Incertezas com pandemia freiam financiamento imobiliário no Ceará

Crise gerada pelo novo coronavírus contribuiu para que famílias adiassem o sonho da casa própria no Estado. Entidades projetam início da retomada das vendas já neste mês de junho, a partir da reabertura da atividade econômica

Escrito por Carolina Mesquita , carolina.mesquita@svm.com.br
Vista aérea da cidade de Fortaleza, dos bairros Aldeota/Meireles
Legenda: Em abril, foram financiadas 325 unidades no Estado, 33 a menos que em igual mês do ano passado
Foto: Carlos Marlon

Adquirir a casa própria foi um dos muitos planos de cearenses interrompidos pela pandemia do novo coronavírus. Em abril, primeiro mês completo após o início das medidas de isolamento social no Estado, o número de imóveis financiados e o volume de empréstimos no Ceará caíram, respectivamente, 9,22% e 18,78% frente a igual mês de 2019, segundo balanço apresentado ontem (4) pela Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip).

Foram 325 unidades financiadas no Estado em abril, 33 a menos que em igual mês do ano passado. E o volume de crédito disponibilizado no mesmo período despencou de R$ 93,8 milhões para R$ 76,1 milhões. Esse resultado veio após o mercado começar a reagir positivamente em fevereiro e março – mas, no acumulado do ano, o balanço ainda é negativo. 

Entre janeiro e abril, o número de imóveis financiados no Estado caiu 1,65% ante o primeiro quadrimestre do ano passado, passando de 1.454 unidades habitacionais financiadas para 1.430. Já o valor financiado no mesmo período apresentou redução ainda mais acentuada, de 6,5%, indicando possível queda nos preços de venda.

Gráfico com dados sobre a evolução do financiamento de imóveis no Ceará

O presidente do Sindicato da Indústria da Construção Civil do Estado do Ceará (Sinduscon-CE), Patriolino Dias, aponta a pandemia do novo coronavírus como o principal motivo para os resultados negativos.

“As pessoas estão isoladas em casa. Elas até estão procurando imóveis, mas não conseguem fechar negócio por não poderem sair de casa”, diz.

Apesar de admitir que muitas famílias estão com a renda comprometida e com medo de perder o emprego, Dias prevê que já neste mês os números devam melhorar com a reabertura gradual das atividades econômicas.

“As pessoas já estão começando a analisar (a compra de imóveis). Existe apetite e um déficit habitacional alto. Muitas pessoas foram inseridas no perfil de compra com a redução dos juros, mas, por conta da pandemia e desse momento de incerteza, não conseguimos enxergar”.

Preços

O presidente do Sinduscon-CE ainda ressalta que o preço dos novos lançamentos não deve continuar baixo como o valor dos imóveis em estoque.

“Estamos saindo de uma crise de quatro anos que o setor enfrentou. O último trimestre de 2019 e janeiro e fevereiro já foram de uma curva ascendente. Os estoques estão acabando. Estes imóveis ainda têm preços atrativos, porém os lançamentos já vão se adequar à realidade de mercado. Quem puder comprar unidades de estoque estará fazendo excelente negócio”, aconselha.

Repasses federais

Tibério Benevides, presidente do Conselho Regional de Corretores de Imóveis no Ceará (Cresci-CE), lembra que, no início do ano, houve atrasos nos repasses federais para a construção civil, principalmente para o programa Minha Casa, Minha Vida (MCMV). 

“Isso impactou nas vendas e também veio a pandemia. As pessoas pararam de trabalhar, não sabem se estarão empregadas quando voltarem, uma série de fatores que contribuíram para esses índices ruins”, afirma.

Ainda assim, ele também acredita em uma retomada do setor já a partir deste mês. “Devemos voltar com toda a força. O mercado esse ano ainda vai ser muito bom. Sem a pandemia, claro que iria ser muito melhor, poderíamos crescer algo em torno de 2,5% a 3%. Mas ainda assim teremos vários lançamentos, muitas novidades”, prevê.

O presidente do Creci-CE ainda aponta uma possível mudança na preferência de parte dos compradores. Segundo ele, com o isolamento social, as pessoas perceberam que é bom ficar em casa e podem passar a preferir imóveis maiores.

“Sempre vai ter aquele solteiro que está numa situação boa e quer um cantinho seu ou recém-casados que escolham imóveis menores. Mas o pessoal descobriu que ter uma varanda gourmet ou que pelo menos dê para armar uma rede é muito bom”.

Mercado

As condições oferecidas pelo mercado nos últimos meses para fomentar as vendas também são grandes atrativos. Benevides ressalta que, com a oscilação da Bolsa e a baixa rentabilidade das aplicações financeiras, o investimento em imóveis pode se sobressair.

“Com os juros tão baixos, as prestações caíram muito e imóveis sempre valorizam, em qualquer moeda que você coloque”, argumenta.

Ricardo Coimbra, presidente do Conselho Regional de Economia Ceará (Corecon), avalia que a crise, em conjunto com a recessão econômica, enfrentada anteriormente no Brasil, acabaram por esfriar o segmento, tendo em vista o comprometimento da renda das famílias e a dificuldade do planejamento a longo prazo.

Em contrapartida, ele assegura a eficácia dos mecanismos adotados para fomentar o mercado, como a sequência de cortes da Selic e as novas linhas de crédito que tornam o financiamento imobiliário mais acessível. 

"Se não tivesse esses mecanismos, o impacto seria ainda maior. Eles foram estabelecidos em um período que não tinha pandemia e já estavam gerando algum efeito. Mas, então, veio outro fato significativo que gerou muita insegurança e incerteza”, analisa Ricardo Coimbra.

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