Justiça nega liberar valores milionários apreendidos com operador e 'laranjas' do Comando Vermelho no Ceará
Uma das contas com valor bloqueado é a de uma empresária. A mulher alega que o dinheiro é decorrente da venda de um imóvel no Rio de Janeiro
A Justiça do Ceará decidiu manter bloqueados valores milionários localizados em contas de pessoas supostamente ligadas ao Comando Vermelho no Ceará. Uma das contas é a de Alexandre Xavier de Sousa, apontado como operador financeiro da facção, tendo movimentado, conforme documentos obtidos pela reportagem, R$ 68,5 milhões entre 2022 e 2024.
A investigação apontou cinco nomes de pessoas "cujas movimentações financeiras ensejaram a análise de diversas outras pessoas físicas e jurídicas, motivando a Polícia Civil do Estado do Ceará a protocolar, perante o Poder Judiciário estadual, uma série de medidas cautelares", como a indisponibilidade de ativos financeiros.
Outra conta que segue bloqueada é a de uma empresária. De acordo com a acusação, a mulher teria recebido R$ 255 mil de Alexandre, tido como parceiro do chefe do CV no Pirambu, o Carlos Mateus da Silva Alencar, conhecido como 'Skidum'. Carlos segue na condição de foragido da Justiça estadual do Ceará, sendo um dos mais procurados no Estado.
A defesa da empresária alegou que a movimentação financeira existente entre ela e Alexandre, 'laranja' do CV, "decorre da venda de imóvel de sua propriedade" localizada no Rio de Janeiro.
O Ministério Público do Ceará (MPCE) destacou que o imóvel objeto do contrato de compra e venda é localizado na parte superior do Complexo do Alemão, "comunidade situada na cidade do Rio de Janeiro, reconhecida como um dos principais redutos do Comando Vermelho no país e notoriamente inacessível às forças de segurança pública".
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"Diante disso, é igualmente plausível a suspeita de que a aquisição desse imóvel esteja vinculada à instalação de uma nova moradia para 'Skidum' na capital fluminense, tendo em vista que este se encontra homiziado naquela localidade, possuindo contra si diversos mandados de prisão pendentes de cumprimento"
COMBATE AO CRIME ORGANIZADO
A acusação também alega ser "inegável que os elementos constantes nos autos indicam a existência de um esquema criminoso de grande envergadura, lesivo à ordem pública e à economia, uma vez que o grupo movimenta quantias vultosas destinadas ao financiamento do tráfico de drogas. Dada a forma como a atividade ilícita é praticada, constata-se que os valores movimentados pelos investigados extrapolam os parâmetros de normalidade".
"Revela-se essencial a adoção de providências que assegurem a indisponibilidade de bens e valores pertencentes aos criminosos ou à organização criminosa, ainda que formalmente registrados em nome de terceiros, comumente denominados 'laranjas'".
O juiz da Vara de Delitos de Organizações Criminosas decidiu no último dia 9 de setembro manter o bloqueio destacando que "uma ordem de sequestro, que tem como objetivo garantir o resultado útil do processo e de assegurar o ressarcimento futuro do eventual dano causado pelo delito".
No total, foram identificadas 68 pessoas físicas e jurídicas no Ceará que realizaram transações com Alexandre de 2022 a 2024. A partir da análise de dados, as autoridades descobriram que os demais supostamente envolvidos no esquema recebiam do 'laranja' valores significativos.
FICHA EXTENSA DE 'SKIDUM'
Carlos Mateus da Silva Alencar, o 'Skidum' ou 'Fiel', consta na Lista dos Mais Procurados da SSPDS, onde é descrito como "chefe de organização criminosa com atuação no bairro Pirambu, em Fortaleza/CE, com antecedentes criminais por homicídio, tráfico de drogas, porte ilegal de arma de fogo" e "indivíduo de alta periculosidade".
10 processos por homicídio que tramitam na Justiça do Ceará têm Carlos Mateus como investigado ou réu (dos quais 9 aconteceram em 2022 e 2023). Segundo a Polícia, 'Skidum' ordena homicídios principalmente na região do Grande Pirambu.
Ele também responde a processos por tráfico de drogas e por integrar organização criminosa. Ao ser procurado pela polícia cearense, 'Skidum' fugiu para o Rio de Janeiro, berço da facção Comando Vermelho.
MANSÕES DO TRÁFICO
Três construções de luxo na favela da Rocinha, que abrigavam criminosos do Ceará, foram demolidas em uma ação conjunta dos Ministérios Públicos do Ceará e do Rio de Janeiro, no último mês de junho.
"O combate ao crime organizado exige união, inteligência e ação integrada. E é com esse esforço interinstitucional que seguiremos firmes, determinados a romper as estruturas do crime e promover a justiça que a sociedade cearense merece", afirmou o procurador-geral de Justiça do Ceará, Haley Carvalho.Conforme informações do MPCE, os imóveis foram erguidos ilegalmente para servir de esconderijo e moradia para integrantes de grupos criminosos oriundos do Estado, foragidos da Justiça.
O MPCE detalhou que as construções de luxo ficavam localizadas na região da Dionéia. Com uma área de aproximadamente 2 mil metros quadrados, os imóveis variavam entre dois e sete andares, com alto padrão de acabamento, incluindo piscina e área gourmet. Também contavam com passagem secreta para uma escada que dava acesso a uma região de mata, para tentar facilitar fugas.