilidade de que o pleito não aconteça no ano que vem.
Caso consiga contornar a situação e seja aprovado pelos parlamentares, Mendonça será nomeado em um decreto publicado no Diário Oficial da União e toma posse em até 30 dias. Depois disso, ele pode ficar no cargo de ministro até se aposentar compulsoriamente ao cumprir 75 anos, renunciar ou sofrer impeachment.
Confira a atual composição do STF e quem indicou cada ministro
Gilmar Mendes
Indicado por: Fernando Henrique Cardoso (PSDB)
Data: 20/6/2002
Ricardo Lewandowski
Indicado por: Lula (PT)
Data: 16/3/2006
Cármen Lúcia
Indicado por: Lula (PT)
Data: 21/6/2006
Dias Toffoli
Indicado por: Lula (PT)
Data: 23/10/2009
Luiz Fux
Indicado por: Dilma Rousseff (PT)
Data: 3/3/2011
Rosa Weber
Indicado por: Dilma Rousseff (PT)
Data: 19/12/2011
Luís Roberto Barroso
Indicado por: Dilma Rousseff (PT)
Data: 26/6/2013
Edson Fachin
Indicado por: Dilma Rousseff (PT)
Data: 16/6/2015
Alexandre de Moraes
Indicado por: Michel Temer (MDB)
Data: 22/3/2017
Nunes Marques
Indicado por: Jair Bolsonaro (sem partido)
Data: 5/11/2020