Dia D da CPI da Enel: entraves econômicos e fornecimento irregular são denunciados à Alece
Clientes, representantes de entidades e agentes públicos de onze municípios cearenses participaram dos debates organizados nesta sexta-feira (15)
Interrupções frequentes no abastecimento de energia elétrica, a falta de oferta para plantas industriais que desejam se instalar no estado e a suspensão de serviços essenciais em decorrência de problemas na rede. Estes foram alguns dos problemas destacados por clientes da Enel Brasil durante as audiências públicas, realizadas nesta sexta-feira (15), pela Assembleia Legislativa do Ceará (Alece) durante o "Dia D" de mobilização da Comissão Parlamentar de Inquérito que investiga a concessão da empresa no estado.
Os encontros foram promovidos em 11 municípios: Crato, Brejo Santo, Sobral, São Gonçalo do Amarante, Orós, Solonópole, Tauá, Capistrano, Canindé, Fortaleza e Iguatu. Cada um deles foi conduzido por uma pessoa que integra o quadro de legisladores da Casa.
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Segundo o deputado estadual em exercício Guilherme Sampaio (PT), que foi o responsável por conduzir os trabalhos na Capital, a oportunidade também cumpre um papel de divulgação da iniciativa promovida pelo colegiado, para que assim haja uma participação popular.
"Além desse dia D, que nós fizemos aqui essa tribuna popular em Fortaleza, mas está havendo também no Cariri, está havendo em Sobral e em outras cidades, nós vamos lançar uma pesquisa através dos meios virtuais de comunicação da Assembleia na qual a população do Ceará fará uma avaliação dos serviços da Enel", anunciou.
De acordo com o petista, a investida desta data auxiliará os envolvidos na execução da CPI a "colher novos subsídios". "Saímos daqui também com proposições, por exemplo, a ideia de que a CPI entre os seus resultados - além das denúncias que está fazendo, eventualmente encaminhadas ao Ministério Público e à Justiça - possa também apresentar projetos de lei aqui na Assembleia Legislativa", elencou, mencionando proposições que privilegiem aspectos sociais e o fomento à cultura e ao esporte.
Reunião de esforços
A ideia, desde o início, alegou Sampaio, é promover ações que integrem outros órgãos da iniciativa pública e entidades privadas. Nesta listagem estão o Ministério Público do Estado do Ceará (MPCE), a Defensoria Pública do Estado do Ceará (DPCE), o Procon, a Associação dos Municípios do Estado do Ceará (Aprece), a Fecomércio Ceará e a Federação das Indústrias do Estado do Ceará (Fiec).
Representando a DPCE, Augusto Cunha, defensor especializado na defesa dos direitos dos consumidores, relatou que atua diariamente no enfrentamento das consequências da deficiência no fornecimento de energia pela Enel. Ao que disse o convidado, a empresa que realizava o abastecimento anteriormente, a Companhia Energética do Ceará (Coelce), que pertencia ao Governo do Estado, apresentava um nível notável de eficiência na prestação do serviço.
"Historicamente, a qualidade desse serviço essencial já alcançou marcas notáveis. Recordo que, até o ano de 2009, a então Coelce se destacava como a principal fornecedora de energia do Nordeste por 11 anos consecutivos. No entanto, presenciamos um declínio alarmante. A Enel figura hoje como a segunda pior distribuidora de energia da região em termos de continuidade do serviço, superando apenas a Equatorial", apontou.
Cunha destacou a relevância do fornecimento de energia, sobretudo pela manutenção da operação de equipamentos de saúde. "Interrupções no fornecimento afetam diretamente hospitais e clínicas, colocando em risco a vida e a segurança da população. Da mesma forma, a economia local sofre reveses significativos. A Enel demonstra uma lentidão preocupante na conexão de novos consumidores de grande escala, fator que desencoraja investimentos e compromete a criação de empregos e a arrecadação de impostos", frisou.
