Caverna digital? Pesquisadores do CE criam ambientes virtuais para estudar evolução do mundo

A ferramenta é útil no desenvolvimento científico e acadêmico

Escrito por André Costa , ande.costa@svm.com.br
Legenda: A caverna digitalizada chama-se "Gruta dos Cristais" e fica na cidade de Morro do Chapéu, na Bahia. O local tem cerca de 2 km de diâmetro
Foto: Divulgação

Quase 700 km separam os estados da Bahia e Ceará. Uma longa distância que demanda tempo. São mais de 15 horas de estrada. Agora, imagine você fazer esse trajeto em um piscar de olhos. Pesquisadores da Universidade Federal do Ceará (UFC) não apenas imaginaram como colocaram a ideia em prática.  

Professores dos cursos de Geografia e Sistemas e Mídias Digitais desenvolveram um projeto que recria, digitalmente, ambientes de cavernas brasileiras. O primeiro local definido foi uma caverna na Bahia. A escolha, conforme o docente do curso de Geografia, Rubson Maia, advém da quantidade de cavernas existentes sem visitação de turistas naquele Estado. "E isso facilita nosso trabalho”, diz.

A ferramenta é útil para estudos na área de geomorfologia; ajudam a entender a evolução do planeta; auxiliam os estudantes, além de serem instrumentos de integração social. 

Tudo começou em 2018. O projeto foi concebido com o objetivo de se aprofundar, através de estudos minuciosos, acerca da evolução do planeta. Um tema, segundo Rubson Maia, vasto e cujo os resultados obtidos podem ser essenciais para entender diversos aspectos da vida humana e da natureza. 

Caverna é toda cavidade natural rochosa com dimensões que permitam o acesso de seres humanos.

Essa abordagem tem como ponto de partida as cavernas, locais nos quais armazenam elementos milenares que ajudam a montar o quebra-cabeça da evolução natural. Mas, chegar até estes espaços não é uma missão simplória. “Muitas delas são de difícil acesso, e, além disso, são locais perigosos, muitos deles insalubres”, adverte o professor Rubson. 

Diante destas dificuldades, a ideia: recriar esses ambientes de forma digital. “Isso abre um leque de opções. Podemos fazer trabalhos mais densos e minuciosos, com tempo, custo e risco amplamente reduzidos”, acrescenta Maia.

A primeira caverna digitalizada pelo projeto da UFC fica na Bahia. Para recriá-la digitalmente, foram precisas mais de 8 idas ao local. 

“O trabalho de criação é complexo. Precisamos tirar centenas de milhares de fotos, de diferentes e específicos ângulos, para que o ambiente seja recriado de forma fidedigna”, detalha Rubson. Em quatro anos desde o desenvolvimento do projeto, já foram tiradas cerca 70 mil fotografias. 

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“Após tirarmos as milhares de fotos, processamos tudo em um software específico e ele inicia a reconstrução digital”, detalha o pesquisador. Os custos são inferiores ao método anteriormente utilizado para recriar ambientes, o escaneamento a lazer. “O escaneamento custa quase 1 milhão de reais. Já um kit de fotogrametria sai por 10% desse valor”, especifica Rubson.

Rochas de 1 bilhão de anos

A caverna digitalizada chama-se "Gruta dos Cristais" e fica na cidade de Morro do Chapéu, na Bahia. O local tem cerca de 2 km de diâmetro. "Parece uma galeria retilínea, com vários cruzamentos. Passa a ideia de uma cidade, com quarteirões. É muito interessante", detalha o pesquisador. 

As rochas que compõem a caverna têm cerca de 1 bilhão de anos. "Isso não quer dizer que, necessariamente, a caverna tenha essa idade. As rochas já estavam lá quando a caverna foi formada, mas, ainda assim, sabemos se tratar de uma caverna muito, muito antiga", detalha Rubson. 

Resultados 

Ainda que o projeto esteja na fase experimental, com apenas uma caverna recriada, já é possível enxergar resultados. “Alunos estão tendo acesso a aulas virtuais. Isso torna o ensino mais rico, mais interativo. Podemos abordar questões únicas que não seriam possíveis sem os estudantes estarem ‘dentro’ desses espaços”, destaca o Rubson Maia. 

No aspecto científico, outro avanço. “Indo fisicamente para estes locais, além dos riscos que eu já mencionei, temos uma certa limitação de análise. Através da realidade virtual, conseguimos identificar novo ângulos, observar pontos-chaves e tornar a pesquisa mais detalhada. Além disso, há a possibilidade de interação com pesquisadores que estão em outras parte do mundo. Só precisamos compartilhar o programa, e este pesquisador ingressa no ambiente junto a nós”, se entusiasma o docente. 

Outro ponto que merece destaque do pesquisador é a possibilidade da integração social. O docente do curso de Geografia conta que a ideia é ir além das cavernas e digitalizar outros ambientes, tornando-os acessíveis a pessoas externas à comunidade acadêmica ou científica.

“Alguém que, por exemplo, tenha limitação de mobilidade e tenha o sonho de subir em uma montanha, ela poderá ter esse desejo realizado no campo da realidade virtual. É um mundo de possibilidades”, conclui. 

 

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