Ministério Público vai recorrer da soltura de lutador de MMA condenado por estupro em Fortaleza

O relaxamento da prisão foi emitido pela juíza Adriana Aguiar Magalhães na última sexta-feira (6), e executado nessa segunda (9)

(Atualizado às 14:28, em 11 de Junho de 2025)
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Legenda: A vítima contou que foi "estrangulada até quase a morte em um matagal"
Foto: Reprodução/Redes Sociais

O Ministério Público do Ceará (MPCE) disse ao Diário do Nordeste que irá recorrer da decisão da Justiça que mandou soltar o lutador de MMA (inglês para "artes marciais mistas") e motorista de aplicativo Edílson Florêncio da Conceição, 48.

Edílson foi condenado na semana passada pelo crime de estupro. Na sentença, a juíza decidiu que ele pode cumprir o restante da pena em regime semiaberto, e aguardar o desfecho de possíveis recursos em liberdade devido aos "bons antecedentes e ao bom comportamento" e por ser réu primário.

A assistência de acusação também informou que irá recorrer da decisão de soltura. A reportagem procurou a defesa do lutador, representada pela advogada Carolina Azin, que disse: "essa decisão não absolve nem representa impunidade, mas respeita a lei e o devido processo legal, permitindo o reexame do caso pelas instâncias superiores". (Veja nota na íntegra no fim desta matéria).

Edílson foi condenado a oito anos e dois meses de detenção no último dia 5 de junho, mas já estava preso desde janeiro de 2025. Ele ficou quatro meses e 12 dias detido, segundo o alvará de soltura obtido pela reportagem.

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O homem recebeu pena de oito anos pelo crime de estupro de vulnerável, pois a vítima estava alcoolizada, e dois meses por resistir à prisão, quando foi capturado em flagrante por policiais. 

O relaxamento da prisão foi emitido pela juíza Adriana Aguiar Magalhães na última sexta-feira (6), e executado nessa segunda (9).

A informação da soltura do condenado foi divulgada pela vítima, a empresária Renata Coan Cudh, que mostrou o rosto e falou sobre sua história pela primeira vez nas redes sociais na noite desta segunda.

Difícil de acreditar, mas o judiciário cearense representado por uma juíza mulher, apesar de condená-lo, decidiu na mesma sentença soltá-lo e deixar responder em liberdade. É isso mesmo que você está ouvindo. Mesmo com depoimento de três policiais, testemunhas oculares, exame de perícia, o réu confessando o crime e toda a violência que eu sofri, ela julgou que ele poderia responder em liberdade por ser réu primário
Renata Coan
Empresária vítima de estupro

'Fui estrangulada até quase a morte' 

Em vídeo, a vítima relembra parte dos momentos de violência que sofreu. Ela foi sequestrada pelo condenado, que trabalhava como motorista de aplicativo, violentada e "estrangulada até quase a morte em um matagal". 

Segundo Renata, "foi Deus que enviou três policiais que já estavam indo embora no final do turno e que me salvaram e prenderam um homem flagrante". 

"Por mais que eu tentasse transparecer que eu estava bem nas minhas redes sociais, nesses últimos quatro meses eu e minha família sofremos em silêncio porque não queríamos exposição. Estávamos sobrevivendo dia após dia a esse pesadelo", relata.

Relembre o crime 

Edílson Florêncio foi preso em flagrante por policiais militares que passavam por uma região de matagal e suspeitaram de um veículo estacionado, no bairro Edson Queiroz, por volta de 1h da madrugada do dia 19 de janeiro. Ele havia acabado de estuprar Renata, que saiu de um bloco e chamou um carro por aplicativo para retornar para sua casa.

Segundo a vítima, o criminoso a enforcou e a ameaçou de matá-la. Ela disse que tentou reagir, mas viu que não ia ter forças e pediu para que o homem não a matasse, durante o estupro. As agressões foram confirmadas no laudo de Constatação de Crime Sexual, da Perícia Forense do Ceará (Pefoce).

