Vítima de estupro de lutador de MMA chora no 'Encontro' e diz: 'O que mais faltava? Eu estar morta?'
Ela pediu mudança na legislação que permitiu soltura do estuprador confesso

Renata Coan Cudh, vítima de estupro de um lutador de MMA em Fortaleza, se emocionou em entrevista no "Encontro com Patrícia Poeta", desta quarta-feira (11). Na conversa com a apresentadora, ela fez um apelo pedindo uma lei mais rígida em caso de crime de estupro. A empresária também desabafou sobre a decisão da Justiça de ter libertado o agressor, questionando o porquê de o caso não ter sido tratado como tentativa de feminicídio.
"A Justiça em si levou apenas a mínima [pena] de estupro e ainda deixou a pessoa na rua. Isso me dói muito porque tudo [comprovou o crime]: depoimento, o réu confesso, policiais, testemunhas oculares, exames de ferida, tudo, tudo. Mesmo assim, o que mais faltava? Eu estar morta? Isso que ia valer a lei? Isso que ia valer o julgamento?", questionou a empresária.
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O lutador, que é motorista de aplicativo, Edilson Florêncio da Conceição, condenado a 8 anos e dois meses de prisão pelo estupro, recebeu da Justiça o direito de recorrer em liberdade e foi solto na segunda-feira (9), causando indignação. Foi a própria Renata que divulgou a informação, ao gravar um depoimento para as redes sociais que repercutiu nacionalmente. O Ministério Público do Ceará (MPCE) vai recorrer da decisão da Justiça.
Soltura de agressor desmotiva mulheres, declarou empresária
Ainda na conversa com a apresentadora do "Encontro", Renata destacou que a decisão de soltura do condenado reforça o receio das mulheres em não denunciarem este tipo de crime.
A Justiça não está do nosso lado. Isso dói além de tudo que eu passei
A empresária revelou também o que a motivou a falar sobre o caso publicamente: "Eu não queria me expor de maneira alguma, porque toda a violência que eu passei, tudo que eu passei, é muito humilhante para a mulher. É muito difícil, a família sofre, eu sofro. Eu venho sofrendo em silêncio porque eu não queria exposição. Mas, diante dessa injustiça, eu não podia deixar de lutar por mim e por todas as outras mulheres".
Vítima pede mudança de lei 1940
Na entrevista, Patrícia Poeta ainda questionou Renata sobre o que ela deseja em termos de legislação contra o agressor e outros condenados por estupro após o caso repercutir nacionalmente.
A empresária declarou: "O primeiro é que ele esteja preso e não esteja solto na sociedade, [é] o primeiro apelo. E o segundo é que a gente precisa mudar a lei. A gente precisa mudar essa lei de 1940 que nunca foi revista. É inconcebível tudo o que tá acontecendo", declarou Renata.
A Lei nº 2.848 de 7 de dezembro de 1940, o Código Penal Brasileiro, trata sobre o crime de estupro no artigo 213. A norma prevê que constranger alguém à conjunção carnal ou a outro ato libidinoso, mediante violência ou grave ameaça, é punido com reclusão de seis a dez anos.
Ainda não existe uma tipificação voltada a prisão em crimes contra a dignidade sexual, o que Renata quer com mais rigor.
O QUE DIZ A ACM
Após publicação da reportagem, a a Associação Cearense de Magistrados (ACM) divulgou nota manifestando "seu veemente desagravo à Excelentíssima Senhora Juíza Adriana Aguiar Magalhães, diante dos infundados e injustos ataques veiculados em redes sociais contra a sua pessoa e que visaram atingir sua reputação e dignidade enquanto representante do Poder Judiciário".
Veja nota na íntegra:
"Recentemente, a digna Magistrada, que atua na jurisdição criminal, julgou processo de sua responsabilidade cujo teor, ao que se apresenta, importou em descontentamento, especialmente em razão da pena fixada e do respectivo regime de seu cumprimento, conforme a legislação penal aplicada pela Juíza.
Em face da situação, a pessoa vitimada pelo crime objeto do processo fez postagens em redes sociais que levam ao equivocado entendimento de que a decisão seria injusta, demandando grande repercussão em meios de comunicação social. O processo em que a sentença foi lançada corre em segredo de justiça, mas, sem declinar nomes ou fatos (o que foi desconsiderado pela vítima em redes sociais), impõe-se esclarecer o seguinte:
A fixação da pena e do respectivo regime de seu cumprimento em processos penais é um ato técnico e não uma escolha pessoal ou arbitrária do magistrado. Não se trata de um critério de justiça do juiz, mas do próprio legislador. Desse modo, trata-se de uma atuação pautada na rigorosa aplicação das leis e na interpretação delas, estabelecidas em precedentes dos tribunais, de modo a garantir a imparcialidade e a legalidade do julgamento. E foi exatamente isso o que fez a Magistrada.
É necessário compreender que juízes e juízas estão vinculados à estrita observância da legislação do País e aos precedentes que orientam a fixação da pena, não podendo o aplicador das normas legais fugir a tais critérios, sob pena, inclusive, de responsabilização funcional por descumprimento à legislação aplicável.
Assim, a sentença prolatada pela Juíza, tendo seguido estritamente a tais critérios, reflete a postura responsável do Poder Judiciário face à sua função constitucional de aplicar as leis tais como postas. Se o resultado do julgamento frustrou expectativas sociais, o senso comum e a vítima, talvez seja o momento de a sociedade refletir e discutir a legislação penal vigente, mas revela-se inadmissível o ataque à dignidade da pessoa da Magistrada que, de forma célere e responsável, julgou o processo com base na prova dos autos, no devido processo legal e na legislação aplicável ao caso.
Pontue-se que a Magistratura cearense, da qual faz parte a Juíza Adriana Aguiar Magalhães, solidariza-se com todas as vítimas de crimes e atos violentos e se coloca à disposição da sociedade para contribuir com o debate acerca das eventuais mudanças na legislação Penal e Processual Penal. No entanto, não podemos aceitar que a má compreensão do sistema judicial resulte em críticas infundadas e injustas que importem em ataques pessoais àqueles que cumprem sua missão de aplicar a lei.
Reafirmamos o compromisso do Poder Judiciário com a justiça, a legalidade e a ética, e reiteramos nosso apoio à Juíza Adriana Aguiar Magalhães, cuja conduta ilibada e dedicação ao serviço jurisdicional ao longo de anos merecem todo o nosso respeito e reconhecimento".