Defesa de Fuminho questiona bilhete sobre ordem de matar Gegê e Paca e pede nulidade do processo

Advogado alega que a prova é ilegal e contratou perito famoso para dar parecer sobre o objeto. MPCE pediu que o acusado seja levado a júri popular pelo duplo homicídio

Escrito por Messias Borges , messias.borges@svm.com.br
Bilhete foi apreendido na Penitenciária 2 de Presidente Venceslau, em São Paulo, no dia 19 de fevereiro de 2018, quatro dias depois do duplo homicídio
Legenda: Bilhete foi apreendido na Penitenciária 2 de Presidente Venceslau, em São Paulo, no dia 19 de fevereiro de 2018, quatro dias depois do duplo homicídio
Foto: Reprodução

A defesa de Gilberto Aparecido dos Santos, conhecido como 'Fuminho', fez uma nova investida na Justiça Estadual para tentar provar a inocência dele nas mortes dos líderes de uma facção criminosa paulisa Rogério Jeremias de Simone, o 'Gegê do Mangue', e Fabiano Alves de Souza, o 'Paca', ocorridas em Aquiraz, na Região Metropolitana de Fortaleza (RMF), em fevereiro de 2018. 

Conforme documentos obtidos pelo Diário do Nordeste, o advogado Ércio Quaresma Firpe ingressou com um Incidente de Ilicitude de Prova, na Vara Única Criminal de Aquiraz, no dia 18 de abril último, para pedir que seja declarada a "Ilicitude dos elementos apresentados pelo MPCE (Ministério Público do Ceará) que embasam a denúncia (suposto bilhete e uma 'salve' via televisão)"; a nulidade do inquérito policial; e a nulidade da denúncia do MPCE e de todos os outros atos processuais referentes ao réu. Os pedidos ainda não foram apreciados pela Justiça.

O nome de 'Fuminho' surgiu na investigação do duplo homicídio ocorrido em Aquiraz após ele ser citado em um bilhete, apreendido na Penitenciária 2 de Presidente Venceslau, em São Paulo, no dia 19 de fevereiro de 2018, quatro dias depois do crime.

"Amigos aqui é o resumo do Pé Quebrado e mais uns irmãos. Ontem fomos chamados em uma ideias, aonde nosso ir (irmão) Cabelo Duro deixou nois ciente que o Fuminho mandou matar os dois o GG e o Paka. Inclusive o ir (irmão) Cabelo Duro e mais alguns irs (irmãos) são prova deque os irs (irmãos) estavão roubando", aponta o bilhete.

Outro comunicado (denominado de 'salve' no universo das organizações criminosas), que se espalhou pelas redes sociais e foi veiculado em telejornais, afirma que 'Fuminho' e outros três acusados de matar 'Gegê' e 'Paca' estão decretados pela facção.

Gilberto Aparecido se tornou o mandante das mortes, para a Polícia Civil do Ceará (PC-CE), que pediu a sua prisão. O suspeito acabou preso em Moçambique, país da África, em 13 de abril de 2020, em uma operação conjunta da Polícia Federal (PF), do Itamaraty, da Drug Enforcement Administration (DEA) - do Departamento de Justiça dos Estados Unidos - e do Departamento de Polícia de Moçambique.

Na época, 'Fuminho' era considerado o principal representante nas ruas do número 1 da facção paulista, Marcos William Herbas Camacho, o 'Marcola' (que já estava preso).

No caso, tais elementos não são nem podem ser considerados provas, aptas a aparelhar uma denúncia criminal desse porte e gravidade, e devem ser considerados ilícitos e, numa análise mais detida das provas constantes do Inquérito Policial, leva à conclusão de que as demais 'provas' colhidas em face do requerente (não foram praticamente nenhuma [...]) também são ilícitas, por se basearem precípua e exclusivamente no mencionado pedaço de papel e, posteriormente, na reportagem televisiva."
Ércio Quaresma Firpe
Advogado de defesa, em Incidente de Ilicitude de Prova

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Defesa de 'Fuminho' contratou perito famoso

A defesa de 'Fuminho' contratou ainda o perito particular Ricardo Molina de Figueiredo para dar um parecer pericial sobre o bilhete apreendido no presídio que acusa o cliente. Segundo o perito, "consta nos Autos, de modo muito vago, que o bilhete manuscrito teria sido 'localizado por servidor da unidade penal no setor de sub-portaria, no dia 19/02/2018'".

