Cunha deixa presidência e tenta evitar cassação

Decisão de deputado é vista como uma cartada final para tentar evitar a perda do mandato

Escrito por Redação ,
Legenda: Fora do cargo de presidente da Câmara, Eduardo Cunha passará a ser julgado no esquema de corrupção da Petrobras pela segunda turma do STF, responsável pelos casos da Lava-Jato, e não mais pelo plenário do Tribunal
Foto: Foto: Agência Brasil

Brasília. Após meses de negativas, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), um dos presidentes da Câmara dos Deputados mais fortes das últimas décadas, renunciou ao cargo ontem, em pronunciamento emotivo que contrastou com sua imagem de político duro e frio. A eleição de seu sucessor, para um mandato tampão até fevereiro, deve ocorrer na semana que vem. A votação da cassação dele em plenário, por sua vez, deve ficar para agosto.

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O peemedebista, que estava afastado da presidência da Casa desde maio pelo Supremo Tribunal Federal (STF), é alvo de três denúncias da Procuradoria Geral da República (PGR) por envolvimento no petrolão, duas das quais já aceitas. Na Câmara, sofre um processo de cassação sob acusação de ter mentido ao dizer que não teria contas no exterior, que teriam sido abastecidas por propina com origem em contratos da Petrobras.

No auge, Cunha chegou a controlar bancada informal de cerca de 150 deputados fiéis, maior que a de qualquer partido. Operador por excelência, foi fundamental para o impeachment da presidente Dilma Rousseff (PT), cuja sessão presidiu em abril.

Ao ler a carta em que comunicou sua renúncia da Presidência da Câmara, sete meses antes do término do mandato, ele chorou ao citar a família e atribuiu seus reveses a uma vingança por ter liderado a articulação que resultou na abertura do processo de impeachment de Dilma.

"Estou pagando um alto preço por ter dado início ao impeachment. Não tenho dúvidas, inclusive, de que a principal causa do meu afastamento reside na condução desse processo de impeachment da presidente afastada", afirmou no Salão Verde da Câmara, rodeado por poucos aliados. Ele disse, ainda, que a história fará Justiça ao "ato de coragem que teve a Câmara" ao abrir o processo contra Dilma.

Choro

Durante a leitura da carta, embargou a voz e chorou ao mencionar um suposto ataque "covarde" contra a família. A mulher, Claudia Cruz, é ré sob a acusação de se beneficiar de desvios de recursos da Petrobras. A filha Daniele Ditz é investigada. "Usam a minha família de forma cruel e desumana visando me atingir", disse, chorando.

O peemedebista voltou a acusar os investigadores da Lava-Jato de persegui-lo. Criticou ainda o STF, afirmando indiretamente ver um conluio entre a Corte e o governo Dilma no seu afastamento do cargo e do mandato - decisão unânime tomada pelo STF em 5 de maio.

Ele também voltou a se declarar inocente. "Tenho consciência tranquila não só da minha inocência, bem como de ter contribuído para que o meu País se tornasse melhor e se livrasse do criminoso governo do PT".

Cunha direcionou a artilharia, ainda, contra seu sucessor, Waldir Maranhão (PP-MA), que rompeu politicamente com ele e patrocina um comando interino na Câmara dos Deputados.

"É público e notório que a Casa está acéfala, fruto de uma interinidade bizarra, que não condiz com o que o País espera de um novo tempo após o afastamento da presidente da República. Somente a minha renúncia poderá por um fim a essa instabilidade sem prazo", disparou.

Última aposta

A renúncia é vista como uma cartada de Cunha para tentar evitar a perda do mandato, que se tornou possibilidade real. No mínimo, ele deve ganhar tempo para adiar ainda mais o fim do processo de cassação, que já se arrasta há 249 dias.

Um recurso do deputado na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), que seria votado na próxima semana, deve ficar para agosto. Isso porque o presidente do colegiado, Osmar Serraglio (PMDB-PR), aliado do peemedebista, decidiu cancelar a sessão de segunda (11). Como a próxima semana é a última antes do recesso, não haverá tempo hábil para levar a votação da cassação de Cunha para o plenário.

Após anunciar a renúncia, ele também apresentou inclusão de pedido em seu recurso na CCJ para que o processo pela sua cassação volte ao Conselho de Ética. Argumenta que o caso deveria ser revisado, uma vez que agora não é mais presidente. Fora do cargo, passará a ser julgado no esquema de corrupção da Petrobras pela segunda turma do STF, responsável pelos casos da Lava-Jato, e não mais pelo plenário do tribunal.

O governo interino de Michel Temer (PMDB) encarou de forma ambivalente a renúncia. Houve alívio com a perspectiva de a Câmara voltar a ter um comando forte para aprovar medidas econômicas. Mas há preocupação com o potencial de estragos que Cunha possa fazer caso seja cassado. É voz corrente na Casa que ele sabe de muita coisa.

dsa