Carlos Wizard, que lidera grupo para comprar vacina, diz que não vê lógica em doar para o SUS
Segundo o empresário, a compra privada não tem conotação de fura-fila da vacina, porque estaria ajudando o governo a acelerar o processo para retomar a economia.
O bilionário Carlos Wizard, que lidera uma corrente de empresários interessados em comprar vacina contra a Covid para imunizar seus funcionários antes dos grupos prioritários, prevê uma onda de judicialização após as recentes decisões que autorizaram grupos de magistrados e motoristas de aplicativos a importarem as doses.
O grupo de Wizard, que tem a participação do dono da Havan, Luciano Hang, aceita a contrapartida de bancar uma parte das vacinas para o SUS, se for necessário para liberar a compra privada, mas a contragosto.
Segundo Wizard, que é dono da Sforza, de redes como KFC e Pizza Hut no Brasil, sai mais barato para os empresários pagar esse investimento nas vacinas do que ver o país continuar parado.
"Em determinado momento levantou-se a questão de que os empresários possam comprar as vacinas para os seus próprios trabalhadores, desde que façam uma segunda doação para o SUS. Não consigo ver muita recíproca nessa questão. Eu já estou sendo solidário com o governo: ele está deixando de ter a logística, a mão de obra, a negociação e o custo dessa aplicação", afirma.
A faixa de preço aceitável, segundo Wizard, fica em torno de US$ 10, mas ele disse que tem ouvido propostas de até US$ 35 de fornecedores, que ele considera exageradas.
Para o empresário, a compra privada não tem conotação de fura-fila da vacina, porque estaria ajudando o governo a acelerar o processo para retomar a economia.
"Estamos falando [de vacinar] os trabalhadores ligados ao nosso grupo empresarial. Nós não estamos falando de familiares, amigos, vizinhos e conhecidos", diz.
Apoiador de Bolsonaro, Wizard foi nomeado para assumir um cargo no Ministério da Saúde no ano passado, mas saiu em meio a uma polêmica sobre a contagem das vítimas da doença. Ele é um entusiasta do tratamento precoce, com medicamentos sem eficácia comprovada.
"Eu sou tão adepto do tratamento profilático, que a cada 15 dias eu tomo hidroxicloroquina. Tomo invermectina, zinco e vitamina D. Já estamos com um ano de pandemia, e, até agora, não tive nenhum sintoma de Covid. Não peguei", afirma.
Questionado se também usa máscara, responde: "Uso duas. Uma não é suficiente. Cada vez que eu vou pegar um voo para Brasília, para o México, para os Estados Unidos, em vez de uma máscara, eu uso duas."
PERGUNTA - No ano passado, o sr. quase assumiu um cargo no Ministério da Saúde, mas acabou saindo no meio de uma questão com a contagem dos mortos da Covid. Hoje estamos com mais de 2.000 mortes diárias. Como vê essa estatística?
CARLOS WIZARD - Temos que analisar o contexto como um todo. Sou super defensor do tratamento precoce. Acredito que quando as pessoas na fase inicial da doença fazem, não tem internação, UTI, óbito.
P. - Qual é a sua avaliação?
CW - No ano passado, o Ministério da Saúde e médicos da linha de frente preconizaram, divulgaram e defenderam muito o tratamento precoce. Mas eu acho que eles foram atacados, ridicularizados, ameaçados e se cansaram da defesa. Aí vem o resultado que temos hoje: as pessoas não fazem o tratamento precoce, tomam dipirona e a doença se agrava. Quando vai ver, a situação já é de internação, e estamos no caos de hoje, com sistema colapsado, porque não tem tantos leitos no Brasil.
P. - A Anvisa já disse que tratamento precoce não funciona. O sr. se baseia em que pesquisa, sendo que é um empresário de outros setores, nenhum deles ligados à saúde?
CW - Para ter um estudo científico, comprovadamente reconhecido mundialmente, escrito na pedra, precisa de até dez anos. Nós não temos esse tempo para deixar as pessoas sem atendimento. Então, o que existe é o estudo de observação. É a população que fez o tratamento precoce versus aquela que não fez. E na população que fez, o resultado é muito saudável. Muito favorável comparado com aquela que não fez, que é o óbito.
Quando se está em guerra, você não vai se dar um a três anos para ver se o resultado é ou não é. Você vai usar imediatamente. E quando o resultado é positivo, você leva aquele tratamento adiante.
É a mesma coisa a vacina. Toda vacina leva anos para ter uma eficácia garantida, mundialmente comprovada. Hoje, o pessoal está imunizando a população com uma vacina que, antecipadamente, já avisa o paciente que é 50% eficaz, ou seja, não teve anos para aprimorar, validar, ajustar e, finalmente, deixar uma vacina com eficácia elevada.
