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Oposição quer instalar CPI para investigar repasses para tratamento de oncologia em Fortaleza

Desencadeada por declaração de líder do prefeito Sarto, ação de vereadores pretende investigar repasses do Município para o tratamento de câncer

Escrito por Bruno Leite , bruno.leite@svm.com.br
Câmara de Fortaleza
Legenda: Requerimento que busca averiguar situação já conta com 12 assinaturas.
Foto: Érika Fonseca / Câmara Municipal de Fortaleza

Parlamentares de oposição da Câmara Municipal de Fortaleza (CMFor) mobilizam a instalação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para apurar o corte de verbas para o Centro Regional Integrado de Oncologia (Crio) pelo Município.

A movimentação iniciou-se nesta terça-feira (21), uma semana após a repercussão da fala do líder do Governo Sarto na Casa Legislativa, o vereador Carlos Mesquita (PDT). Na oportunidade em que proferiu a declaração-estopim, feita em resposta a uma denúncia da vereadora Ana Paula (PDT), o político argumentou que a "tesourada" no repasse de recursos se deu de maneira proposital, a fim de pressionar o Estado a também financiar os procedimentos realizados pela unidade.

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Segundo o vereador Léo Couto, que organiza a coleta de assinaturas, as declarações são graves e a ação governamental precisa ser investigada. "Nós tivemos afirmações do líder do governo, onde ele, a meu ver, fala com o prefeito, articula ações, as matérias que vem para a Casa. Foram afirmações graves, onde pessoas da oncologia da nossa cidade estão morrendo, estão deixando de ter atendimento nesta doença que é terrível", argumentou. 

Pelo que disse o propositor, até esta quarta-feira (22), 12 vereadores subscreveram o pedido, conforme Couto. Caso seja realmente instalado, afirmou o vereador, o colegiado terá como trabalho inicial a análise do envio de montantes pela União para o Fundo Municipal de Saúde.

"No pedido da CPI, nós colocamos para investigar os repasses que o governador Elmano (de Freitas, PT) e a secretária (da Saúde) Tânia (Mara), em articulação com o Governo Federal, fizeram para o fundo municipal. Foram recebidos mais de R$ 55 milhões (pela Prefeitura) e esses valores até o momento não foram repassados", mencionou Léo Couto, adicionando que tal quantia iria para instituições que oferecem atendimento a pacientes oncológicos.

Gestão dos recursos

A assessoria de comunicação da Secretaria Municipal de Saúde (SMS) foi demandada para que pudesse esclarecer o represamento de verbas acusado por Couto e detalhar o volume de recursos destinados ao setor oncológico da Capital.

Em resposta, enviada em vídeo, o titular da pasta, Galeno Taumaturgo, afirmou que o Município, juntamente com o Ministério da Saúde (MS), mantém convênio com o Crio e, atualmente, é o grande responsável pela manutenção da "oncologia de Fortaleza e parte da oncologia do estado do Ceará".

"É simples, é fácil de entender, é necessário que todos os entes participem desse financiamento. Qualquer fala diferente disso não condiz com a verdade. Nós dizemos que a oncologia deve ser 'trifinanciada', Ministério da Saúde, Estado e Prefeitura", cobrou o secretário.

Pelo que explicou, é necessário que cada um dos entes contribua com o setor, para que "as coisas possam até caminhar de maneira mais fácil". "Temos a mais absoluta convicção de que a Prefeitura de Fortaleza tem feito a sua parte em todas as áreas e principalmente na oncologia", finalizou.

Em uma nota complementar, a SMS ratificou o que disse Taumaturgo e indicou ainda o investimento anual feito no setor. O braço da Saúde da administração municipal, no entanto, não respondeu o questionamento feito com base no que foi alegado pelo vereador Léo Couto.

"A Prefeitura de Fortaleza tem custo anual de R$ 133,8 milhões com o tratamento de pacientes com câncer. No último mês, o município ampliou em R$ 3,6 milhões o repasse anual para o Centro Regional Integrado de Oncologia (Crio). Atualmente, 60% dos pacientes oncológicos atendidos na rede conveniada pelo município de Fortaleza são do interior. Esses tratamentos são financiados com recursos da Prefeitura de Fortaleza e do Governo Federal", diz o comunicado. 

Situação contesta

A manobra oposicionista não foi bem recebida pelos vereadores da base. Presente na sessão legislativa desta terça-feira, Adail Júnior (PDT) se manifestou na tribuna de maneira contrária, contestando a legitimidade da CPI e questionando a participação do Governo do Ceará no financiamento. E reforçou a crítica quando questionado pela reportagem. 

