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O que se sabe sobre o pagamento do piso da enfermagem às vésperas da mudança de governo

Enquanto a suspensão da lei que institui o piso é mantida pelo Supremo Tribunal Federal, o Congresso busca maneiras de viabilizar a aplicação dos novos salários

Escrito por Ingrid Campos , ingrid.campos@svm.com.br
Legenda: Profissionais de enfermagem realizaram forte mobilização pela aprovação e sanção da lei do piso durante a pandemia.
Foto: Divulgação/Sindisaúde-CE

Tão esperado e articulado pela Enfermagem, o novo piso da categoria tem encontrado entraves jurídicos para ser executado no País. Em setembro, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) referendou liminar do ministro Luís Roberto Barroso que suspendeu os novos vencimentos para essa categoria profissional. 

Na ocasião, foi dado um prazo de 60 dias para que entes públicos e privados responsáveis pelo pagamento esclareçam os efeitos da medida, com descrição do impacto financeiro, dos riscos para a empregabilidade no setor e de eventual redução na qualidade dos serviços.

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Buscando garantir o reajuste salarial da categoria, a Câmara dos Deputados retomou a análise sobre a proposta de emenda à constituição (PEC) 390/14, do cearense André Figueiredo (PDT). O texto prevê a ampliação do limite de despesas com pessoal ativo não só na área da saúde, mas também da educação.

Para isso, teve que instalar, na última semana, uma Comissão Especial para deliberar sobre a matéria. Além de Figueiredo, o colegiado conta com os conterrâneos Célio Studart (PSD), Mauro Filho (PDT) e Eduardo Bismarck (PDT), sendo este suplente.

Outras propostas também tramitam na Casa nesse sentido. A de desoneração da folha de pagamentos da saúde e a de destinação de impostos de jogos de apostas são algumas delas. Contudo, para Célio, a PEC citada acima e a alocação de recursos pela PEC da Transição são as alternativas mais consistentes para bancar o piso.

A lei sancionada em agosto deste ano instituiu um salário-mínimo de R$ 4.750 para enfermeiros, de R$ 3.325 para técnicos de enfermagem e de R$ 2.375 para auxiliares de enfermagem e parteiras.

As PECs e a Comissão

A proposta de André Figueiredo foi apensada à PEC 27/2022, de Mauro Filho, para facilitar o trâmite na Casa. Esta matéria indica que a União preste assistência financeira complementar aos entes federados (incluindo municípios) e às entidades filantrópicas para o cumprimento dos pisos salariais da Enfermagem. 

As fontes de recursos para tal são os superávits financeiros dos fundos públicos do Planalto, ou seja, montantes sinalizados para propósitos específicos que não foram utilizados. Assim, teria uma reserva de R$ 12 bilhões para o pagamento dos profissionais de saúde.  

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O texto também disciplina a forma de contabilização do acréscimo de receita para União, estados e municípios. Com o aumento de gasto de pessoal, o percentual de apuração dessa despesa sobre receita corrente líquida ia ser prejudicado, o que levaria gestores públicos a ferirem a Lei de Responsabilidade Fiscal. 

O deputado Mauro Filho explica o escalonamento que propõe na PEC. “No primeiro ano após a publicação da emenda constitucional, as três instâncias não precisarão registrar esse aumento de despesa. No segundo ano, eles vão apropriar 10% do total dessa despesa e, ao final do 10º ano, serão 100%. Então tem somente um ano de carência e dez anos para apropriar essa despesa, ou seja, os municípios e estados brasileiros, além da União, terão onze anos para poder se adaptar a esse aumento da despesa de pessoal”, disse em entrevista para a Rádio Câmara.

Agora, a PEC 27 tramita com o apenso na Comissão Especial. Esta tem um prazo de 40 sessões plenárias para votar a proposta e dez sessões para a apresentação de emendas. Depois de passar pelo colegiado, a matéria vai ser analisada pelo Plenário em dois turnos.

Como o prazo é longo para a urgência da matéria, a Câmara está registrando sessões de segunda a sexta para adiantar o processo. Com esse ritmo, a previsão é que o texto chegue ao Plenário em 14 de dezembro, caso não haja pedido de vista.

Outra emenda constitucional que pode viabilizar o piso é a PEC da Transição que, em resumo, suspende o teto de gastos sobre programas específicos, como o Bolsa Família, a fim de garanti-los no Orçamento do próximo ano.

