PM acusado de integrar organização criminosa tem pedido de liberdade negado pela Justiça

Paulo Rogério Bezerra do Nascimento foi flagrado planejando extorquir um comerciante e se aproveitava de sua função para praticar crimes, segundo denúncias do Ministério Público

Escrito por Matheus Facundo , matheus.facundo@svm.com.br
PM andando em presídio militar
Legenda: Sargento continuará encarcerado no Presídio Militar, em Fortaleza
Foto: Arquivo DN

O sargento da Polícia Militar do Ceará (PMCE) Paulo Rogério Bezerra do Nascimento, acusado de integrar uma organização criminosa com outros PMs e até traficantes, teve o pedido de revogação de prisão preventiva negado pela Justiça Estadual no último dia 7 de março. Ele foi preso em julho de 2022 por extorsão após ser denunciado no âmbito da Operação Gênesis, mas já responde a mais de seis ações penais na Justiça Militar, e permanecerá sob custódia no Presídio Militar. 

Cerca de dois meses após ser preso, ele teve o benefício de prisão domiciliar com uso de tornozeleira eletrônica, mas violou o sistema de monitoramento por "diversas vezes". Essas situações foram determinantes para que a Vara da Auditoria Militar indeferisse o pedido de relaxamento de prisão. 

O pedido foi feito pelo advogado PM no dia 7 de fevereiro, alegando "excesso de prazo na formação de culpa", por conta de demora no prazo de instrução criminal e avanço do processo. Eles também apontam ausência de motivos para a permanência da prisão preventiva. 

No entanto, segundo a decisão, as teses não se sustentam, pois o processo não se resume apenas a uma "conta aritmética". Conforme o documento, devem ser consideradas as circunstâncias do caso, que podem justificar o atraso. 

Para a juíza Christianne Braga Magalhães Cabral, as provas obtidas contra o sargento Bezerra nas investigações, conduzidas pelo Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado (Gaeco) do MPCE, justificam a manutenção da prisão. 

De acordo com a decisão, é possível que ele volte a praticar crimes uma vez solto, pois se valeu de sua função e do aparato do Estado "para auferir vantagem econômica de maneira ilegal". Medidas cautelares alternativas também foram descartadas para evitar que o agente intimide e ameace testemunhas.

"Tendo em vista a materialidade os indícios de autoria coletados através das interceptações telefônicas, onde se descobriu que os agentes estatais investigados na ação principal, utilizando-se do cargo militar, supostamente praticavam os delitos de extorsão, corrupção passiva, peculato, tráfico ilícito de drogas, dentre outras condutas correlatas, no município de Fortaleza", justifica a juíza.

Defesa entrará com novo recurso 

Em nota, a defesa técnica de Paulo, representada pela assessoria jurídica da Associação de Praças da Polícia Militar e Corpo de Bombeiros Militar do Ceará (Aspramece), informou que a decisão judicial "é completamente desarrazoada" e que será pedido novo recurso em instância superior. 

"O militar encontra-se recolhido no presídio preventivamente há mais de um ano e seis meses, não tendo a instrução processual encerrado ainda, configurando um extremo constrangimento ilegal", aponta. 

Ainda segundo a defesa, "por decorrência da investigação acusatória em questão, fatos que deram origem ao processo judicial também estão sendo apurados na CGD, Controladoria Geral de Disciplina, sendo que o militar já colaciona diversas absolvições, todas anexadas nos autos, não sendo proporcional que o militar padeça indefinidamente no cárcere". 

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Prisão e 'desdém' pela Justiça 

Desde que foi preso em 21 de julho de 2022, o sargento Bezerra teve vários problemas com a Justiça e chegou a ser acusado pelo juiz Roberto Soares Bulcão Coutinho, da Vara da Auditoria Militar, de "desdenhar" do Poder Judiciário.

Por contas de um tratamento de saúde, em setembro do mesmo ano ele conseguiu prisão domiciliar com tornozeleira eletrônica, mas descumpriu as medidas cautelares por diversas vezes, conforme o MPCE. 

