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CPI da Enel: Sudene revela R$ 800 milhões em incentivos fiscais à empresa nos últimos dez anos

O benefício fiscal tinha como propósito a criação de emprego, investimento em mão de obra qualificada e infraestrutura pela empresa

Escrito por Ingrid Campos , ingrid.campos@svm.com.br
Imagem mostra a reunião da CPI da Enel que ocorreu nesta segunda-feira, dia 11. Os convidados foram o advogado Icaro Ferreira de Mendonça Gaspar e o diretor de Fundos, Incentivo e de Atração de Investimentos da Sudene, Heitor Freire.
Legenda: Última oitava da CPI da Enel antes da recepção de diretores da empresa ocorreu nesta segunda-feira.
Foto: Paulo Rocha/Alece

Na penúltima oitiva da CPI da Enel, que ocorreu nesta segunda-feira (11), representantes da Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (Sudene) e de familiares de vítimas de equipamentos da empresa foram ouvidos pelos deputados. A reunião deu uma nova camada de materialidade para o relatório final dos trabalhos, que deve ser finalizado em abril, após interrogatório com a direção da concessionária.

Heitor Freire, diretor de Fundos, Incentivo e de Atração de Investimentos da Sudene, apresentou dados sobre os incentivos fiscais concedidos à Enel para atuação no Ceará. Segundo o gestor, a empresa deixou de pagar mais de R$ 800 milhões em impostos nos últimos dez anos, a fim de que a sua instalação fosse revertida em desenvolvimento no Estado – com emprego, mão de obra qualificada e infraestrutura, por exemplo –, mas a expectativa não foi cumprida.

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"É um imposto que poderia ser gasto em saúde, infraestrutura, ou seja, em algum benefício direto para a população, mas voltou para a empresa, e a gente, hoje, só escutou denúncias e precariedade. [...] São informações que a gente leva de volta para a nossa autarquia para reavaliar todas essas informações e até mesmo sugestões de como esse benefícios podem ser fiscalizados, cortados. A gente está aqui para somar com empregos, incentivos, para que o Nordeste se desenvolva, e não para que empresas venham lucrar na nossa região sem trazer benefícios", comentou Freire.

A contribuição da Sudene nos trabalhos, de fato, não deve passar em branco. Conforme informou o relator da CPI, deputado Guilherme Landim (PDT), o relatório final deve conter recomendações para que a superintendência não renove a concessão de incentivos fiscais à Enel.

"Além de não gerar os empregos, porque está precarizando a mão de obra e maltratando esses trabalhadores, a Enel também está atrapalhando o desenvolvimento do Ceará, e isso nós ouvimos do setor produtivo aqui, seja nas energias renováveis ou em quaisquer outras áreas, empresas deixando de ser abertas por conta de falta de ligação de energia e tantas outras coisas. [...] É estarrecedor ver que, apesar de todo o mau serviço que ela presta ao povo do estado do Ceará, ela ainda recebe benefícios dessa natureza", disse Landim.

O colegiado também ouviu Icaro Ferreira de Mendonça Gaspar, advogado de vítimas de choques elétricos, e Ivamar Pereira de Sousa, órfã de pai e mãe em acidente com cabo energizado em via pública em 2008. Assim como os pais de Ivamar, dezenas de pessoas foram vitimadas dessa maneira nos últimos anos.

"Não estou entrando no método se foi ou não negligência, mas que é desumano ouvir que a Enel sequer fez um pedido de desculpas a essas famílias ou fez uma visita, pelo menos, para ver se a família estava precisando de alguma coisa", criticou o presidente da CPI, Fernando Santana (PT).

Por meio de nota, a Enel informou que a redução de 75% do Imposto de renda Pessoa Jurídica (IRPJ) foi concedido pela Sudene em 2016, atestando "a modernização total do empreendimento da distribuidora, através de notas fiscais e vistoria física" e garantindo "melhoria no sistema de produção da companhia". 

A Enel reitera que o incentiva é "destinado a melhorias, novas tecnologias e eficiências dos processos" e que tem vigência de dez anos, ou seja, expira em 2025. 

"Como melhorias na rede elétrica e modernização das estruturas e processos, a empresa informa que, nos últimos cinco anos, investiu R$ 5,9 bilhões no Ceará, principalmente em expansão da rede, inclusão de tecnologias, adequação da infraestrutura e construção de novas subestações em Fortaleza, Pindoretama, Pacatuba, Itarema, Paracuru, Itapipoca, Guaraciaba do Norte e Porteiras. Só em 2023 foi investido R$ 1,6 bilhão, o maior investimento da série histórica da companhia", acrescenta a companhia. 

Já sobre o acidente citado acima, a concessionária "lamenta profundamente e está aguardando o andamento do processo judicial".

Encaminhamentos

Antes mesmo de finalizar os trabalhos, a comissão fechou entendimento sobre ajuizar uma ação contra a Enel. O processo deve reunir todas as principais queixas da população, de prefeitos, de empresários e de outros grupos sobre o serviço prestado pela concessionária no Estado. 

A deputada Lia Gomes (PDT) trabalha junto à equipe técnica da CPI e a uma defensora especializada em direitos do consumidor, cedida pela Defensoria Pública do Ceará (DPE-CE), na redação da ação. A recomendação é que o texto tenha um denso embasamento material para avançar no Judiciário.

"Se a ação pública não for muito bem orientada por advogados, muito bem embasada, com dados, com depoimentos, com números, ela meio que cai no esquecimento, na vala comum, e isso é tudo que a gente não quer", explicou.

Um questionário está sendo elaborado para que vários setores mencionem duas queixas com o serviço da empresa. Além disso, no dia 15 deste mês, os deputados farão uma força-tarefa de mobilização, com audiências em várias regiões do Ceará para colher depoimentos que fundamentem essa reta final de trabalhos. 

A comissão espera realizar oitiva com a direção da Enel no começo de abril para finalizar as atividades. Ainda não há dia definido para que isso ocorra.

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