Entre a CLT e o CNPJ: STF ditará rumos do trabalho no Brasil ao julgar a chamada 'pejotização'

Dia do Trabalhador marca debates sobre as novas relações de trabalho e o papel do Estado como regulador

Escrito por
Inácio Aguiar inacio.aguiar@svm.com.br
Legenda: Brasil discute as regras do trabalho no Século XXI
Foto: Reprodução

O mundo jurídico brasileiro acompanha com expectativa a análise do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a chamada “pejotização”, que significa a contratação de trabalhadores por meio de pessoas jurídicas, tema que têm gerado controvérsia na Justiça do Trabalho em todo o País. Diante do impasse, o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), suspendeu ações judiciais do tipo em todo o País. Depois disso, a expectativa é que a decisão da Corte pacifique o entendimento sobre o assunto e dê segurança jurídica a empresas e trabalhadores.  

Neste 1º de maio, dia do Trabalhador, esta Coluna ouviu profissionais renomados sobre o tema polêmico. Um grupo defende a ideia de que a pejotização significa “precarização do trabalho”. O outro argumenta que a modalidade pode trazer benefícios para ambas as partes. 

Na avaliação do advogado Daniel Cidrão, sócio do escritório Valença e Associados, a validação de contratos comerciais entre empresas e “trabalhadores que optaram, de forma livre e esclarecida, por constituir pessoa jurídica” é uma evolução natural do mercado. Segundo ele, a autonomia conferida aos prestadores de serviço pode abrir novas possibilidades profissionais, como atuar simultaneamente para diversas empresas. 

O profissional detalha, inclusive, que o próprio STF já se mostrou favorável a novas formas de contratação, que não apenas o vínculo via CLT desde que, evidentemente, a nova forma de contratação seja esclarecida entre as partes, livre de quaisquer fraudes. 

Por outro lado, Rafael Sales, advogado trabalhista, considera que a prática tem causado precarização do trabalho no País. “Essa prática pega pessoas que deveriam ter carteira assinada e dá uma nova pecha a esses trabalhadores. Com isso, ele perde FGTS, 13º salário, férias e aviso prévio, todas as garantias para os empregados em geral”, enumera o especialista. 

Para ele, a pejotização põe em xeque os direitos trabalhistas. “Se você só presta serviço para uma única empresa, é subordinado, cumpre uma jornada de trabalho, tem todos os requisitos da relação de emprego. Na prática, o que está em jogo é os direitos trabalhistas”, complementa. 

Suspensão das ações em todo o País 

A suspensão dos processos que discutem a pejotização foi determinada pelo ministro Gilmar Mendes no último dia 14 de abril. A medida paralisa ações judiciais em andamento até que o STF profira um entendimento vinculante sobre o tema.  

A decisão atende a uma necessidade de o Supremo uniformizar a jurisprudência, já que a Justiça do Trabalho vinha descumprindo o entendimento do próprio STF, provocando um acúmulo de reclamações na Corte.  

Desde 2018, após a reforma trabalhista, o Supremo já havia considerado lícita a terceirização ampla entre empresas, entendimento que agora pode se refletir também sobre a pejotização. 

Diferença entre contratações 

A diferença crucial entre terceirização e pejotização, entretanto, é destacada por juristas: enquanto na terceirização há uma empresa intermediária, na pejotização o próprio trabalhador se transforma em uma empresa.  

Essa configuração demanda que o trabalhador arque com encargos normalmente suportados pelo empregador.  

Transformação no mercado de trabalho 

No curto prazo, a suspensão dos processos atinge diretamente trabalhadores e empresas com ações abertas. Os especialistas alertam, no entanto, que a decisão do STF poderá impulsionar uma transformação ampla no mercado de trabalho, de uma forma ou de outra.  

A validação da pejotização poderia estimular a migração de contratos CLT para o modelo PJ, principalmente por razões financeiras.  

Há possibilidade de ganhos de autonomia para trabalhadores, mas há também o risco de precarização. 

Independentemente da resolução, o tema evidencia uma tendência: a reconfiguração das relações de trabalho no Brasil, impulsionada por novas formas de contratação que, embora ofereçam flexibilidade, também exigem atenção para que direitos fundamentais dos trabalhadores não sejam esvaziados.