Como explica Célio Studart, há um relatório dentro da proposta que prevê de R$ 10 bi a R$ 20 bi para o pagamento do piso. Segundo o deputado, a iniciativa pode ser bem sucedida, já que tem um “valor muito pequeno comparado ao valor total para o tamanho da importância que tem”.

Para o parlamentar, com essas duas alternativas garantidas, há elementos mais fortes para o STF revogar a liminar. 

Por parte das gestões estaduais e municipais, espera-se que o despacho seja feito a tempo de incluir no Orçamento do próximo ano, a fim de evitar abertura de crédito extraordinário para promover o pagamento dos novos salários, entre outras medidas.

Em Fortaleza, por exemplo, mesmo com a incerteza sobre o piso a nível federal, essa nova despesa deve ser incluída nas previsões orçamentárias de 2023 da Prefeitura. A informação foi confirmada pela vereadora Enfermeira Ana Paula (PDT) com base em diálogo com o secretário de Planejamento, Orçamento e Gestão, Marcelo Pinheiro.

Outras iniciativas

O senador Fabiano Contarato (PT-ES), autor do projeto que criou o piso da categoria, anunciou, nesta semana, que enviou dois ofícios junto ao STF, direcionados aos ministros Barroso e Rosa Weber, reforçando a importância da lei sancionada em agosto e solicitando uma audiência para tratar da revogação da suspensão da aplicação dos novos valores.

"Essa é uma luta de mais de 30 anos desses profissionais, que passaram pela pandemia pagando com a própria vida para nos proteger. Aprovamos o projeto no Congresso com amplo apoio de todo o legislativo, que foi sancionado pelo presidente da República, obedecendo a todos os preceitos legais para que se tornasse Lei. O piso é constitucional e precisa ser efetivado", disse, pelas redes sociais.

Na quarta-feira (7), outra medida foi tomada no sentido de viabilizar os pagamentos. A Lei Complementar 197 foi publicada no Diário Oficial da União (DOU) a fim de garantir o repasse de R$ 2 bilhões para as Santas Casas até o fim de 2023. A origem dos recursos são saldos de repasses do governo federal para os fundos de saúde e assistência social de estados e municípios.

As Santas Casas foram as mais afetadas pela implementação do piso, já que tiveram que aplicá-los de imediato. Essas entidades atendem considerável demanda do Sistema Único de Saúde (SUS) com recursos da União, mas, em outra parcela, também arcam com os próprios custos de funcionamento. 

O piso no STF

Até o momento da publicação desta matéria, a suspensão da lei que estabelece o piso se mantém. Na última sexta-feira (2), o Conselho Federal de Enfermagem (Cofen) pediu ao Supremo o fim da suspensão liminar do ministro Barroso, sob justificativa de que o impacto financeiro já é conhecido e que as medidas para o equilíbrio orçamentário já estão em curso.

Além disso, afirmou não haver risco de demissões em massa – como a autora da ação no STF, a Confederação Nacional de Saúde, Hospitais e Estabelecimentos e Serviços (CNSaúde), alegou. O Cofen ainda apontou uma interferência do Judiciário em decisões políticas bem fundamentadas em outros Poderes.

“O piso da Enfermagem foi aprovado em dois turnos por mais de 97% dos parlamentares e sancionado pelo poder executivo na mesma medida. As alegações de inconstitucionalidade feitas pela CNSaúde não param em pé, já foram todas desmistificadas. Portanto, precisamos restabelecer o direito e colocar o piso nos contracheques dos trabalhadores”, diz a presidente do Cofen, Betânia Santos.

Transição 

O tema ganha mais complexidade com a mudança de gestão no Planalto. O presidente eleito Lula (PT) já sinalizou apoio ao novo piso, posição reforçada pela sua equipe de transição.

No último dia 24, entidades do Fórum Nacional da Enfermagem, entre elas o Cofen e o CNSaúde, participaram de reunião com o grupo técnico de Saúde da transição de Lula para tratar sobre o tema. 

O piso entra em um relatório de diagnóstico a ser entregue ao novo governo e deve ser prioridade no próximo mandato, afirma o coordenador do GT de saúde, o ex-ministro Arthur Chioro.

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