"Primeiro eu fico muito contente que aconteça essa CPI, mas para discutir realmente o Crio, para discutir o que está acontecendo, afinal estamos falando de verbas de oncologia, de um tratamento caríssimo, independente de onde venha o recurso, seja municipal, estadual ou federal", disse o pedetista, durante entrevista

Foto da ala de quimioterapia do Crio
Legenda: Conforme parlamentares governistas, administração municipal arca com maior parte do custo para manter o Crio.
Foto: Reprodução / Crio

Segundo Adail, o custo total para manter o equipamento é superior a R$ 130 milhões, sendo que a Prefeitura de Fortaleza desembolsa R$ 47 milhões do montante e o restante é enviado pelo Governo Federal através do Ministério da Saúde.

Na sua análise, a comissão sugerida tem outra finalidade, de cunho político. "Estou curioso em saber quais vereadores estão assinando a CPI, quero ver se estão realmente preocupados com o Crio e o pessoal da oncologia ou preocupados em fazer política", provocou, acrescentando que o debate se instalou há mais de um mês e o grupo antagônico não tem apresentado dados que sustentem as acusações. 

O Diário do Nordeste solicitou ao vereador Léo Couto a lista de assinantes e aguarda retorno.

"Efeito reverso"

Márcio Martins (SD), ao usar seu tempo de discurso, apoiou o colega e também questionou a incursão dos opositores ao prefeito José Sarto (PDT) no Legislativo municipal. "Se dependesse de mim, a gente assinava essa CPI hoje. Quem não tiver ficha, não sente na mesa", alegou, afirmando que por ter maioria na CMFor, o bloco governista tem vantagem na composição da instância que está sendo pleiteada. 

O integrante do Solidariedade comparou a ação com a Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) dos Atos Antidemocráticos, criada no Congresso Nacional por força de aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) para a realização de investigações dos ataques aos prédios dos Três Poderes, em Brasília, no último 8 de Janeiro. Ao fim dos trabalhos, o próprio ex-chefe do Executivo, ex-ministros da sua gestão e ex-assessores foram listados no relatório como alvos de pedidos de indiciamento por crimes contra a democracia.

Na visão dele, a mobilização poderá ter um efeito reverso semelhante ao da CPMI, desfavorável para os que estão assinando o requerimento de Léo Couto, uma vez que ocupantes de cargos na administração chefiada pelo governador Elmano de Freitas (PT) poderão ser convocados compulsoriamente pelos vereadores.

"Eu digo que a gente deve assinar. Já me candidatei para ser relator, presidente, vice, soldado... não sei. Eu quero estar", ironizou Martins. 

Declaração posta à prova

Componente da bancada de oposição, Adriana Almeida (PT) alegou que a atitude do seu agrupamento se deu pela cobrança da população após o pronunciamento do líder. "Nós, enquanto vereadores, estamos sendo cobrados diariamente em relação a isso, a essa fala. E acredito que nós vereadores e vereadoras temos essa missão mesmo, de fiscalizar, cobrar e acompanhar", pontuou. 

A petista destacou a provável saída de Mesquita da liderança - anunciada por Sarto nesta segunda-feira (20) - como uma consequência da declaração recente e salientou que, dada a relevância da colocação, vinda de um aliado do gestor municipal, é necessário que o tema seja avaliado com rigor. 

"É uma fala em que a gente deveria estar, grande parte dos vereadores assinando essa CPI, para a gente possa realmente provar se ela é verdadeira ou não. Não fomos nós que inventamos", disse a parlamentar diante dos colegas, ao usar a tribuna da Casa.

Almeida fez ainda um apelo pela adesão de mais vereadores. "Se essa fala não era verídica, vai ser provado. Se ela for verídica, também será provado. É para isso que serve uma CPI também. Não deveriam ficar em apenas 12 vereadores", continuou.

Novos rumos

A destituição de Carlos Mesquita da função de líder - ocupada por ele desde janeiro deste ano - teria sido um pedido do próprio, pelo que afirmou o mandatário da Capital cearense. A despedida, que deve alterar os rumos da estratégia política na Casa, foi tema de uma conversa reservada entre os dois durante o início da tarde desta terça.

Ao que disseram correligionários, a expectativa era de que a decisão fosse oficializada ainda na segunda e, assim, a nova liderança fosse anunciada concomitantemente com a pessoa que irá ocupar o cargo de vice-líder - este último está vago desde outubro, quando da saída de Didi Mangueira (PDT), que é suplente, do quadro de legisladores. 

Nos bastidores, a exposição-pivô de Mesquita foi considerada como um "deslize", tanto por aliados como opositores. Ele está na Câmara Municipal há oito mandatos.

Nesta quarta-feira (22), ao ser indagado sobre sua despedida da cadeira de líder do prefeito, o vereador indicou que ainda terá outro encontro com a chefia do Executivo. "Ainda estou (na liderança). Vou para uma reunião agora. Estou aqui fazendo meu papel. (Vou) esperar o Sarto se pronunciar", disse. 

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