Legislativo Judiciário Executivo

Qual o histórico do PL na disputa pela Prefeitura de Fortaleza

Partido oficializa a candidatura de André Fernandes nesta sexta-feira (2)

Escrito por Igor Cavalcante , igor.cavalcante@svm.com.br
Carmelo Neto e André Fernandes apostam na imagem do ex-presidente Jair Bolsonaro para atrair o eleitorado
Legenda: Carmelo Neto e André Fernandes apostam na imagem do ex-presidente Jair Bolsonaro para atrair o eleitorado
Foto: Thiago Gadelha

Com a oficialização da candidatura do deputado federal André Fernandes (PL) nesta sexta-feira (2), o PL deixa o papel histórico de coadjuvante nas disputas pela Prefeitura de Fortaleza e passa a concorrer pelo comando do Executivo da Capital. A sigla, que encarou uma profunda transformação nos últimos quatro anos, embarcou no bolsonarismo e, atualmente, é dominada pelos aliados do ex-presidente no Ceará.

Desde essa mudança de rumo, a principal carta na manga da cúpula do partido passou a ser a ampla base parlamentar no Congresso Nacional, o que garante um significativo tempo de propaganda gratuita no rádio e na televisão, além de uma fatia maior de recursos para financiar a campanha. Outra arma bolsonarista é o eleitorado fiel, principalmente na Capital, que contribuiu para que André Fernandes e Carmelo Neto, atual presidente do PL Ceará, se tornassem os deputados federal e estadual mais votados nas eleições de 2024 no Estado.

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Agora, esse apoio é posto à prova, já que tanto PDT quanto PT, que comandam as “máquinas públicas” municipal e estadual, elevaram a Prefeitura de Fortaleza como prioridade nacional. Para André Fernandes, há ainda o desafio de atrair um eleitorado para além do bolsonarismo, ampliando suas chances na disputa majoritária.

Conforme aponta a professora de Teoria Política da Universidade Estadual do Ceará (Uece), Monalisa Torres, o PL é uma legenda que não tem uma trajetória política forte na Capital cearense, o que justifica o currículo curto da agremiação nas disputas pelo Paço Municipal.

“É uma legenda que acomodou algumas lideranças importantes — a exemplo do Acilon Gonçalves (prefeito do Eusébio e ex-presidente do PL) e, agora, do deputado federal André Fernandes, que é uma das principais lideranças ligadas ao bolsonarismo no Ceará —, mas que não tem uma trajetória histórica de militância no Estado (...) E o fato de não haver uma identidade, uma tradição histórica de militância, faz com que essas legendas acabem se tornando espaços de acomodação de lideranças que não encontram espaço maior de movimentação em outras siglas mais expressivas", avalia a pesquisadora.

Evento de lançamento da pré-candidatura de André Fernandes reuniu políticos nacionais e locais do PL
Legenda: Evento de lançamento da pré-candidatura de André Fernandes reuniu políticos nacionais e locais do PL
Foto: Kid Júnior

Segundo Torres, nesses cenários, os políticos acabam tendo fidelidade muito mais a lideranças que eles seguem do que ao partido. Historicamente, alguns quadros políticos definiram os rumos do PL muito mais que qualquer ideal partidário. Atualmente, o Partido Liberal gira em torno da figura do ex-presidente Jair Bolsonaro. 

Isso fica claro nas declarações do atual presidente do PL Ceará, que aposta na imagem do ex-presidente para alavancar candidaturas na Capital e no Interior. 

“O Bolsonaro saiu da Presidência, mas o povo não o abandonou, por onde anda, ele carrega uma multidão. Então, muito pelo contrário, ele deixou a presidência, mas está ainda mais fortalecido (...) O presidente Bolsonaro, ele tem uma parcela muito significativa da população ao lado dele”
Carmelo Neto
Deputado estadual e presidente do PL Ceará

O PL em busca da Prefeitura de Fortaleza

O Partido Liberal surge ainda durante a redemocratização no Brasil. No início dos anos 2000, ele incorpora o Partido Geral dos Trabalhadores (PGT) e o Partido Social Trabalhista (PST). Já em 2006, o PL deixa de existir e se funde ao Partido de Reedificação da Ordem Nacional (Prona), dando origem ao Partido da República (PR).

Em 2019, a cúpula do PR debate um retorno às origens liberais da sigla e decide adotar novamente o acrônimo de PL. Seja como PL ou como PR, os liberais têm pouca representatividade no histórico político de Fortaleza. 