NOTA DA DEFESA NA ÍNTEGRA:

"A Constituição Federal garante a todos o direito ao contraditório, à ampla defesa e ao devido processo legal, que devem ser respeitados mesmo em crimes de maior repercussão social. Embora o crime seja grave, classificado como hediondo, a pena deve observar os princípios da legalidade, proporcionalidade e individualização, previstos na Constituição e na Lei Penal Brasileira.

No caso, o réu foi condenado a 8 anos e 2 meses de reclusão. Com a atenuante da confissão e a detração penal (4 meses já cumpridos em prisão preventiva), a pena final foi fixada em 7 anos, 9 meses e 18 dias, a ser cumprida em regime semiaberto, com direito de recorrer em liberdade.

Essa decisão não absolve nem representa impunidade, mas respeita a lei e o devido processo legal, permitindo o reexame do caso pelas instâncias superiores. A defesa seguirá atuando com ética e responsabilidade, reconhecendo a dor da vítima, mas reafirmando que a justiça deve ser feita conforme a lei, e não pela emoção social".

O QUE DIZ A ACM

Após publicação da reportagem, a a Associação Cearense de Magistrados (ACM) divulgou nota manifestando "seu veemente desagravo à Excelentíssima Senhora Juíza Adriana Aguiar Magalhães, diante dos infundados e injustos ataques veiculados em redes sociais contra a sua pessoa e que visaram atingir sua reputação e dignidade enquanto representante do Poder Judiciário".

Veja nota na íntegra:

"Recentemente, a digna Magistrada, que atua na jurisdição criminal, julgou processo de sua responsabilidade cujo teor, ao que se apresenta, importou em descontentamento, especialmente em razão da pena fixada e do respectivo regime de seu cumprimento, conforme a legislação penal aplicada pela Juíza.

Em face da situação, a pessoa vitimada pelo crime objeto do processo fez postagens em redes sociais que levam ao equivocado entendimento de que a decisão seria injusta, demandando grande repercussão em meios de comunicação social. O processo em que a sentença foi lançada corre em segredo de justiça, mas, sem declinar nomes ou fatos (o que foi desconsiderado pela vítima em redes sociais), impõe-se esclarecer o seguinte:

A fixação da pena e do respectivo regime de seu cumprimento em processos penais é um ato técnico e não uma escolha pessoal ou arbitrária do magistrado. Não se trata de um critério de justiça do juiz, mas do próprio legislador. Desse modo, trata-se de uma atuação pautada na rigorosa aplicação das leis e na interpretação delas, estabelecidas em precedentes dos tribunais, de modo a garantir a imparcialidade e a legalidade do julgamento. E foi exatamente isso o que fez a Magistrada.

É necessário compreender que juízes e juízas estão vinculados à estrita observância da legislação do País e aos precedentes que orientam a fixação da pena, não podendo o aplicador das normas legais fugir a tais critérios, sob pena, inclusive, de responsabilização funcional por descumprimento à legislação aplicável.

Assim, a sentença prolatada pela Juíza, tendo seguido estritamente a tais critérios, reflete a postura responsável do Poder Judiciário face à sua função constitucional de aplicar as leis tais como postas. Se o resultado do julgamento frustrou expectativas sociais, o senso comum e a vítima, talvez seja o momento de a sociedade refletir e discutir a legislação penal vigente, mas revela-se inadmissível o ataque à dignidade da pessoa da Magistrada que, de forma célere e responsável, julgou o processo com base na prova dos autos, no devido processo legal e na legislação aplicável ao caso.

Pontue-se que a Magistratura cearense, da qual faz parte a Juíza Adriana Aguiar Magalhães, solidariza-se com todas as vítimas de crimes e atos violentos e se coloca à disposição da sociedade para contribuir com o debate acerca das eventuais mudanças na legislação Penal e Processual Penal. No entanto, não podemos aceitar que a má compreensão do sistema judicial resulte em críticas infundadas e injustas que importem em ataques pessoais àqueles que cumprem sua missão de aplicar a lei.

Reafirmamos o compromisso do Poder Judiciário com a justiça, a legalidade e a ética, e reiteramos nosso apoio à Juíza Adriana Aguiar Magalhães, cuja conduta ilibada e dedicação ao serviço jurisdicional ao longo de anos merecem todo o nosso respeito e reconhecimento".

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