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Recursos milionários e custeio de atos políticos: veja o que rolou no 1º depoimento na CPI da AL-CE

Deputados estaduais ouviram o presidente da Associação dos Profissionais de Segurança, Cleyber Araújo, nesta terça (5)

Escrito por Felipe Azevedo, Luana Barros, Luana Severo ,
Depoimento CPI das Associações
Legenda: CPI das Associações Militares foi instalada em agosto de 2021
Foto: Junior Pio / AL-CE

Os deputados estaduais iniciaram, nesta terça-feira (5), as oitivas com testemunhas na CPI que investiga possível envolvimento das associações militares com os motins de policiais em fevereiro de 2020. O presidente da Associação de Profissionais da Segurança (APS), Cleyber Araújo, foi indagado sobre possíveis ligações políticas entre a entidade e o grupo comandado pelo deputado Capitão Wagner (UB), sobre custeio de atos políticos pela associação e também sobre as movimentações bancárias da instituição. 

Araújo foi o primeiro convidado a prestar depoimento à comissão. Além do relator da CPI, Elmano de Freitas (PT), apenas outros integrantes da comissão fizeram perguntas à testemunha. O depoimento é aberto a qualquer deputado que queira questionar o depoente. 

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Custeio de atos políticos

Com tempo ilimitado para fazer as perguntas, o relator Elmano de Freitas perguntou a Cleyber Araújo sobre a participação da APS em protestos, realizados em dezembro de 2019, por reajuste salarial para policiais militares e bombeiros

Elmano mostrou uma série de publicações da entidade nas redes sociais em que esta convoca para os atos realizados na Assembleia Legislativa do Ceará. Ele também indagou sobre a participação da APS na mobilização dos profissionais da categoria. Cleyber Araújo admitiu que a associação financiou a contratação de ônibus para levar os militares até os atos na Assembleia, mas negou que fossem protestos, chamando a mobilização de "encontros". 

"A associação pagou ônibus para associados virem acompanhar leitura da legislação sobre a reestruturação salarial dos militares. Não há nenhuma ilegalidade nesse ato", afirmou pouco depois, já nas respostas ao deputado Soldado Noélio (UB). 

Cleyber Araújo
Legenda: Cleyber Araújo assumiu a presidência da APS em fevereiro de 2020
Foto: Felipe Azevedo

Contrário à paralisação

A deputada Augusta Brito (PT), uma das integrantes da CPI, disse que considera o financiamento do transporte como "ilegal". Antes de fazer as perguntas, ela mostrou notas fiscais dos transportes financiados pela APS para as mobilizações no final de 2019.

A parlamentar aproveitou para indagar a respeito do financiamento, pela APS, de outdoors sobre o reajuste salarial. A parlamentar apresentou exemplos de diferentes anos.

Cleyber assumiu que a associação teria pago por alguns. 

“Além de patrocinar os ônibus, para que trouxessem os profissionais de segurança para a mobilização do motim, [os associados] também patrocinaram, em algum momento, a questão dos outdoors. Pagos pela associação, que, no meu entendimento, comete ilegalidade”.
Augusta Brito
Deputada estadual

Durante o depoimento, parlamentares ressaltaram que os protestos ocorridos em dezembro de 2019 teriam "levado" aos motins no início do ano seguinte. 

Sobre a paralisação dos militares em 2020, Cleyber disse que era contra e que a associação "via com muita preocupação". "A associação não financiou, não participou (do motim). Inclusive, via com grande preocupação a possibilidade de paralisação", ressaltou. 

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Movimentação financeira milionária 

Transações financeiras milionárias de Cleyber foram reveladas pelo deputado Elmano Freitas. De acordo com o relator da CPI, o presidente da APS sacou pessoalmente “na boca do caixa”, nos últimos cinco anos, em torno de R$ 2,3 milhões da conta da associação. Foram retirados, por exemplo, R$ 89 mil em fevereiro de 2020 e R$ 50 mil em maio do mesmo ano. 

“Numa era em que tem pix, transferência eletrônica... por que sua entidade saca R$ 2,3 milhões em ‘boca de caixa’?”, questionou o relator, apontando suspeita de lavagem de dinheiro. 

Cleyber rebateu que a associação costuma fazer saques em espécie para “movimentar o caixa financeiro das despesas diárias” com alimentação, logística, assistência jurídica e psicológica, reforma de quartéis, compra e manutenção de equipamentos, dentre outras. 

CPI Associações Militares
Legenda: O presidente da APS, Cleyber Araújo, foi a primeira testemunha ouvida na CPI que investiga possível envolvimento das associações militares no motim de 2020
Foto: Felipe Azevedo

Elmano também quis saber como são feitas as movimentações financeiras da APS. Perguntou diretamente se as transações são de responsabilidade compartilhada, ou seja, dependentes de senhas diferentes, tanto do presidente como do tesoureiro da associação.  

Cleyber, que já foi tesoureiro da entidade antes de ser presidente, respondeu que as movimentações bancárias dependem de senha dupla, mas os saques em espécie, não. Ele também afirmou à CPI que nunca concentrou, sozinho, as duas senhas.  

Após a sessão, Elmano disse à imprensa que a testemunha não conseguiu esclarecer a movimentação financeira. “Ele vai ao banco, sai com R$ 70 mil no bolso e não diz exatamente para que esse recurso foi utilizado. Então, fica claro que é uma prática da entidade de sacar ‘na boca do caixa’ para, dessa maneira, não ter como rastrear os destinos dos recursos, que é dos policiais e deve ser utilizado para prestar serviço aos policiais”. 

