Quais os riscos para o mandato de André Fernandes após inquérito no MPF, segundo especialistas
André Fernandes tem imunidade parlamentar, mas essa proteção não é absoluta
Em função de postagens de incitação a atos que resultaram nos episódios de terrorismo em Brasília, o deputado federal diplomado André Fernandes (PL) pode virar alvo da Justiça. O Ministério Público Federal (MPF) pediu a abertura de inquérito no Supremo Tribunal Federal (STF) contra ele e outras duas parlamentares (Clarissa Tércio, do PP-PE, e Silvia Waiãpi, do PL-AP).
Caso haja judicialização, o cearense pode perder o mandato na Câmara Federal, se houver condenação em trânsito em julgado. Essa não é a primeira vez que Fernandes passa perto de perder o mandato.
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Em 2019, a cassação do seu mandato de deputado estadual entrou em discussão no Conselho de Ética da Assembleia Legislativa por denúncias “frágeis”, segundo o Ministério Público, feitas contra um colega, Nezinho Farias (PDT), sobre envolvimento com facções criminosas. O processo foi arquivado posteriormente.
Mas, agora, com esse novo episódio, as suas declarações tomaram uma dimensão maior, engajando e incentivando toda uma comunidade que desaprova os processos democráticos. Por isso, além da perda do mandato, o deputado corre o risco de ser preso.
Na última última sexta-feira (6), ele publicou no Twitter que no fim de semana ocorreria o primeiro ato contra o governo Lula. Dois dias depois ocorreu a invasão às sedes dos Três Poderes, com jornalistas agredidos e estruturas e obras de arte destruídas. Ele ainda brincou com o episódio, postando foto da porta do gabinete do ministro Alexandre de Moraes vandalizada pelos terroristas.
A Constituição diz que, desde a expedição do diploma, os membros do Congresso Nacional não podem ser presos, salvo em flagrante de crime inafiançável. Assegura, também a manifestação de opiniões, palavras e votos, classificando-os como “invioláveis, civil e penalmente”.
Dessa forma, André Fernandes tem imunidade parlamentar, mas essa proteção não é absoluta. É o que explica Raquel Machado, membro da Comissão de Direito Eleitoral da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).
“A perda do mandato é mais difícil de forma imediata, mas a configuração de crimes parece mais evidente. Estes crimes serão apurados de acordo com o devido processo legal”, completa.
Ela compara o caso do deputado cearense ao de Daniel Silveira (PTB-RJ), que teve o mandato cassado pelo STF por incitação de violência contra ministros da Corte e exaltação do Ato Institucional nº 5 (AI-5), um dos instrumentos mais cruéis da Ditadura Militar brasileira (1964-1985).
Se ele continuar postando falas contra o Estado Democrático de Direito, pode ser preso, como Daniel Silveira foi
A pena prevista para incitação à prática de crime vai de 3 a 6 meses de detenção e multa, enquanto a pena para o crime de tentar abolir o Estado Democrático de Direito pode chegar a 8 anos de reclusão. Esta, inclusive, foi a pena do ex-parlamentar bolsonarista.
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Indícios "flagrantes"
Apesar de não participar ativamente dos atos de violência e vandalismo registrados no domingo (8), a suspeita é de que ele tenha agido por fora para alimentar a investida terrorista – antes e durante – nas redes sociais.
A iniciativa por si só já é significativa, tendo em vista a sua influência como agente político, avalia o analista político do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), André Santos.
“(Ele tem) influência não só por ser deputado, mas por ser uma liderança política, de certa forma, no Estado, por ter sido eleito, por participar de um partido político efetivamente. Isso por si só já demonstra influência que ele exerce não só para as manifestações, mas como para outras atitudes da população, dos seguidores dele, enfim, dos eleitores”, afirma.
Para ele, os indícios de participação do deputado nos atos terroristas são “bem flagrantes”. Não à toa, Fernandes apagou os posts que foram gatilhos para o MPF.
O desenrolar das investigações afetam diretamente o parlamentar, já que é apurada a participação de organizadores e financiadores dos movimentos. A possibilidade de cassação pode vir da Justiça e da própria Câmara, por meio do Conselho de Ética.
“Caso não venha a ser cassado, (pode haver) mais algum tipo de suspensão, o que pode atrapalhar bastante o mandato do parlamentar”, diz, acrescentando, ainda, que os próximos meses e semanas podem ser difíceis para Fernandes nesse sentido.
Outras iniciativas
No âmbito do inquérito do STF, o Psol pediu a inclusão de outros nove parlamentares federais que teriam envolvimento com os atos antidemocráticos. Entre eles, ex-líder do Governo Bolsonaro na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR), e o senador Magno Malta (PL-ES).
Veja a lista completa:
- André Fernandes (PL-CE)
- Ricardo Barros (PP-PR)
- Magno Malta (PL-ES)
- Carlos Jordy (PL-RJ)
- Silvia Waiãpi (PL-AP)
- Clarissa e Júnior Tércio (PP-PE)
- Sargento Rodrigues (PL-MG)
- José Medeiros (PL-MT)
- Coronel Tadeu (PL-SP)
- Ana Campagnolo (PL-SC)
Além da investigação no MPF, o deputado eleito pode enfrentar um processo no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para que não assuma o mandato. A petição protocolada pelos advogados Marco Aurélio de Carvalho, Fabiano Silva dos Santos e Pedro Serrano, do grupo Prerrogativas, pede a suspensão do diploma de Fernandes e o impedimento da sua posse na Câmara dos Deputados, em 1º de fevereiro.
O líder do PT na Câmara, José Guimarães, afirmou, pelas redes sociais, que pretende levar os casos ao Conselho de Ética da Casa para encaminhar a cassação dos mandatos. “São fascistas e criminosos que ameaçam o estado democrático de direito. E anexam a ordem democrática”, disse.
Vamos levá-los pro Conselho de Ética e cassar o mandato deles. São fascistas e criminosos que ameaçam o estado democrático de direito. E anexam a ordem democrática https://t.co/tTvNnx2GmB
— José Guimarães (@guimaraes13PT) January 9, 2023