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O que a disputa no Centrão pela filiação de Bolsonaro indica sobre as chances de reeleição em 2022

Apesar da coleção de crises que acumula, presidente já foi cortejado por pelo menos cinco partidos. Agora, PP e PL travam queda de braço

Escrito por Igor Cavalcante , igor.cavalcante@svm.com.br
Presidente pode tentar reeleição em 2022
Legenda: Presidente pode tentar reeleição em 2022
Foto: Carolina Antunes/PR

Popularidade em baixa, denúncias de corrupção contra familiares e dezenas de processos de impeachment praticamente inviabilizariam qualquer político numa disputa eleitoral. Essa é a conjuntura atual em torno do presidente Jair Bolsonaro (sem partido). Ainda assim, mesmo com uma coleção de problemas, o político ainda se mostra forte para a eleição do próximo ano, apontam especialistas. Prova disso é a queda de braço entre partidos do Centrão que tentam atraí-lo para seus quadros. 

O presidente já foi cortejado pelo PSL, sigla que o abrigou em 2018. As tratativas, no entanto, não avançaram e agora a legenda se funde ao DEM para lançar o União Brasil. Outra sigla que se aproximou do chefe do Executivo nacional foi o Patriota. Manobras de parte do diretório nacional da sigla para filiar o presidente  foram o estopim para um embate interno que acabou afastando o chefe do Executivo nacional da legenda – ainda que seu filho, o senador Flávio Bolsonaro, tenha se filiado.

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O PTB, do ex-deputado Roberto Jefferson, também já fez diversos convites ao presidente, mas, após a prisão do ex-parlamentar, a relação entre os aliados vive um momento turbulento. Em carta divulgada nesta semana, Jefferson acusou Bolsonaro e o senador Flávio Bolsonaro de estarem viciados “nas facilidades do dinheiro público”.

A disputa da vez

Agora, Bolsonaro tem diante de si duas legendas que compõem o Centrão disputando sua filiação. De um lado está o PP, do presidente da Câmara, Arthur Lira, e de outro o PL, do ex-deputado Valdemar Costa Neto. 

Caciques políticos brasileiros, os dois articulam nos bastidores para levar o presidente para seus quadros até 2022. Porém, PP e PL também compõem atualmente a base de sustentação do Governo no Congresso e a disputa de força pode ameaçar essa aliança. 

Ciro Nogeuira e Bolsonaro
Legenda: Neste ano, o presidente nomeou como ministro-chefe da Casa Civil o senador Ciro Nogueira (PP-PI), um dos caciques do Centrão
Foto: Marcos Corrêa/PR

Para a doutora em Ciência Política pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Priscila Lapa, a dificuldade em atrair o presidente gira em torno do próprio modo centralizador dele de fazer política. 

“Não vejo essas lideranças (partidárias) abrindo mão da estrutura de poder para abrigar o presidente, até porque ele, por mais que tenha a força de estrutura, vem para uma disputa que pode ganhar ou perder, então como esses medalhões vão abrir mão de um poder que já têm em nome de uma força política que chega agora, que agrega, mas pode não decidir isso sozinho?”, questiona. 

"Ocorre o contrário do que foi com o PSL em 2018, quando havia um vazio de capital político e ideológico no partido, então foi mais fácil. No PSL de hoje, ele já não cabe mais, o partido ficou grande, precisaria contemplar vários integrantes e interesses”, acrescenta. 

Pragmatismo do Centrão

Essas articulações envolvendo o PP e o PL podem impactar inclusive no Ceará. Na bancada do Estado, AJ Albuquerque (PP), Dr. Jaziel (PL) e Júnior Mano (PL) são aliados do presidente em Brasília. 

Para a professora de Teoria Política da Universidade Estadual do Ceará, Monalisa Torres, o pragmatismo dessas siglas tornam mais claros os critérios que devem ser levados em conta na hora de disputar a filiação do presidente.

Ela cita fatores como a viabilidade eleitoral, as chances de disputar o segundo turno e a contribuição para eleger parlamentares, por exemplo. “Além de tudo isso, ele é o presidente. Desde a redemocratização, todos os presidentes que buscaram a reeleição conseguiram conquistá-la. Claro que ele é um personagem diferente, mas chega com a caneta na mão, com poder sobre o orçamento e sobre obras”, aponta.

Bolsonaro
Legenda: Escolha do partido também define, por exemplo, tempo que o presidente terá de propaganda eleitoral na campanha
Foto: Anderson Riedel/PR

O poder das bancadas

Na mesa estão duas grandes bancadas na Câmara. O PL tem 43 deputados, enquanto o PP soma 42. O interesse pelas duas siglas foi admitido nesta semana pelo próprio presidente. Ele revelou que mantém conversas com integrantes dos partidos sobre sua filiação. 