Dentro outras problemáticas, o representante da Defensoria citou o impacto da má prestação de serviço para os pequenos empresários, a cobertura deficitária em comunidades carentes e nas zonas rurais, além da redução do número de colaboradores da Enel por habitante no Ceará. "Diante da persistência desses problemas e da ineficácia das medidas até então adotadas, o Núcleo de Defesa do Consumidor está explorando, junto a parceiros estratégicos, opções de litígios que façam a Enel cumprir com suas obrigações", disse.
Repercussão do problema
Alexandre Cialdini, auditor fiscal licenciado da Secretaria da Fazenda do Ceará (Sefaz-CE) e secretário de Finanças de Caucaia, comentou que o reflexo das problemáticas envolvendo a empresa de energia elétrica tem grandes dimensões. "O monopólio, quando não é planejado ou controlado, quando tem debilidade no seu processo de execução, e em decorrência da amplitude dele, as falhas têm uma repercussão muito maior. Isso é o que está acontecendo agora", atribuiu.
"Hoje, inclusive, temos vários indicadores de performance, quando da concessão dos serviços públicos. O principal deles, o indicador de desempenho global de continuidade, a Enel é uma das mais mal classificadas perante a Aneel", explicou o especialista.
Cialdini lembrou da sua experiência no comando da pasta de Finanças de Eusébio, outro município da Região Metropolitana de Fortaleza, e se reuniu com outros 56 secretários responsáveis pelos fiscos de outras cidades cearenses. Na época, junto com a Aprece, foram identificados problemas tributários "recorrentes e sequenciais" em todos os municípios que participaram da movimentação, causados por falhas da empresa de energia elétrica. O processo resultante do trabalho de gestores municipais foi protocolado na Agência Reguladora do Estado do Ceará (Arce) em 2022.
Em Sobral, a discussão ficou sob a condução da deputada estadual Lia Gomes (PDT), que conversou com a reportagem minutos antes do debate começar. Pelo que explicou a responsável pelo ato, o propósito foi estabelecer, em parceria com a DPE-CE, um momento de participação popular. A ocasião foi convocada para documentar as violações contra os clientes que dependem dos serviços da concessionária.
"A gente tem depoimentos de fábricas que não conseguem abrir. Vão gerar, às vezes, 200, 300, 400 empregos e não conseguem funcionar pela demora da Enel. Temos também o Poder Público de Sobral, que tem, reiteradamente, entrado na Justiça para ligar energia de escolas, de quadras, de postos de saúde. O juiz manda, ordena a empresa que ligue e a ela desobedece", mencionou.
Foram convidados para o evento, citou a pedetista, prefeitos, secretários e clientes de vários setores econômicos e portes.
Ação Civil Pública
Conforme falou o deputado estadual Guilherme Landim (PDT), que coordenou a audiência da comissão em Brejo Santo, realizada pela manhã, quatro prefeitos e representantes de sete câmaras municipais da região marcaram presença no evento da Alece. Membros de entidades municipais do varejo, de associações rurais, empresários e integrantes da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) também compareceram.
"Escutamos todos que quiseram se pronunciar, juntamos esses relatos no documento que a gente leva para o relatório e fizemos uma explicação do que já foi feito até agora no contexto da CPI", detalhou o pedetista ao Diário do Nordeste.
Perguntado sobre o teor das reclamações apresentadas pelos consumidores, o parlamentar alegou que foram "as mais variadas". "Tivemos desde atraso na ligação de obras até cobranças duplicadas. Foram muitas reclamações da população em geral da cobrança pela média. Além disso, chegaram reclamações de prefeituras sobre obras mal feitas", relacionou.
Ao que previu o deputado, a próxima etapa do processo será a organização de uma oitiva para ouvir a Enel Brasil, no início de abril. Orientações do departamento jurídico da Assembleia, conforme colocou Landim, sugeriram que a denúncia seja oferecida ao MPCE - para proceder com uma Ação Civil Pública - como um desdobramento do relatório final da comissão de inquérito, não como um resultado da mobilização do "Dia D".
O deputado estadual Fernando Santana (PT), presidente da CPI da Enel, foi acionado, mas não respondeu aos questionamentos enviados até a publicação desta matéria. O conteúdo será atualizado caso haja alguma devolutiva.