Desligamentos por morte de trabalhadores da educação no Ceará mais que dobram na pandemia

Estado é o 6º do Brasil e 1º do Nordeste com mais contratos de trabalho extintos por óbitos na área

O número de postos de trabalho esvaziados em instituições de ensino por morte dos trabalhadores mais do que dobrou no Ceará com a chegada da pandemia. Entre janeiro e abril de 2020, foram 22 desligamentos, número que saltou para 56 (155%) no mesmo período deste ano.

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No Nordeste, o Estado é o que registra mais desligamentos de professores, coordenadores e outros profissionais da educação. Nacionalmente, é o 6º, atrás apenas de São Paulo (531), Rio de Janeiro (185), Minas Gerais (121), Paraná (98) e Rio Grande do Sul (59). 

Os dados são de boletim do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), divulgado em junho, com base em informações do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged).

Conforme o Dieese, os três estados com maior mortalidade por Covid-19 foram justamente onde os desligamentos de trabalhadores da educação em 2021 mais cresceram. Na taxa de mortalidade, porém, o Ceará aparece em 13º, com 242 mortes a cada 100 mil habitantes.

Além de todos os números, porém, estão lacunas permanentes, como lamenta o professor Carlos Josué de Assis, 35. É preciso mais de uma mão para contabilizar a lista de colegas da educação levados pela Covid-19 “semanalmente”.

É uma perda qualitativa muito grande, muitos tinham contribuição singular. Quando morrem, não temos direito ao luto na escola. São professores, diretores, coordenadores, secretários. É uma quebra na equipe. É muito pesado.
Carlos Josué
Professor do ensino básico

A falta dos amigos e a perda profissional à comunidade escolar se somam, ainda, ao temor pelo retorno às aulas. “Tive colega de trabalho que faleceu com 32 anos, e isso deixou a gente muito aterrorizado. Muitos professores querem voltar, mas com segurança”, sentencia o docente.

Em 2020, entre setembro e dezembro, Fortaleza registrou 36 escolas particulares com notificação de casos suspeitos ou confirmados da Covid-19, segundo a Sesa. Apesar dos alertas, a Vigilância Sanitária do Estado não precisou interditar nenhuma escola.

Perdas em todo o mercado de trabalho

Além da área da educação, o Ceará viu crescer o número de contratos extintos por morte dos trabalhadores em diversas áreas. Entre janeiro e maio de 2020, foram registrados 817 desligamentos, número que subiu para 1.157 no mesmo período deste ano, 41,6% a mais.

O mês de abril, logo após o pico da segunda onda de Covid-19 no Estado, liderou os registros, com 334 desligamentos. Em maio, foram 261. Os cinco primeiros meses de 2021 registraram a maior quantidade de desligamentos por morte da série histórica divulgada pela Secretaria Especial de Previdência e Trabalho.

Impactos das ausências

Além dos inestimáveis impactos afetivos das ausências, os efeitos também incidem nos indicadores sociais.

Para Edemilson Paraná, professor de Sociologia Econômica e do Trabalho da Universidade Federal do Ceará (UFC), a pandemia impactou a situação de saúde de todos os trabalhadores, especialmente dos que “se expuseram nas atividades essenciais”.

4.321
das mais de 22,9 mil vítimas da Covid no Ceará eram pessoas entre 20 e 54 anos, faixa etária média de quem é economicamente ativo no Brasil.

As perdas, então, devem refletir diretamente nos indicadores socioeconômicos dos próximos anos, se relacionando com a situação de “aumento da pobreza, da desigualdade e do desamparo social” e exigindo políticas públicas direcionadas.

“Muitos desses trabalhadores eram provedores de suas famílias, e certamente as deixam numa situação economicamente mais vulnerável. É de se esperar que esse seja mais um dos indesejáveis efeitos da pandemia”, pondera.

O professor avalia que, diante disso e da reabertura das atividades econômicas, o avanço da vacinação da população em geral se torna ainda mais imprescindível para frear as contaminações e óbitos pela Covid-19. “Se isso acontecer, o cenário terá um alívio.”


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