Na última segunda-feira (25), Costa Neto oficializou o convite ao presidente através de um vídeo divulgado nas redes sociais. Ele disse que a sigla tem “um projeto partidário arrojado para 2022” e que buscará “protagonismo”. A publicação da fala do ex-deputado foi vista como uma forma de emparedar Bolsonaro para se filiar à sigla. 

Em reação, o ministro-chefe da Casa Civil, Ciro Nogueira, e Arthur Lira, ambos do PP, se reuniram com o presidente para reforçar o interesse do partido em tê-lo em seus quadros. Entre as exigências de Bolsonaro está o apoio da sigla a aliados do presidente em estados estratégicos, como São Paulo, Rio de Janeiro e Roraima. 

Neste caso, o cenário em São Paulo pesa contra o PL, que tem um acordo com Rodrigo Garcia (DEM), vice de João Doria (PSDB). Já o PP tem alianças com partidos de esquerda no Nordeste, região onde o presidente tem investido para reverter a preferência pelo ex-presidente Lula (PT). 

Bolsonaro e o Centrão

Assim como Priscila Lapa, a cientista política Monalisa Torres ressalta a dificuldade que o presidente encontrará em impor seus interesses para caciques políticos mais experientes.

“O que dificulta é que essas lideranças não querem perder suas posições, porque alguns cargos dentro de um partido podem distribuir recursos do fundo eleitoral, então é uma posição de poder, e tudo isso entra em negociação. Alguns desses medalhões não vão querer abrir mão, então acredito que esse é o motivo de ele não ter se filiado ainda”, afirma. 

Contudo, para ela, ainda que o presidente escolha uma das siglas, é pouco provável que aquela que foi preterida promova uma ruptura com o Governo Federal. “Não acredito que haja uma debandada dos partidos do Centrão, a menos que aconteça uma reviravolta e ele perca essa base fiel, chegue a um índice muito baixo, aí sim poderíamos imaginar uma debandada”, pondera. 

Afinal, o que faz de Bolsonaro um forte candidato?

A cerca de um ano das eleições, Bolsonaro aparece em segundo lugar em todas as pesquisas eleitorais. Ao longo dos últimos meses, a distância entre ele e o primeiro colocado nas intenções de voto, o ex-presidente Lula, tem reduzido, ainda que o petista cultive uma larga vantagem.  “E ele (Bolsonaro) chega com um know how de comunicação com o eleitor que não pode ser desprezado”, acrescenta Torres. 

O Governo Federal também planeja, já para o próximo mês, o início do pagamento do Auxílio Brasil. O programa substitui o Bolsa Família, iniciativa que tem identificação com governos petistas. 

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A implantação do Auxílio Brasil é motivo de forte impasse econômico, já que a expectativa é de que o Governo fure o teto de gastos para viabilizar o pagamento do benefício. Ainda assim, historicamente a popularidade do presidente enfrenta períodos de crescimento quando ocorre o pagamento de benefícios desse tipo. Isso ocorreu durante o auge da pandemia, por exemplo, quando foi implementado o auxílio emergencial. 

Para Monalisa Torres, engana-se quem pensa que Bolsonaro é um “cachorro morto”. “Apesar do desgaste que vem sofrendo, sobretudo após a CPI da Covid-19, o presidente tem uma base eleitoral muito resiliente. Se compararmos com o apoio que tinha a (ex-presidente) Dilma (Rousseff) na época do impeachment, quando a avaliação positiva dela era em torno de 10%, a avaliação positiva do Bolsonaro mostra-se relativamente confortável, apesar de a situação dele não ser fácil”, avalia. 

Aliados de peso

Politicamente, apesar de acumular mais de cem processos de impeachment, o presidente tem entre seus aliados Arthur Lira, presidente da Câmara, que é responsável por pautar ou não esse tipo de pedido. Lira, por sua vez, já deu sinais de que não pretende fazer avançar um eventual impeachment.

Neste mês, também chegou ao fim a CPI da Covid-19, que sugeriu o indiciamento do presidente, mas depende de ações de outras instituições para que isso ocorra, entre elas a Procuradoria Geral da República, liderada por Augusto Aras, com quem o presidente mantém boa relação. 

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Também na última semana, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) arquivou o pedido de cassação da chapa Bolsonaro-Mourão. Eles eram acusados de fazer uso de disparo em massa de mensagens na campanha eleitoral de 2018. A Corte entendeu que houve a ilegalidade, mas não conseguiu enxergar provas ligando diretamente a chapa a esse tipo de conduta. 

“Além da base eleitoral, o capital político dele é muito resiliente, não à toa ele se mantém indo para o segundo turno, segundo as pesquisas, então dentre tantas candidaturas, a preço de hoje, Bolsonaro é um dos nomes mais fortes para chegar ao segundo turno no ano que vem”, conclui Monalisa Torres.

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