Acusado de matar a própria companheira em Fortaleza pede reintegração à Polícia Militar na Justiça
Ex-PM foi expulso por decisão da CGD, na semana passada. Defesa alega que a Controladoria deveria ter aguardado a conclusão da ação penal
Expulso dos quadros da Polícia Militar do Ceará (PMCE) na semana passada, por decisão da Controladoria Geral de Disciplina dos Órgãos de Segurança Pública e Sistema Penitenciário (CGD), Manoel Bonfim dos Santos Silva pediu reintegração à Corporação, em uma ação na Justiça Estadual. Ele é acusado de matar a tiros a própria companheira, Ana Rita Tabosa Soares, em Fortaleza, em outubro de 2020.
A defesa de Manoel Bonfim ingressou com uma Ação Ordinária com Pedido de Antecipação de Tutela na 14ª Vara da Fazenda Pública de Fortaleza, na última terça-feira (30). No mesmo dia, a Unidade declarou incompetência para julgar o caso e transferiu o processo para a Vara da Auditoria Militar do Ceará.
Na Ação, a defesa do ex-PM, representada pelo advogado Charlyandre Façanha Xavier, afirma que "a doutrina e a jurisprudência pátrias têm consagrado o entendimento de que os processos administrativos devem obedecer a regras formais intransponíveis, guardando o processo administrativo simetria com o processo penal".
Veja também
Manoel Bonfim é réu na ação penal que trata do homicídio de Ana Rita, que tramita na 2ª Vara do Júri de Fortaleza. A instrução do processo (oitiva do réu e de testemunhas) ainda não foi iniciada, tampouco há previsão para o julgamento do caso.
A defesa do ex-militar acredita que a CGD deveria ter tido "cautela" na decisão. "Afinal, se na esfera criminal ocorrer em sentença a negativa do fato ou a negativa da autoria, haverá reflexo no âmbito administrativo. Como o trânsito em julgado dessas decisões ocorre, em média, em nove anos, haverá sempre o risco de o servidor retornar, com ordem de reintegração, obtendo todas as vantagens que deixou de perceber ao longo dos anos em que esteve demitido", alega.
Ainda segundo a defesa, a Controladoria deveria "apurar a conduta do servidor que tenha supostamente praticado infração funcional no exercício das atribuições inerentes ao cargo ou função ocupado". E, no caso, "o suplicante, não transgrediu, porque em nenhum momento se identificou como sendo agente de segurança, assim, não há que se falar em desvio de finalidade dentro do âmbito da administração pública, na modalidade abuso de poder, desvio de função, tão pouco transgressão militar".
CGD concluiu que acusado violou valores militares
A decisão de expulsar Manoel Bonfim dos Santos Silva dos quadros da Polícia Militar do Ceará foi publicada pela Controladoria Geral de Disciplina no Diário Oficial do Estado (DOE) do último dia 23 de agosto.
A investigação administrativa considerou que a autoria e materialidade do homicídio se encontram comprovados pelo depoimento de testemunhas e por laudos periciais, inseridos no processo criminal.
O conjunto probatório carreado aos autos revelou-se suficientemente coeso e harmônico com aptidão para viabilizar a conclusão pela punição de caráter expulsório em relação ao aconselhado, posto ter restado caracterizada violação dos valores fundamentais determinantes da moral militar estadual."
Ana Rita foi mais uma vítima de feminicídio no Ceará. A mulher foi morta a tiros, durante uma discussão com o companheiro, dentro de um veículo, na Avenida Silas Munguba, no bairro Serrinha, em Fortaleza, na noite de 8 de outubro de 2020. Manoel Bonfim foi preso em flagrante.
Após atirar contra a própria mulher e perceber que ela estava morta, Manoel começou a chorar e a gritar dizendo que estava arrependido. O suspeito ainda chegou a ligar para uma ambulância no intuito de socorrer a vítima, mas, quando o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) chegou ao local, a mulher já estava sem vida.
PM alegou 'insanidade mental'
A defesa do cabo Manoel Bonfim dos Santos Silva ingressou com uma ação na Justiça Estadual, poucos dias após o crime, para alegar "insanidade mental" do cliente e que, devido a doença, ele estaria incapaz de entender o caráter ilícito de um feminicídio pelo qual é acusado.
Entretanto, conforme a decisão da Controladoria Geral de Disciplina pela expulsão do acusado dos quadros da Polícia Militar, o laudo pericial afastou a possibilidade de Manoel estar com uma doença mental na época do crime. Então, a ação foi arquivada na Justiça.
"Quanto ao aspecto da criminogênese e criminodinâmica percebemos que, a data dos fatos relatados, não existiam indícios de episódios psicóticos agudos, como agitação psicomotora, comportamento alucinatório, alteração do sono, mudança no apetite ou discurso delirante. […] Ao contrário, na semana anterior ao ocorrido Manoel Bonfim trabalhava normalmente e levava vida independente. Ademais, no dia dos fatos, foi capaz de comprar presente para a filha e visitar os pais, não tendo demonstrado qualquer indicativo de surto psicótico agudo", concluiu o perito, citado pela CGD.
No pedido de reintegração à PMCE, a defesa de Manoel Bonfim afirma que os laudos periciais emitidos no processo dão sérias dúvidas sobre a integridade mental do cliente. "O Código Penal veda que pessoas que não tenham capacidade mental de entender que cometeram um crime sejam punidas. Para esses casos, a lei prevê a aplicação de medidas de segurança, através de internação ou tratamento ambulatorial", considera.