Conforme explicou ao Diário do Nordeste o pesquisador Emanuel Freitas, que é doutor em Sociologia pela Universidade Federal do Ceará (UFC) e professor de Teoria Política na Universidade Estadual do Ceará (Uece), os primeiros nomes de destaque da agremiação em Fortaleza tinham uma ligação religiosa neopentecostal.

Uma dessas figuras políticas era o ex-vereador de Almeida de Jesus, que coordenava o partido no Estado, e o atual vereador Ronaldo Martins — filiado ao Republicanos. Já à nível estadual, outro nome do PL foi o ex-prefeito de Fortaleza, Juraci Magalhães, que disputou uma vaga na Câmara dos Deputados pelo partido em 2006, mas acabou derrotado nas urnas.

Nos pleitos seguintes, o grupo chegou a compor chapas em disputas majoritárias. Em 2008, lançou Adahil Barreto como candidato a prefeito da Capital, mas ele ficou em penúltimo dos nove candidatos, somando apenas 4,8 mil votos, 0,41% do total. Em 2012, como PR, a sigla apoiou Elmano de Freitas (PT) como sucessor de Luizianne Lins (PT) e indicou o vice, Antônio Mourão. Os políticos, no entanto, acabaram derrotados.

Em 2016, foi a vez do PR, sob liderança do ex-governador Lúcio Alcântara, indicar o vice do candidato oposicionista Capitão Wagner. O nome escolhido foi Gaudêncio Lucena. Contudo, a dupla foi também derrotada. Em 2020, já como PL, a legenda apoiou a chapa encabeçada por José Sarto (PDT), que venceu as eleições municipais daquele ano.

Conforme Emanuel Freitas, a identidade do PL sempre foi de “centrão”. Com a filiação do prefeito do Eusébio, Acilon Gonçalves, que assumiu o comando do partido em 2019, a sigla passa a ter uma liderança mais forte, mas ainda pouco expressiva na Capital e com o pragmatismo como palavra de ordem.

Com o Acilon é quando, de fato, você tem um líder político de peso considerável e, mais do que isso, tem um projeto político de expansão e de construção de uma certa hegemonia na Região Metropolitana de Fortaleza. O Acilon foi quem deu uma cara de projeto político à sigla partidária, que era o projeto político da sua liderança em busca de se cacifar no jogo político estadual.
Emanuel Freitas
Doutor em Sociologia pela Universidade Federal do Ceará (UFC) e professor de Teoria Política na Universidade Estadual do Ceará (Uece)

PL na Câmara de Fortaleza

Considerando o período em que a sigla era identificada como PR e, mais recentemente, como PL, a representação da legenda na Câmara de Fortaleza reflete a pouca expressividade na Capital e o papel de lideranças que passaram pelo partido, mas sem uma identificação partidária. 

Em 2008, o PR tinha apenas um vereador na Casa: Adelmo Martins. O político foi reeleito em 2012, mas já com outros dois companheiros, o ex-vereador Márcio Cruz e o ex-vereador e ex-deputado Capitão Wagner.

Ex-prefeito de Fortaleza, Juraci Magalhães integrou o PL e chegou a concorrer pela legenda
Legenda: Ex-prefeito de Fortaleza, Juraci Magalhães integrou o PL e chegou a concorrer pela legenda
Foto: Kid Jr.

A chegada de Wagner no PR, sob as bênçãos de Lúcio Alcântara, representou um ganho de força para o "antigo PL". Naquele ano, o político egresso das forças da Segurança Pública foi o mais votado da Capital. Em 2016, a influência de Wagner seguiu forte na sigla e sobre o eleitorado da Capital. Aliados dele filiados ao PR chegaram à Câmara. À época, a bancada do PR tinha Soldado Noelio, Julierme Sena, Idalmir Feitosa e Marcio Martins.

Já nomeado como Partido Liberal — e sem a força de Wagner —, a agremiação elegeu apenas as vereadoras Tia Francisca e Ana do Aracapé em 2020. Atualmente, com a guinada bolsonarista, o PL perdeu as parlamentares, mas ganhou outros quadros. A sigla é representada pelos vereadores Inspetor Alberto, Julierme Sena, Priscila Costa e Marcelo Mendes.