O sargento negou à época, mas ofícios expedidos pela Coordenadoria de Monitoração Eletrônica de Pessoas (Comep) da Secretaria da Administração Penitenciária e Ressocialização (SAP) atestaram as falhas. 

Em novembro, a Justiça determinou que Paulo Rogério retornasse ao Presídio Militar. Dois meses depois, em janeiro de 2023, os advogados pediram nova prisão domiciliar por conta de uma tuberculose pulmonar, mas a Vara Militar negou. 

Na negativa, o juiz alegou "que ele [2º Sargento Bezerra] se trata de agente público de alta periculosidade". 

"O requerente infringiu ordem judicial, retornando ao ergástulo (cadeia) por desobediência e agora vem novamente pedir a prisão em domicílio, desdenhando da Justiça, ressaltando que contra sua pessoa já há diversos procedimentos e processos criminais por supostas práticas de delitos graves investigadas pelo MP/GAECO, inclusive de participação em organização criminosa, levando a crer que se trata de agente público de alta periculosidade", afirmou o magistrado Roberto Bulcão. 

Um caso recente é o que ocorreu no dia 23 de dezembro do ano passado, quando uma arma de Paulo Rogério, que está preso, foi usada por um soldado da PM para atirar em um tenente durante uma confusão em Fortaleza. O caso é alvo de investigação da Controladoria Geral de Disciplina dos Órgãos de Segurança Pública e Sistema Penitenciário (CGD). 

Sequência de crimes 

Segundo o MPCE, o militar atuava com traficantes praticando extorsões e uma série de outros crimes. Em uma interceptação telefônica, o sargento e outros policiais foram flagrados planejando abordar um comerciante para extorqui-lo.

Consta em um dos processos contra o sargento que atuava na coordenação de situações criminosas, se aliando a outros agentes para extorquir vítimas. Em 2017, o agente teria participado de uma extorsão a um proprietário de mercadinho, que também atuava como agiota.

Uma das interceptações de celular mostra Paulo conversando com o policial civil aposentado e considerado líder de um grupo criminoso, Valberto Evangelista da Costa, para acertar a divisão de R$ 6 mil prometidos a eles por um traficante que não queria ser preso. "Só isso, macho", reclama o PM. "Diz que foi pouco, diga logo quanto foi pra combinar logo", pede o policial civil. Pronto, uns 1.500 pros meninos (policiais militares), sobrou o que, 2.500 para nós, né? Três e quinhentos, né?", pergunta Paulo Rogério.

A denúncia que levou Bezerra à prisão foi feita em maio de 2022, no bojo do relatório final da 8ª fase da Operação Gênesis pelo MPCE. Ele e os sargentos Auricélio da Silva Araripe, Tony Cleber Pereira de Souza, Edvaldo da Silva Cavalcante; o tenente Antônio Marciano Mota dos Santos e o soldado Vinícius André de Sousa foram denunciados por crimes como extorsão, corrupção passiva, peculato e tráfico de drogas. 

O grupo de PMs era liderado pelo sargento Auricélio. Paulo Rogério prestava apoio ao bando e atuava quando era mobilizado. Auricélio, inclusive, foi demitido da PMCE em 2021, pois é acusado e uma série de delitos. 

Em outra atividade criminosa, investigada pela Operação Saratoga, o sargento Bezerra estaria ligado a uma facção criminosa paulista, se valendo da função enquanto militar para acobertar o tráfico ilícito de entorpecentes.

"Os crimes eram perpetrados diuturnamente e, na maior parte das vezes, no próprio turno de serviço dos denunciados, com pleno abuso das prerrogativas que a farda e a função policial lhes incumbiam. Proteger a comunidade e praticar o policiamento ostensivo da área eram atitudes preteridas por tais agentes da lei quando assumiram o controle da viatura. Ao contrário, reiteradamente arquitetaram, planejavam e executavam extorsões, roubos, tráfico ilícito de entorpecentes, associação para o tráfico, corrupção passiva e o comércio irregular de armas e munições", diz denúncia do Gaeco.

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