Por que a indústria e o setor de confecção perderam força no PIB do Ceará e o que esperar para 2023
A economia cearense cresceu 0,96%, mas ficou abaixo da média nacional
Com forte queda da indústria (-6,28%) e o setor de serviços (1,92%) ainda se recuperando do baque da pandemia, coube à agropecuária (7,70%) manter o Produto Interno Bruto do Ceará (PIB, a soma de todos os bens e serviços produzidos) no azul ao longo de 2022.
Nesse cenário, a economia cearense avançou 0,96%, mas ficou abaixo da média nacional, conforme dados divulgados, nesta segunda-feira (20), pelo Instituto de Pesquisa e Estratégia Econômica (Ipece).
O analista de Políticas Públicas do Ipece, Witalo Paiva, observou que a indústria foi impactada pelo setor da transformação, com queda acumulada de 4,9%.
“Quando avaliamos no longo prazo, nos últimos dez anos, essa indústria oscilou entre desempenhos negativos e positivos, mas é importante notar que não consegue ou não conseguiu manter uma trajetória de crescimento sustentada. 2022 é mais um ano ruim nesse universo”, explicou.
Paiva atribuiu “muito do descolamento entre o Brasil e o Ceará” ao segmento. “A transformação parece ter sido mais afetada com essa conjuntura que marca o 2º semestre: inflação e juros mais altos”, listou, durante coletiva.
O economista ressaltou, ainda, sobre as atividades de eletricidade, gás e água, as quais também contribuíram para a derrubada do desempenho industrial.
Em 2021, esses setores tiveram um crescimento devido à crise hídrica, demandando o acionamento das térmicas no Ceará. Como em 2022 não houve a mesma necessidade, ocorreu uma forte redução na geração de energia.
“Acompanhamos, nos últimos meses, o fechamento de importantes indústrias no Estado. Isso reflete uma conjuntura ruim para o segmento. Essa queda da confecção em vestuário pode ser pontual. Ou seja, o setor está passando por alguma reorganização que o recoloque em equilíbrio, mas como uma escala menor”, explanou.
“A outra hipótese é uma própria perda de competitividade no Ceará. Isso leva uma freada na produção. São dois cenários possíveis, mas é preciso avaliar com mais cuidado, com estudos mais aprofundados para entender essa dinâmica recente”, completou.
O que esperar da indústria cearense para 2023?
Para 2023, a estimativa é de crescimento de 1,33% do PIB do Ceará e recuperação de patamar superior à média nacional, conforme o Instituto de Pesquisa e Estratégia Econômica (Ipece).
De acordo com o analista de Políticas Públicas do Ipece, Witalo Paiva, a estimativa foi revisada de 2,19% para o percentual atual devido à expectativa de baixo crescimento na economia brasileira.
Para ele, 2023 também deve ser um ano de pouco avanço em relação à indústria cearense.
“Deve ser mais um ano difícil para atividade. A própria indústria brasileira atravessa o mesmo momento. Muito disso pela própria dinâmica da nossa indústria. Como falei antes, a atividade não consegue engatar anos de crescimento, tem uma performance de baixo dinamismo e isso interfere no resultado desse ano”, sublinhou.
Outra coisa é a manutenção desse cenário de juros ainda alto e de inflação acima da média, que pressiona poder de compra, o mercado consumidor e consumo das famílias”
Paiva ponderou, todavia, sobre uma nova revisão a ser feita em junho próximo, podendo ser atualizada conforme o nível de aceleração da economia brasileira.
O economista e professor da Universidade Estadual do Ceará (Uece), Ricardo Coimbra, avalia que o resultado do PIB do Ceará reflete o processo de desaceleração econômica, no 4º trimestre de 2022.
“Bem como esse cenário internacional, com impactos sobre inflação, sobre ritmo de crescimento e sobre o processo de retração mundial. Isso acaba impactando um pouco no setor industrial”, aponta, acrescentando ser necessário esperar os desdobramentos das variáveis macroeconômicas ao longo do ano.
O Diário do Nordeste procurou a Federação das Indústrias do Estado do Ceará (FIEC) para repercutir sobre o desempenho, mas não obteve retorno até a publicação desta matéria.
Por que a agropecuária teve o melhor resultado?
De acordo com o analista de Políticas Públicas Nicolino Trompieri Neto, a Agropecuária cearense encerrou o ano de 2022 com forte crescimento em seu Valor Adicionado Bruto (VAB). Na comparação com 2021, a alta foi de 7,70% em termos reais.
Ao longo do ano de 2022, o setor registrou desempenho positivo em todos os trimestres quando comparados a igual período do ano anterior. No quarto período, porém, houve queda foi de 9,51%.
O analista do Ipece, Alexsandre Lira, explicou que esse resultado veio da agricultura, especialmente pelo crescimento na lavoura temporária, puxado principalmente pelo crescimento na produção de mandioca e milho e também na produção de abacaxis.
Na lavoura permanente, o destaque ficou por conta da produção de banana e castanha de caju e também na produção de coco-da-baía.
No grupo das frutas, foram destaques: a manga, goiaba, abacate, limão, tangerina e uva. Na pecuária, o destaque ficou por conta novamente no bom desempenho na produção de galináceos, recuperação da produção de bovinos e também pelo crescimento na produção de leite e ovos.
Como ficou o setor de serviços
A economia cearense ainda é muito concentrada no setor de serviços, que sofreu fortemente os impactos da crise sanitária da Covid-19. Mas o segmento registrou desempenho positivo em todos os trimestres quando comparados a iguais períodos do ano anterior.
O resultado anual é explicado principalmente pelo crescimento da atividade da administração pública, com alta de 1,35% na comparação com igual período de 2021.
A atividade de comércio deu uma contribuição tímida, mas ainda positiva, tendo registrado alta de 0,12% na mesma comparação.
Conforme os analistas do Ipece, o baixo desempenho do comércio foi puxado peas vendas do varejo ampliado que incluem, além do varejo comum, as vendas de veículos e materiais de construção.
A atividade de transporte, armazenagem e correios subiu segundo ano consecutivo, finalizando 2022 com crescimento de 6,12%.
Já os serviços prestados às famílias também apresentaram crescimento de 8,21%. Por fim, os serviços de alojamento e alimentação apresentaram elevação expressiva, de 16,81%, após dois anos de queda, revelando tendência de recuperação pós-crise.