Comitê Gestor da Internet do Brasil manifesta 'preocupação' com usina de dessalinização em Fortaleza

Entidade emitiu nota apontando "grande risco" às infraestruturas de telecomunicações e Internet já instaladas na Praia do Futuro

Escrito por Redação ,
Trecho da Praia do Futuro em que será construída a primeira usina de dessalinização da água marinha de Fortaleza
Legenda: Trecho da Praia do Futuro em que será construída a primeira usina de dessalinização da água marinha de Fortaleza
Foto: Talles Freitas / Diário do Nordeste

O Comitê Gestor da Internet do Brasil (CGI.br) emitiu uma nota manifestando "preocupação" com o impacto que a construção da usina de dessalinização, na Praia do Futuro, em Fortaleza, pode causar ao desenvolvimento da Internet brasileira.

O documento, publicado na última quinta-feira (1º), aponta possível “impacto e grande risco às infraestruturas de telecomunicações e Internet já instaladas” na área.

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Além disso, a entidade pretende alertar autoridades locais do Estado “para que, por sensibilidade e pelo princípio de precaução, promovam novos estudos com as garantias necessárias para eliminar as possibilidades de riscos à infraestrutura crítica instalada de telecomunicação e Internet”.

Na nota, o comitê ainda sugere que se considere a hipótese da instalação da usina em outro local e afirma disposição para, junto às autoridades públicas, contribuir para subsidiar e orientar decisões futuras.

A entidade ainda levanta diversos pontos que diz ter levado em consideração, como as recomendações do Comitê Internacional de Proteção de Cabos (ICPC) e diversos estudos que teriam sido feitos pela Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), que reiteraram a importância das infraestruturas críticas de cabos submarinos e dos Data Centers na Praia do Futuro, sinalizando a ampliação dos riscos com a construção da usina na área, inclusive com significativos impactos econômicos.

O hub digital de Fortaleza conta, atualmente, com 17 sistemas de cabos submarinos em operação, sendo um dos cinco maiores hubs de cabos submarinos do mundo, com mais de 10 Data Centers instalados na Praia do Futuro. A estrutura representa o segundo maior volume de troca de tráfego IX (Internet Exchange) da Internet no Brasil.

“As diversas interferências da rede de captação de água marinha e de descarte de salmoura com os cabos de fibra óptica de altíssima capacidade, tanto no leito marinho quanto nos dutos de transporte em terra, gerando risco de impacto severo, conforme os estudos citados, podendo provocar a interrupção das comunicações digitais no Brasil”.

CAGECE LUTA PARA PROJETO SER APROVADO E QUER COMEÇAR OBRAS

Para a Companhia de Água e Esgoto (Cagece), o fato de a empresa Angola Cables ter anunciado, no último mês de janeiro, um investimento de R$ 400 milhões em novo data center na Praia do Futuro, confirma ser possível a coexistência entre a usina de dessalinização e os cabos submarinos. O presidente da Cagece, Neuri Freitas, inclusive, já afirmou que a usina não vai "derrubar a internet de ninguém".

A “disputa” pelo território ocorre desde 2022, quando as empresas de telefonia alegaram haver riscos de prejudicar o hub de fibra óptica, cujo funcionamento leva conectividade para a África, Europa, América do Norte, América Central e América do Sul. As teles disseram, ainda, que a infraestrutura também iria inviabilizar novos investimentos. 

"Com relação à usina de dessalinização, a Angola Cables segue aguardando as decisões dos órgãos envolvidos", disse a empresa em nota.

Já a Cagece frisou prever a construção da planta ainda neste semestre, após autorização dos órgãos competentes, sem qualquer alteração no projeto. 

“A companhia informa ainda que vê como positivo o investimento no novo empreendimento da Angola Cables, na Praia do Futuro, confirmando que, baseada nos estudos técnicos e ambientais realizados, é possível a coexistência da planta de dessalinização com as infraestruturas de dados existentes e também com outras que venham a se instalar naquela região”, apontou, em nota.

Anteriormente, a Cagece já havia descartado mudar a usina de dessalinização de lugar porque custaria até R$ 201,5 milhões a mais aos cofres públicos. Para tentar acalmar os ânimos, no entanto, chegou a ampliar a distância do equipamento de 50 metros para 500 metros, com custo adicional de cerca de R$ 40 milhões. 

O que é o CGI.br?

O Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br) é uma estrutura multissetorial responsável por coordenar e integrar as iniciativas relacionadas ao uso e funcionamento da Internet no Brasil.

É composto por representantes do setor governamental, do setor empresarial, do terceiro setor e da comunidade acadêmica, e constitui um modelo de governança na Internet pioneiro, com base nos princípios de multissetorialidade, multilateralidade, transparência e democracia.

CONSTRUÇÃO DA USINA DE DESSALINIZAÇÃO

No fim de dezembro de 2023, a Cagece afirmou que deveria iniciar as obras da Dessal até junho deste ano, e que a usina deveria entrar em operação no início de 2026, beneficiando diretamente cerca de 720 mil pessoas. A licença ambiental do projeto foi aprovada pelo Conselho Estadual do Meio Ambiente (Coema) no último mês de novembro. 

A construção contaria com a Parceria Público-Privada firmada entre a Cagece e a empresa Águas de Fortaleza, com capacidade de produzir 1 m³ de água por segundo. O investimento total estimado é de R$ 3,1 bilhões ao longo dos próximos 30 anos. Desse montante, R$ 526 milhões serão investidos na construção da planta e na instalação de tubulação.

A água dessalinizada será, prioritariamente, para o consumo humano. A planta será acionada quando os volumes de água armazenados nos açudes foram reduzidos e quando a escassez de chuvas entrar em níveis de alerta.

O sal remanescente será encaminhado para um duto submarino. Segundo a Cagece, o projeto é desenhado para promover uma rápida diluição do sal em poucas dezenas de metros, evitando prejudicar o ambiente marinho.

ANATEL FARÁ NOVA ANÁLISE DO PROJETO 

Também no fim de 2023 a Anatel informou que iria analisar o projeto da Dessal, que deverá, segundo a agência, ser complementado "com novos estudos, avaliações e planejamento mais detalhado e específico de gestão de riscos quanto à infraestrutura local, não só considerando a fase de construção, quanto de operação".

Ainda conforme a Anatel, a nova análise foi pactuada em reunião convocada pelo ministro das Comunicações, Juscelino Filho, com o governador Elmano de Freitas e o presidente da Cagece, Neury Freitas.

Em 15 de dezembro do ano passado, a agência reguladora havia informado em nota que se posicionava contra a construção da usina de dessalinização na Praia do Futuro alegando o risco de que a operação da Dessal e a expansão de sistemas de cabos submarinos no local afetaria a Internet no País.

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