Vítima de estupro de lutador de MMA chora no 'Encontro' e diz: 'O que mais faltava? Eu estar morta?'

Ela pediu mudança na legislação que permitiu soltura do estuprador confesso

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Redação producaodiario@svm.com.br
(Atualizado às 14:22)
Empresária Renata participou de programa 'Encontro' por videoconferência
Legenda: Empresária Renata participou de programa 'Encontro' por videoconferência
Foto: Reprodução/TV Globo

Renata Coan Cudh, vítima de estupro de um lutador de MMA em Fortaleza, se emocionou em entrevista no "Encontro com Patrícia Poeta", desta quarta-feira (11). Na conversa com a apresentadora, ela fez um apelo pedindo uma lei mais rígida em caso de crime de estupro. A empresária também desabafou sobre a decisão da Justiça de ter libertado o agressor, questionando o porquê de o caso não ter sido tratado como tentativa de feminicídio.

"A Justiça em si levou apenas a mínima [pena] de estupro e ainda deixou a pessoa na rua. Isso me dói muito porque tudo [comprovou o crime]: depoimento, o réu confesso, policiais, testemunhas oculares, exames de ferida, tudo, tudo. Mesmo assim, o que mais faltava? Eu estar morta? Isso que ia valer a lei? Isso que ia valer o julgamento?", questionou a empresária.

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O lutador, que é motorista de aplicativo, Edilson Florêncio da Conceição, condenado a 8 anos e dois meses de prisão pelo estupro, recebeu da Justiça o direito de recorrer em liberdade e foi solto na segunda-feira (9), causando indignação. Foi a própria Renata que divulgou a informação, ao gravar um depoimento para as redes sociais que repercutiu nacionalmente. O Ministério Público do Ceará (MPCE) vai recorrer da decisão da Justiça.

Soltura de agressor desmotiva mulheres, declarou empresária

Ainda na conversa com a apresentadora do "Encontro", Renata destacou que a decisão de soltura do condenado reforça o receio das mulheres em não denunciarem este tipo de crime.

A Justiça não está do nosso lado. Isso dói além de tudo que eu passei
Renata Coan Cudh
Vítima

A empresária revelou também o que a motivou a falar sobre o caso publicamente: "Eu não queria me expor de maneira alguma, porque toda a violência que eu passei, tudo que eu passei, é muito humilhante para a mulher. É muito difícil, a família sofre, eu sofro. Eu venho sofrendo em silêncio porque eu não queria exposição. Mas, diante dessa injustiça, eu não podia deixar de lutar por mim e por todas as outras mulheres".

Vítima pede mudança de lei 1940

Na entrevista, Patrícia Poeta ainda questionou Renata sobre o que ela deseja em termos de legislação contra o agressor e outros condenados por estupro após o caso repercutir nacionalmente.

A empresária declarou: "O primeiro é que ele esteja preso e não esteja solto na sociedade, [é] o primeiro apelo. E o segundo é que a gente precisa mudar a lei. A gente precisa mudar essa lei de 1940 que nunca foi revista. É inconcebível tudo o que tá acontecendo", declarou Renata. 

A Lei nº 2.848 de 7 de dezembro de 1940, o Código Penal Brasileiro, trata sobre o crime de estupro no artigo 213. A norma prevê que constranger alguém à conjunção carnal ou a outro ato libidinoso, mediante violência ou grave ameaça, é punido com reclusão de seis a dez anos.

Ainda não existe uma tipificação voltada a prisão em crimes contra a dignidade sexual, o que Renata quer com mais rigor.

O QUE DIZ A ACM

Após publicação da reportagem, a a Associação Cearense de Magistrados (ACM) divulgou nota manifestando "seu veemente desagravo à Excelentíssima Senhora Juíza Adriana Aguiar Magalhães, diante dos infundados e injustos ataques veiculados em redes sociais contra a sua pessoa e que visaram atingir sua reputação e dignidade enquanto representante do Poder Judiciário".

Veja nota na íntegra:

"Recentemente, a digna Magistrada, que atua na jurisdição criminal, julgou processo de sua responsabilidade cujo teor, ao que se apresenta, importou em descontentamento, especialmente em razão da pena fixada e do respectivo regime de seu cumprimento, conforme a legislação penal aplicada pela Juíza.

Em face da situação, a pessoa vitimada pelo crime objeto do processo fez postagens em redes sociais que levam ao equivocado entendimento de que a decisão seria injusta, demandando grande repercussão em meios de comunicação social. O processo em que a sentença foi lançada corre em segredo de justiça, mas, sem declinar nomes ou fatos (o que foi desconsiderado pela vítima em redes sociais), impõe-se esclarecer o seguinte:

A fixação da pena e do respectivo regime de seu cumprimento em processos penais é um ato técnico e não uma escolha pessoal ou arbitrária do magistrado. Não se trata de um critério de justiça do juiz, mas do próprio legislador. Desse modo, trata-se de uma atuação pautada na rigorosa aplicação das leis e na interpretação delas, estabelecidas em precedentes dos tribunais, de modo a garantir a imparcialidade e a legalidade do julgamento. E foi exatamente isso o que fez a Magistrada.

É necessário compreender que juízes e juízas estão vinculados à estrita observância da legislação do País e aos precedentes que orientam a fixação da pena, não podendo o aplicador das normas legais fugir a tais critérios, sob pena, inclusive, de responsabilização funcional por descumprimento à legislação aplicável.

Assim, a sentença prolatada pela Juíza, tendo seguido estritamente a tais critérios, reflete a postura responsável do Poder Judiciário face à sua função constitucional de aplicar as leis tais como postas. Se o resultado do julgamento frustrou expectativas sociais, o senso comum e a vítima, talvez seja o momento de a sociedade refletir e discutir a legislação penal vigente, mas revela-se inadmissível o ataque à dignidade da pessoa da Magistrada que, de forma célere e responsável, julgou o processo com base na prova dos autos, no devido processo legal e na legislação aplicável ao caso.

Pontue-se que a Magistratura cearense, da qual faz parte a Juíza Adriana Aguiar Magalhães, solidariza-se com todas as vítimas de crimes e atos violentos e se coloca à disposição da sociedade para contribuir com o debate acerca das eventuais mudanças na legislação Penal e Processual Penal. No entanto, não podemos aceitar que a má compreensão do sistema judicial resulte em críticas infundadas e injustas que importem em ataques pessoais àqueles que cumprem sua missão de aplicar a lei.

Reafirmamos o compromisso do Poder Judiciário com a justiça, a legalidade e a ética, e reiteramos nosso apoio à Juíza Adriana Aguiar Magalhães, cuja conduta ilibada e dedicação ao serviço jurisdicional ao longo de anos merecem todo o nosso respeito e reconhecimento".

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