Os produtos similares, como compostos lácteos e óleos mistos (no lugar de azeite), estão presentes em cada vez mais categorias nos supermercados. Especialistas apontam que, com a inflação dos alimentos e a intenção das marcas de penetrarem em outros mercados, esse tipo de produto deve se tornar permanente nas prateleiras dos supermercados.
O crescimento da oferta de produtos similares ao azeite, leite, iogurte e requeijão tem chamado atenção dos órgãos de defesa do consumidor e inclusive levou à criação de leis para a sinalização desse tipo de item nos estabelecimentos.
Na intenção de baratear a produção e ofertar produtos na mesma média de preço, as empresas de alimentos e bebidas apostam na fabricação de produtos similares. Com o uso de aditivos, o creme culinário é oferecido como uma opção para substituir o creme de leite e a mistura láctea se tornou alternativa ao iogurte.
O economista e conselheiro do Conselho Regional de Economia do Ceará (Corecon-CE), Wandemberg Almeida, explica que essa é uma estratégia da indústria alimentícia utilizada em momentos de incerteza econômica para manter o consumo da população, especialmente a de baixa renda.
“O salário não acompanha o aumento do preço dos produtos nesses últimos tempos. Com a inflação mexendo principalmente em itens básicos e consumidos mais rapidamente, isso gera um certo impacto negativo para a economia. A renda do trabalhador não está tendo uma crescente de maneira significativa. Os preços dos produtos, sim”, explica.
A 'corrosão' do poder de compra dos consumidores vem acompanhada dos aumentos de custos de fabricação, ressalta o especialista. A estratégia é bastante vantajosa para as empresas, que conseguem manter ou até ampliar o público comprador, aponta Wandemberg Almeida.
Mas para o consumidor, de maneira geral, acaba não sendo tão positivo. Ele acaba comprando um produto de baixa qualidade, que nem sempre atente as suas necessidades"
O economista afirma que, sem perspectivas de grandes mudanças no cenário econômico, os alimentos 'similares' devem se manter presentes.
O grupo de alimentação e bebidas voltou puxar o aumento Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), considerado a inflação oficial, em abril. Os alimentos subiram mais que o dobro da inflação geral no primeiro trimestre.
COMO IDENTIFICAR PRODUTOS ALTERNATIVOS
Os produtos de origem animal e in natura alternativos são regulados pela Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA).
Conforme o decreto 9.013/2017, os produtos devem manter proporção de ingredientes de origem animal superior a 50%, mesmo que tenham aditivos e sejam compostos lácteos ou misturas lácteas.
Além disso, as fabricantes devem observar as regras sobre uso de aditivos alimentares e coadjuvantes de tecnologia, rotulagem geral e embalagem, de supervisão da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
A identificação pode se tornar ainda mais difícil nos casos em que a mesma marca oferta os dois tipos de produtos, em embalagens semelhantes. Para identificar esse tipo de produto, o Instituto de Defesa de Consumidores (Idec) orienta a leitura atenta dos rótulos, principalmente da lista de ingredientes.
Se o produto for alternativo, isso deve ser indicado na informação de venda - informação obrigatória que geralmente está presente no canto inferior esquerdo do rótulo, menor que as informações publicitárias. Os supermercados também são obrigados a informar o real nome dos alimentos nas etiquetas de preço.
Confira alguns dos produtos similares encontrados nos supermercados:
- composto lácteo (similar ao leite)
- mistura UHT de creme de leite e soro de leite (similar ao creme de leite)
- mistura láctea condensada (similar ao leite condensado)
- bebida láctea fermentada (similar ao iogurte)
A Mococa afirmou que, em sinal de preocupação com a experiência do consumidor, diferencia as embalagens nas tonalidades e elementos distintivos, além de destacar o nome dos produtos no centro das embalagens.
“Para tornar nossos produtos mais acessíveis, lançamos a mistura condensada e a mistura de creme de leite como opções mais econômicas em comparação aos nossos tradicionais”, afirmou a empresa.
O Diário do Nordeste também questionou a Nestlé, a Itambé e a Alimentos Triângulo Mineiro sobre a semelhança das embalagens dos produtos similares e 'originais', mas não obteve retorno até a publicação da matéria.
Veja outros tipos de similares:
- cobertura cremosa ou mistura de queijos e gordura vegetal (similar ao requeijão)
- preparação alimentícia com queijo ralado (similar ao queijo ralado)
- molho sabor ketchup ou maionese (similar a ketchup e maionese)
- pó de preparo para bebida sabor café (similar ao café)
- óleo composto de soja (similar ao azeite)
FENÔMENO PODE CRESCER
A tese de que os produtos similares serão presentes nos supermercados é corroborada pelo economista Roberto Kanter, especialista em Varejo e professor de MBAs da FGV. Ele afirma que, quando houver uma atenuação da inflação dos alimentos, essa classe de alimentos possa ganhar ainda mais consumidores.
Segundo o economista, a penetração de similares do iogurte, azeite e leite em pó, entre outros produtos, é maior em estados do Nordeste, onde atendem principalmente à classe média. No sudeste, onde há maior concentração de renda, são voltados para a classe C.
“Pode ser que, com o aumento da renda, quem hoje ainda não tem renda para comprar esse produto, passe a comprar. Quando a classe média voltar a comprar o produto 100% original, quem vai passar a comprar a 'mistura' é a classe C, que inclusive tem uma quantidade de pessoas ainda maior”, afirma.
Roberto Kanter afirma que os consumidores estão cada vez mais conscientes na compra desses produtos similares, diferentemente de quando eles começaram a se tornar mais comuns, em meados de 2021.
“Hoje já ficou muito claro para o consumidor quando ele compra um azeite, iogurte, leite em pó, entre outros produtos que usam misturas. O mercado já vem mostrando maturidade em relação à segurança ao consumidor”, opina o economista.
Entidades de defesa do consumidor ponderam, entretanto, que a mistura dos produtos 'originais' com as misturas nas prateleiras dos supermercados pode confundir os consumidores.
O Procon Fortaleza trabalha em um projeto para recomendar aos estabelecimentos que coloquem os produtos similares em prateleiras diferentes, com a informação de que são produtos com composições diferentes.