Números relativos a saques na boca do caixa, abertura de empresas, transportes de policiais e contratação de escritórios de advocacia precisam ser esclarecidos pelas associações
Revelações feitas na sessão desta terça-feira (5) na CPI das Associações Militares, na Assembleia Legislativa, apontam que membros do comando da Associação dos Profissionais de Segurança (APS) teriam sacado, na boca do caixa de agências bancárias, uma quantia de R$ 2,3 milhões entre 2015 e 2021.
Além disso, há indícios de transporte irregular de militares a atos que antecederam o motim de 2020, suspeita de pagamentos irregulares a escritórios de advocacia contratados pelas entidades e possível criação de CNPJ com fins duvidosos.
O resumo deste primeiro dia de depoimentos da Associação revela uma quantidade de informações significativa que eleva o patamar de relevância da Comissão, que até o momento vinha em ritmo morno, tendo concluído os primeiros 120 dias sem apresentar ao público nenhum fato relevante para justificar os trabalhos.
A CPI foi criada na Assembleia Legislativa do Ceará para investigar possíveis ligações destas instituições com o motim de PMs ocorrido em fevereiro de 2020, o que seria ilegal.
Os fatos são graves e sinalizam para uma entrada efetiva dos trabalhos da comissão nos debates sobre a sucessão estadual, tendo em vista a citação de um possível uso das associações com fins políticos pela oposição no Estado.
Diante das denúncias apresentadas, será necessário que a Associação questionada pelos membros da CPI aprofunde os esclarecimentos para que não paire dúvidas sobre possível atuação irregular dos grupos. As informações prestadas pelo depoente do dia, o presidente da APS, Cleyber Araújo, são insuficientes para justificar.
Durante o depoimento, relator da CPI, deputado Elmano de Freitas (PT), exibiu no telão, comprovantes bancários de saques feitos na boca do caixa em valores que variavam entre R$ 25 mil, R$ 50 mil e até R$ 70 mil.
Um dos números relevantes para os trabalhos sugere que, em fevereiro de 2020, o mês em que aconteceu o motim dos policiais, teria sido sacado o valor de R$ 89 mil.
“(A testemunha) não consegue esclarecer por que ele pessoalmente sacou, por exemplo, R$ 70 mil na boca do caixa. Saiu da agência com esse valor no bolso. Fica claro que é uma prática na entidade de sacar para não ter como rastrear esses valores que deveriam ser gastos”.
Em resposta, Cleyber Araújo garantiu que os recursos "não são para a Associação, são para as demandas dos associados". Ele citou como exemplos a assistência jurídica e psicológica, auxílio funeral e reformas em quartéis.
"Eles já tem a prestação de contas. O que era sacado era suprimento de fundos e já foi apresentado. Ali já tem tudo documentado, com notas de tudo que foi pago".
Ligações políticas
Durante o depoimento, Elmano de Freitas questionou possíveis ligações da APS com movimentos partidários ligados à oposição no Ceará. O depoente negou o envolvimento, mas o relator insistiu e mostrou publicações nas redes sociais da Associação em que aparecem políticos representantes da oposição.
Um ponto tenso do depoimento foi quando a testemunha foi questionada sobre trabalhos de assessoramento feitos pela ex-mulher dele e posteriormente por uma prima dele no gabinete do deputado federal Capitão Wagner, o líder do grupo político de oposição do Estado. O depoente negou que tivesse conhecimento sobre os detalhes das contratações.
Os fatos discutidos na comissão não são, por si só, provas. São, entretanto, indícios que precisam ser esclarecidos. O certo é que a CPI já entrou no campo político e as repercussões dela deverão ter impactos na sucessão estadual.