Proposta para baratear preço dos alimentos é boa iniciativa, mas precisa ser bem orientada; entenda

Especialistas ouvidos pelo Diário do Nordeste avaliam medidas estudadas pelo governo para estimular a produção agrícola

Escrito por Mariana Lemos , mariana.lemos@svm.com.br
foto de carrinho de supermercado com compras
Legenda: Governo Federal estuda propostas para reduzir preço dos alimentos
Foto: Fabiane de Paula

O Governo Federal deve anunciar nos próximos dias medidas para reduzir os preços dos alimentos, sobretudo arroz, feijão, trigo e milho, no País. Uma reunião interministerial foi realizada na quita-feira (14) para discutir propostas voltadas à estabilização dos preços, que deve ocorrer entre o fim de março e meados de abril, segundo previsão do governo.

O grupo de alimentação e bebidas foi o que mais influenciou no cálculo da inflação entre novembro e janeiro. Em fevereiro, os alimentos também ajudaram a aumentar o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) em 0,83%. Pelo terceiro mês consecutivo, a alta nos alimentos foi a principal responsável pela inflação às famílias de renda mais baixa, segundo análise do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). 

Uma das variações de preço mais significativas é a do arroz, que acumula alta de 30,72% no período de doze meses. O estoque do grão diminuiu drasticamente, pois a colheita do Rio Grande do Sul, o maior produtor do país, foi impactada com as enchentes do fim de 2023. 

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A intenção do Governo Federal é que o preço do arroz caía em torno de 20% nas próximas semanas. “Os preços dos produtores já desceram de R$ 120 para em torno de R$ 100 a saca. A gente espera, com o caminhar da colheita, que esse preço caia. É importante que os atacadistas repassem esses preços ao consumidor”, afirmou o ministro da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Carlos Fávaro.

Entre as medidas discutidas pelos ministérios da Agricultura, Pecuária e Abastecimento e do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar, estão a compra de estoques públicos pela Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), concessão de crédito e o lançamento de contratos para garantir preços mínimos

Reginaldo Aguiar, supervisor técnico do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), aponta que o fortalecimento da política de reservas públicas é fundamental para proteger a segurança alimentar em caso de desastres climáticos, crises financeiras ou ataques especulativos.

A política de estoques públicos de alimentos foi retomada em junho de 2023, após seis anos de pausa. O objetivo da estratégia é regular o abastecimento interno a partir da compra de produtos agrícolas pelo governo. 

“Em um país do tamanho do Brasil, com essa quantidade de gente, é necessário ter estoques estratégicos. Assim, em caso de algum acidente, queimada ou problema, as pessoas não passam fome. Os estoques reguladores são necessários para que você não crie movimentos especulativos e comece a penalizar a população, principalmente os mais pobres”, explica Reginaldo. 

Para apresentar os efeitos desejados, a política de estoques públicos necessita de grande atenção dos órgãos públicos, segundo avaliação do professor do departamento Economia Agrícola da Universidade Federal do Ceará (UFC), Vitor Hugo Miro. 

O especialista comenta que o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), política operada pela CONAB, teria grande potencial de beneficiar sobretudo à agricultura familiar, principalmente os produtores que estão à margem das grandes cadeias do agronegócio. 

INCENTIVO AOS PRODUTORES

Segundo o Governo Federal, o novo Plano Safra deve ter medidas de incentivo à produção de arroz, feijão, trigo, milho e mandioca. Vitor Hugo Miro explica, atualmente, os produtores decidem pela produção dos itens que permitem maior rentabilidade, a partir da orientação dos preços pelo mercado.

“Um exemplo importante é do arroz que estava perdendo área de cultivo para a soja em diversas regiões do País. No entanto, o aumento no preço do arroz gerou incentivos para um movimento inverso, de aumento da área plantada com arroz”, comenta. 

Vinculada à formação de estoques, a Política de Garantia de Preços Mínimos (PGPM) é importante garantir incentivos à produção, segundo o especialista. “A PGPM prevê a aquisição de alimentos pela CONAB somente quando o valor do produto fica abaixo ou com tendência a alcançar valor menor que o preço mínimo estabelecido. Esses incentivos podem ser importantes para as próximas safras, não devem exercer efeitos imediatos significativos”, afirma.  

A concessão de crédito também é importante para a garantia da produção, já que viabiliza a comercialização adequada e a produção de muitos agricultores. Na visão do economista, o crédito deve ser utilizado para permitir acesso à tecnologia e aumento de produtividade.

A política de crédito agrícola precisa ser bem orientada, para não induzir distorções na alocação de recursos. É preciso direcionar o crédito para produtores menos eficientes, sem condições de fazer um bom uso do subsídio e que não possuem condições de pagar pelo recurso recebido"
Vitor Hugo Miro
Professor do departamento Economia Agrícola da UFC

Reginaldo Aguiar aponta que, caso uma das formas de incentivo seja a isenção fiscal aos produtores, também deve ser estabelecida uma contrapartida, segundo Reginaldo. 

“A isenção gera uma queda de custo e, quando isso ocorre, ou o produtor baixa o preço, ou mantém, para aumentar o lucro. Se você fizer essa isenção com um acordo bem feito para gerar barateamento, isso é positivo. Mas se não for bem feito, a sociedade não é contemplada”, explica o supervisor do Dieese

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