Em entrevista após o depoimento, Cleyber voltou a falar sobre os saques. "Esses valores são para custear despesas operacionais, despesas médicas, alimentação, são mais de 37 colaboradores que se alimentam lá, tem hotel de trânsito, tem aquisição de equipamentos, parte (do uso) desse dinheiro era feito em espécie. (...) Saques para deixar à disposição do sistema administrativo-financeiro. Toda movimentação financeira consta em livro razão, já foi enviada essa documentação ao Ministério Público, à CPI", afirmou.

Assista a íntegra do depoimento na CPI:

 

 

Empresa “fantasma” 

Cleyber foi questionado sobre suas rendas pessoais. No início de seu depoimento, disse que recebe como policial militar em torno de R$ 3 mil e que recebe por hora trabalhada na APS. 

Em determinado momento da oitiva, o deputado Elmano Freitas questionou a testemunha sobre a sociedade que detém com a esposa em uma empresa de gás. “Dá para o senhor explicar como alguém que ganha R$ 3 mil é sócio com R$ 115 mil numa empresa?”. 

O presidente da APS, então, mudou levemente o discurso, disse que recebe em torno de R$ 5 mil como policial e que fez um empréstimo de aproximadamente R$ 100 mil para entrar na sociedade. Também afirmou ter outras fontes de renda, como licenças e trabalhos “por fora”. 

Elmano, com base em informações recebidas pela CPI, afirmou que a empresa de gás citada não existe e que não está funcionando. Disse, também, que a sociedade é feita com outro policial militar, com quem Cleyber teria trabalhado à época do motim.  

A testemunha negou que trabalhava com o sócio nesse período. Pouco depois, seu advogado de defesa interviu e disse que o deputado Elmano estava interferindo no princípio da não autoincriminação, que fere o direito à ampla defesa. “Pediria que vossa excelência desconsiderasse o compromisso de dizer a verdade como testemunha”, pediu ao deputado. 

Contratação de advogados 

Também entrou em pauta a contratação de serviços jurídicos por parte da APS. Isso, porque os deputados que integram a CPI queriam saber se os advogados que trabalham para a associação são os mesmos ou têm relação com os que trabalham para o gabinete do deputado federal Capitão Wagner. 

O deputado estadual Marcos Sobreira (PDT) questionou quanto os advogados recebiam por mês e se eram contratados pela APS. A testemunha respondeu que alguns juristas têm carteira assinada e outros recebem por demanda contratada. Além disso, negou que sejam indicados por lideranças políticas. 

Ligação político-partidária

Durante o depoimento, parlamentares indagaram a Cleyber Araújo sobre possíveis ligações entre a APS e a própria testemunha com o deputado federal Capitão Wagner (UB) e o grupo político comandado por ele. Elmano chegou a afirmar que a entidade é um "braço político" do grupo liderado por Wagner.

Entre as indagações, estavam a de se Araújo teria ligação partidária com Wagner, se o deputado federal ainda é presidente de honra da APS e sobre se Araújo, ocasionalmente, consultaria Wagner no exercício da presidência da APS. Cleyber Araújo negou estes questionamentos. 

Também foram questionadas eventuais ligações trabalhistas com o grupo político. Elmano Freitas questionou se Araújo sabia que a ex-esposa trabalhou como assessora parlamentar de Wagner e que, quando exonerada, assumiu a prima do presidente da APS. 

"Não vejo nenhuma ligação, por mais que seja parente, não diz respeito a mim", disse Cleyber após o depoimento.

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Já o deputado Marcos Sobreira (PDT) falou sobre colaboradores da APS que também trabalharam junto a lideranças ligadas ao grupo do Wagner, além de advogados contratados pela entidade também assessorarem o deputado federal licenciado. Araújo disse que sabia que a ex-exposa trabalhou com o deputado federal, mas não sabia da sua saída. Também disse não ter qualquer informação sobre o trabalho da prima ou dos colaboradores da APS assim como dos advogados.

"Fica evidente que a atuação da APS é absolutamente vinculada, inclusive na sua propaganda, na sua mobilização conjunta (ao grupo político do Capitão Wagner). Evidentemente que é um relacionamento político e a entidade é utilizada para fazer política partidária dentro da polícia", ressaltou Elmano de Freitas após o encerramento do depoimento. 

Em nota enviada pela assessoria de imprensa, Capitão Wagner disse ver "com estranheza" os trabalhos da CPI, que acredita estar sendo usada para "fins eleitorais". Além disso, afirmou que deve tomar "medidas judiciais cabíveis" para evitar que sejam criadas "falsas narrativas" envolvendo seu nome.

Próximo depoimento

CPI Associações Militares
Legenda: Tanto integrantes da CPI como demais parlamentares podem se inscrever para fazer perguntas à testemunha ouvida pela comissão
Foto: Felipe Azevedo

A CPI havia agendado o depoimento de Cleyber Araújo para o último da 29 de março. Contudo, ele não compareceu. Por meio do seu advogado, Araújo enviou um ofício com um atestado médico anexado alegando estar com sintomas de síndrome gripal.

Para recuperar o tempo, duas oitivas devem ser realizadas nesta semana. Além do depoimento de Araújo, os deputados estaduais também devem ouvir o vereador de Fortaleza Sargento Reginauro (UB) nesta quarta-feira (6). O parlamentar presidia a APS na época do motim. 

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