Como o envelhecimento acelerado da população impacta a aposentadoria dos cearenses?

População idosa do Ceará deve ser 39,26% do total em 2070

Escrito por Mariana Lemos , mariana.lemos@svm.com.br
foto de idoso em fila de agência do INSS
Legenda: Aumento do número de idosos no Brasil exige mudanças no sistema previdenciário, segundo especialistas
Foto: Agência Brasil

O envelhecimento da população brasileira antes do previsto, identificado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), levanta um debate sobre a sustentação do sistema previdenciário

No Ceará, a expectativa é que a população idosa chegue a 39,26% do total em 2070. A proporção será ligeiramente maior que a do País: 75,3 milhões de brasileiros terão 60 anos ou mais em 2070, o que representará 37,8% da população.

As projeções do IBGE apontam que a proporção de idosos quase duplicou de 2000 a 2023, saindo de 8,7% para 15,6%. A esperança de vida ao nascer também subiu e é de 76,4 anos. Já em 2070, deve chegar a 83,9 anos.

O envelhecimento da população não é um indicador negativo e é consequência do desenvolvimento da região e da melhora nas condições de vida, explica Alesandra Benevides, professora de Ciências Econômicas da Universidade Federal do Ceará (UFC). 

A situação é delicada, entretanto, por indicar a necessidade de mudanças no sistema de previdência social brasileiro. O aumento intenso do número de aposentados no futuro pode pressionar as contas públicos. 

"O Brasil tem um sistema previdenciário de repartição, em que os atuais trabalhadores contribuem para a previdência de quem está aposentado hoje, e assim por diante. É um sistema que depende basicamente do mercado de trabalho, mas quando a gente pensa no aumento da população idosa, normalmente ela está fora desse mercado", explica. 

Uma das ações que pode ser tomada futuramente é a desvinculação do piso das aposentadorias do salário mínimo, segundo Alesandra. Na prática, o benefício deixaria de ser ajustado conforme o piso salarial. A medida já foi ventilada, mas é descartada pelo Governo Federal.

Para abarcar toda a população aposentada no futuro sem restringir os valores, o País precisaria aumentar a quantidade de contribuintes. Contudo, a perspectiva é de que a população brasileira, além de mais velha, ficará menor a partir de 2042.

O número de brasileiros chegará ao máximo em 2041 - 220.425.299 habitantes - e começará a diminuir no ano seguinte. A previsão do início do encolhimento populacional foi adiantada em seis anos, segundo a última análise do IBGE. 

"O encolhimento da população mais jovem significa encolhimento da população economicamente ativa e perspectiva de aumento de rombo previdenciário. A perspectiva de deficit é mais comprometedora no futuro. Não só estamos envelhecendo, como há muitos jovens que não estão estudando nem trabalhando", avalia Alesandra. 

DIMINUIÇÃO DE DIREITOS NÃO É NECESSÁRIA

O sistema de aposentadoria brasileiro passou por uma grande mudança recentemente, com a Reforma da Previdência aprovada pelo Congresso Nacional em 2019. 

A idade mínima para se aposentar passou aumentou para 65 anos para homens e 62 anos para mulheres. Para que o valor da aposentadoria seja equivalente ao salário médio de seus anos de contribuição, o tempo de trabalho necessário saltou para 40 anos

Não há clima político para outra grande reforma previdenciária, mas o cenário demográfico exige novas mudanças, reitera Adriane Bramante, diretora do Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário (IBDP). 

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Para crescer a arrecadação, não é necessário reduzir direitos dos trabalhadores e aumentar novamente as idades e tempos de contribuição. O governo deve agir para atrair os 38,8 milhões de trabalhadores informais para a contribuição, assim como os aposentados que escolhem continuar trabalhando, afirma Adriane.

"A pessoa que se aposenta hoje não quer continuar trabalhando registrada. Se ela puder ficar na informalidade, ela vai ficar. Porque a contribuição da pessoa que está aposentada não 'serve de nada'. Se a pessoa trabalhar mais e puder ter uma revisão da aposentadoria no futuro para ganhar mais, seria bastante atrativo", afirma. 

Adriane critica a propaganda negativa que o próprio sistema previdenciário faz sobre os riscos de 'quebrar' e aumentar o 'rombo financeiro". 

"É necessário focar também na reforma dos militares. Porque a reforma de 2019 praticamente mudou muito pouco dos militares e eles representam um valor de benefício e critérios benéficos em comparação com o regime geral, no qual em torno de 70% da população ganha um salário mínimo", complementa. 

ENCOLHIMENTO DA POPULAÇÃO DO NORDESTE

Sete dos nove estados do Nordeste vão ver sua população diminuir antes do Brasil como um todo: Alagoas, Maranhão, Bahia, Piauí, Rio Grande do Norte, Pernambuco e Sergipe. 

Alagoas deve ter decréscimo do número de cidadãos já em 2027 - mesma situação do Rio Grande do Sul. Já o Ceará começará a perder habitantes em 2043, após o Brasil.

Conforme a projeção do IBGE, a população cearense deve chegar ao máximo de 9.582.324 pessoas em 2042 e começará a decair no ano seguinte, chegando a 8.661.295 habitantes em 2070. 

O instituto identificou que a redução do número de nascimentos foi mais intensa no Nordeste. De 2000 a 2023, o número de nascimentos no Nordeste recuou de 1,1 milhão para 705,6 mil. A região tem a segunda menor taxa de fecundidade do Brasil, média de 1,56 por mulher. 

 Alesandra Benevides afirma que os estados da região também são afetados pela perda de população para outros estados. "Regiões mais ricas atraem trabalhadores, qualificados ou não, de regiões que são mais pobres. É um fluxo migratório intenso de pessoas saindo do Nordeste. Pode não ser a causa completa da situação, mas relação", comenta. 

Helder Rocha, chefe da Seção de Disseminação de Informações do IBGE Ceará, afirma que as projeções de decréscimo da população se baseiam em um conjunto de fatores, como a faixa etária das mulheres produtivas e a quantidade de jovens.

"Comparando um estado com o outro, você compreende porque determinado estado tem um decréscimo populacional daqui a poucos anos e outros só posteriormente. A questão da migração diminuiu significativamente no Nordeste, mas ainda é considerada", explica. 

Os dados e projeções do IBGE são fundamentais para a elaboração de políticas públicas voltadas a cada estado, respeitando as necessidades individuais, destaca Helder. 

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