O sucesso eleitoral de 2020

Se o pleito de 2020 rendeu apenas duas vagas na Câmara de Fortaleza para o PL, a nível estadual a sigla atingiu um ponto alto de sua trajetória no Estado. Sob liderança de Acilon Gonçalves, 12 aliados do mandatário foram eleitos no Ceará.

Ele era um dos principais aliados do grupo Ferreira Gomes e buscava se cacifar como liderança estadual. O PL passa por uma mudança de rumos em novembro de 2021, com a filiação do ex-presidente Jair Bolsonaro e de seus aliados, entre eles André Fernandes e Carmelo Neto.

Acilon deixou a liderança do PL Ceará, mas se mantém na sigla
Legenda: Acilon deixou a liderança do PL Ceará, mas se mantém na sigla
Foto: Reprodução / Redes Sociais

Conforme Monalisa Torres, neste período, a força do PL acaba concentrada muito mais na Região Metropolitana de Fortaleza do que na própria Capital.

“O PL tornou-se uma legenda mais expressiva pela quantidade de prefeituras que foi conquistando a despeito de ser uma legenda que ainda era inexpressiva, inclusive do ponto de vista nacional. Essa expressividade só acaba sendo conquistada depois da entrada do Bolsonaro, quando ele entra no partido é que o PL ganha um destaque, uma visibilidade muito maior”, aponta.

Ainda assim, essa movimentação ampliou os números da bancada do PL na Capital. Em 2022, após a janela partidária, o partido tinha seis vereadores ativos. O pleito daquele ano marca a guinada bolsonarista da sigla e o fortalecimento de seus aliados mais fiéis. Carmelo Neto tornou-se o deputado estadual mais votado, já André Fernandes foi o deputado federal com melhor desempenho no Ceará. A legenda chegou a cinco nomes na Câmara dos Deputados e quatro na Alece.

“Nacionalmente, vem um movimento verticalizado que é a entrada do Bolsonaro no partido e, consequentemente, a filiação dos bolsonaristas aqui no Ceará, isso faz com que o projeto se converta no partido de Bolsonaro para as eleições de 2022. Mesmo com a derrota do presidente, mas com sucesso eleitoral no Congresso Nacional, o partido se converte em uma produção de imagem-marca de um 'partido do Bolsonaro', porque o Bolsonaro tem liderança, assim como o Lula tem liderança, tem eleitorado, tem uma massa, mas faltava uma coisa que era uma agremiação para chamar de sua, então essa parece ter sido a função que o PL exerceu”
Emanuel Freitas
Doutor em Sociologia pela UFC e professor de Teoria Política na Uece

Nacionalmente, o PL elegeu a maior bancada da Câmara dos Deputados e do Senado, totalizando 99 deputados federais e 14 senadores. Os números no Congresso podem ser decisivos em disputas eleitorais, já que são usados como base de cálculo dos recursos de financiamento de campanhas e de tempo de propaganda eleitoral gratuita.

“O PL, em 2020, era um partido que estava dentro da base do governo Camilo Santana, fazia parte da sustentação do governo do PT no Estado. A partir de 2022, com a entrada do presidente Bolsonaro, o PL se posicionou fortemente contra o PT, recebeu muita gente, muita filiação e, claro, o PL tem lado, que é seguir a liderança do presidente Bolsonaro e se opor ao PT em qualquer cidade do país”, analisa o presidente do PL Ceará, Carmelo Neto.

Em novembro de 2023, o PL Ceará vira de vez o “partido do Bolsonaro”. À época, o presidente nacional do PL, Valdemar Costa Neto, oficializou o deputado estadual Carmelo Neto como presidente do partido no Ceará após a renúncia de Acilon. O prefeito do Eusébio deixou a função alegando "divergências de entendimento com outros membros da sigla".

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O político mantém-se no PL, mas seu enfraquecimento interno resultou em uma debandada de aliados. Dos 13 prefeitos eleitos pelo PL em 2020, apenas ele segue na sigla. Os outros migraram para legendas da base governista, incluindo PSB, PT, PP, PRD e Podemos. 

Sob comando de Carmelo, o PL Ceará enveredou de vez para o bolsonarismo de olho nas eleições municipais deste ano. O grupo decidiu lançar como pré-candidato à Prefeitura de Fortaleza o nome do deputado federal André Fernandes. A nível estadual, Carmelo Neto e seus correligionários têm planos ambiciosos, que incluem deixar o partido ainda maior que o atingido com Acilon em 2020.

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