O que é preciso para garantir um padrão de educação de qualidade? Foi buscando dar resposta a este questionamento que o conceito do Custo Aluno-Qualidade (CAQ) foi criado. O cálculo estabelece um conjunto de padrões mínimos de qualidade para garantir o processo de ensino-aprendizagem nas escolas. Fazem parte dele gastos com saneamento básico, luz, telefone, equipamentos para laboratórios de ciências ou informática, bibliotecas, dentre outros.
O CAQ começou a ser construído em 2002, a partir de reuniões e pesquisas. Contudo, a Campanha Nacional pelo Direito à Educação lançou uma publicação especificando o que seria o cálculo somente em 2007. E, desde então, ativistas pela educação vêm buscando tirar o CAQ do papel.
O parâmetro chegou a ser incluído no Plano Nacional de Educação em 2014, mas nunca foi regulamentado. Voltou à tona agora, com a presença do conceito escrita na Proposta de Emenda à Constituição 26/2020, que torna o Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação) permanente. Como pode ser feita a execução deste componente é o que, neste momento, é discutido por apoiadores e críticos ao cálculo.
De acordo com Idevaldo Bodião, professor da Universidade Estadual do Ceará (Uece) e membro do comitê cearense da Campanha, um dos motivos para a criação do CAQ está descrito na Constituição Federal de 1988. No artigo 206 da seção de Educação, ficam decididos os princípios do ensino no País, sendo um deles a “garantia de padrão de qualidade”.
“O CAQ lista aquilo que uma escola precisa ter para ser considerada de qualidade e, em seguida, precifica isso. Uma escola tem que ter biblioteca? Tem que ter livros atuais? Quanto custa isso? São perguntas absurdamente essenciais, mas que, se a gente for olhar os dados do nosso censo escolar, você vai ver, sobretudo no Ceará, uma quantidade enorme de escolas que não têm”, explica o educador. O objetivo é também diminuir desigualdades dentro de cada rede escolar. Bodião argumenta que o índice permite maior fiscalização e controle da renda destinada à área.
No novo Fundeb, o CAQ aparece como uma dos fatores que devem ser levados em conta no momento da distribuição dos recursos. A PEC 26/2020 explica que o indicador deve ser definido na Lei Complementar sobre o Sistema Nacional de Educação (SNE), em regime de colaboração entre estados, municípios e União. O relator da proposta, o senador Flávio Arns (Rede-PR), deu parecer favorável à inclusão do conceito e lançou uma cartilha explicando o porquê de defendê-lo.
Críticas à proposta
Há, porém, instituições que questionam e criticam a inclusão do CAQ na PEC. É o caso da organização Todos Pela Educação, que lançou uma análise demonstrando preocupação com a incorporação do índice na constituição.
“Uma lista extensiva de insumos, mesmo que com algum grau de diversificação no território nacional, porém, é ineficaz para garantia do padrão mínimo de qualidade. [...] Alocar recursos para a construção de uma biblioteca, comprar livros e ter bibliotecária não garante alunos leitores e melhores resultados na aprendizagem”, diz o documento, assinado pela coordenadora da Cátedra Unesco de Direito à Educação da Faculdade de Direito da USP, Nina Ranieri, e pela presidente-executiva da organização, Priscila Cruz.
Além disso, o texto crítico argumenta que a definição do custo mínimo com base no indicador gera insegurança para gestores e possibilidades de judicialização, questionando quais seriam as punições cabíveis para aqueles municípios ou estados que não consigam atingir o CAQ. Está escrito: “Sem dúvida, a intenção do legislador é a de melhorar as condições para garantirmos melhores resultados educacionais. No entanto, alguns caminhos, quando analisados em suas várias dimensões e consequências, mostram-se vetores contrários à motivação inicial”.
Procurada pela reportagem, a assessoria de comunicação da Todos Pela Educação afirmou que não haveria tempo na agenda para disponibilizar entrevista sobre o assunto.
Auxílio à gestão escolar
Já a Campanha Nacional pelo Direito à Educação alega por meio de nota técnica que o CAQ poderia auxiliar a gestão e, inclusive, evitar ações judiciais contra estados e municípios, indo contra o argumento apresentado pela organização. “Ele colabora para que os gestores possam organizar os investimentos e também provisionar onde é mais necessário, além de facilitar a prestação de contas e, portanto, a transparência no uso do recurso público”, consta no comunicado.
Na nota, o movimento nacional nega, ainda, querer padronizar escolas, e garante que o CAQ levaria em consideração as diferentes realidades de ensino do País.
Respondendo às críticas, Bodião afirma acreditar que as “argumentações são inconsistentes”. Para ele, os críticos do indicador obedecem lógicas mercadológicas e defendem menos gastos com direitos essenciais. O ativista defende a constitucionalidade do projeto. “É complexo, mas não é porque é complexo que a gente vai deixar de fazer. A gestão do Estado é complexa”.