No parecer, Ricardo Molina questiona a cadeia de custódia do bilhete (ou seja, como se deu a sua apreensão e a preservação): "Observe-se que não se trata meramente de uma questão de autenticidade material da prova (embora esta seja também uma questão pertinente) mas também - e sobretudo - da legitimidade da prova, visto que, como veremos, é de autoria desconhecida e foi encontrada por pessoa, até o presente momento, não identificada".

O perito pontua ainda que a investigação "não realizou qualquer exame documentoscópico e/ou grafotécnico no material questionado". "Entende este perito signatário que, do ponto de vista técnico, a prova, tal como se encontra, por ser imprestável, não pode ser admitida no bojo do processo", conclui.

O profissional contratado pela defesa de 'Fuminho', Ricardo Molina de Figueiredo, foi denunciado pela ex-esposa por episódios de violência e ameaça, em abril deste ano, segundo o jornal O Globo. Após a repercussão do caso, a Associação Nacional dos Peritos Criminais Federais (Apcf) afirmou que o professor universitário não é perito criminal, e sim um assistente técnico de perícia especializado em fonética.

Molina ficou famoso, em 1996, por contestar um laudo médico que defendia a tese de homicídio seguido de suicídio cometido por Suzana Marcolino contra o namorado PC Farias (assessor do ex-presidente Fernando Collor de Melo). O avanço das investigações concluiu que houve um duplo homicídio triplamente qualificado, com omissão de policiais militares que faziam a segurança de PC.

MPCE pede que 'Fuminho' vá a júri popular

O Ministério Público do Ceará enviou Memoriais Finais à Justiça Estadual para pedir que o réu Gilberto Aparecido dos Santos seja pronunciado (isto é, que vá a julgamento) pelos assassinatos de Rogério Jeremias de Simone e Fabiano Alves de Souza.

A materialidade do crime encontra-se sobejamente comprovada pelas provas produzidas até então nos autos. Exames cadavéricos, fotos e notícias da morte das vítimas, relatório de recognição visuográfica do local do crime, relatório circunstanciado, autos de apresentação e apreensão, laudo pericial na arma de fogo e no exame de munição e comparação balística, todos anexados aos autos. Vale frisar que as testemunhas inquiridas durante a instrução criminal ratificaram as provas coletadas durante a fase inquisitiva da persecução penal."
Ministério Público do Ceará
Em Memoriais Finais

'Gegê do Mangue' e 'Paca' foram assassinados a tiros, em uma reserva indígena em Aquiraz, no dia 15 de fevereiro de 2018
Legenda: 'Gegê do Mangue' e 'Paca' foram assassinados a tiros, em uma reserva indígena em Aquiraz, no dia 15 de fevereiro de 2018
Foto: Reprodução

Confira o nome e a situação dos acusados de matar 'Gegê' e 'Paca':

  • André Luís da Costa Lopes, o 'Andrezinho da Baixada', preso em São Paulo em outubro de 2019;
  • Carlenilton Pereira Maltas, o 'Ceará', preso em Sergipe em abril de 2019;
  • Erick Machado Santos, o 'Neguinho Rick da Baixada', foragido;
  • Felipe Ramos Morais, morto em um suposto confronto com a Polícia, em Goiás, em fevereiro deste ano;
  • Gilberto Aparecido dos Santos, o 'Fuminho', preso em Moçambique em abril de 2020;
  • Jefte Ferreira Santos, preso em São Paulo em janeiro de 2019;
  • Maria Jussara da Conceição Ferreira Santos (mãe de Jefte Santos), foragida;
  • Renato Oliveira Mota, foragido;
  • Ronaldo Pereira Costa, preso em Santa Catarina;
  • e Tiago Lourenço de Sá de Lima, o 'Tiririca', preso em São Paulo em agosto de 2021.

O 11º suspeito de envolvimento nos crimes, Vagner Ferreira da Silva, o 'Cabelo Duro' - que teria organizado o grupo para cometer os assassinatos (segundo a Polícia, a mando de 'Fuminho') - foi morto com tiros de fuzil, em São Paulo, poucos dias após o duplo homicídio no Ceará.

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