Mas as pessoas estão iludidas de que a vacina é a solução, independentemente do seu grau de eficácia, elas apostam na vacina. Eu sou a favor da vacina.
P. - O sr. diz que não tem como garantir que funciona, mas está querendo comprar a vacina.
CW - Exatamente, porque tem diferentes graus de eficácia até o momento. Tem vacinas que o fornecedor já te diz que garante 50% de eficácia. Mas tem outros com índice de até 95%. Então, é óbvio que eu sou defensor da vacina com o maior índice de eficácia possível.
P. - Essa ressalva na sua fala é colocada para se alinhar ao presidente Bolsonaro, que o senhor apoia? É para se alinhar ao discurso dele, que já disse que vacina pode fazer virar jacaré, mas agora está sendo cobrado, inclusive por empresários?
CW - Não é isso. Primeiro, porque eu não falo por Bolsonaro. O que eu falo é em nome dos empresários. Nós empresários temos a convicção de que a vacina com eficácia elevada é a solução para enfrentarmos essa crise sanitária.
No entanto, nós entendemos que o sistema, a própria estrutura governamental, a máquina pública, é lenta, e não é desse governo, é tradicionalmente.
P. - E se eu for esperar o governo imunizar toda a população de risco, que são os idosos, linha de frente, paciente com comorbidade, uma população de 70 milhões de brasileiros?
CW - Eu estive recentemente no Ministério da Saúde e fiz essa pergunta. Se nós temos um grupo de risco com 70 milhões de pessoas para serem imunizadas, quanto tempo vai levar? Quatro a cinco meses chega ao final do ano.
Então, é aí que entra a iniciativa dos empresários. Eu e Luciano Hang estamos à frente desse movimento. É para sensibilizar a iniciativa privada que nós queremos contribuir, trabalhar de forma solidária e concomitante ao empenho do SUS, porque o SUS vai seguir com seu programa de vacinação do grupo de risco.
Mas nada impede de fazermos um trabalho paralelo. Não é competir, furar fila ou dar prioridade para quem tem recurso. A nossa questão é antecipar uma solução para o Brasil voltar a funcionar. O país parou. Não podemos aceitar passar 2021, e nós reféns dessa situação.
P. - Quem são esses empresários? O sr. diz que não pode falar quem são, apenas que são de certas regiões do Brasil e que tem Luciano Hang junto. Mas que setores prevalecem? Farmácias, laboratórios?
CW - Nós empresários estamos dispostos a financiar, adquirir. Queremos comprar essas vacinas, no entanto, você sabe que aplicação manuseio e armazenagem requerem tratamento especial. Tem que ser acondicionado com temperatura baixa. Nós não temos essa estrutura. Estamos junto com a Abrafarma (Associação Brasileira das Farmácias), que nos declarou várias vezes que apoia os empresários e tem 5.000 farmácias com profissionais qualificados e condição de fazer distribuição, aplicação e conservação.
P. - Qual é a diferença desse grupo de vocês para aquele Unidos Pela Vacina, de Luiza Trajano?
CW - Tenho convicção que, devido à grandiosidade da causa e à extensão territorial, nós ganhamos mais essa guerra se atuarmos de forma paralela e trabalharmos de forma solidária. Então, a Luiza Trajano de fato tem o Unidos Pela Vacina, que é um grupo de empresários que ela comanda, enquanto eu e o Luciano temos outro grupo.
Não concorre, são complementares e o objetivo é único: antecipar a chegada das vacinas através da sociedade civil organizada.
P. - No seu caso, vocês são contra a doação de 100% ou 50% para o SUS. Vocês queriam comprar para vocês mesmos? Vão judicializar?
CW - Você está falando de três assuntos. Vou abordar cada um distintamente. Ponto um: sim, a intenção é imunizar nossos próprios trabalhadores. Luciano tem 20 mil eu tenho 50 mil. Uma outra indústria tem 10 mil, a outra tem mais 30 mil. Se nós juntarmos, vamos chegar a milhões de trabalhadores.
Ponto dois: em determinado momento levantou-se a questão de que os empresários possam comprar as vacinas para os seus próprios trabalhadores, desde que façam uma segunda doação para o SUS. Não consigo ver muita recíproca nessa questão. Eu já estou sendo solidário com o governo: ele está deixando de ter a logística, a mão de obra, a negociação e o custo dessa aplicação.
Mas, tudo bem, vamos dizer que nós entendemos que o governo, por uma questão que eu não sei exatamente qual, ponha essa regra. Mesmo assim, nós empresários estamos dispostos a comprar duas vezes a vacina, ou seja, eu compro 50 mil para mim e mais 50 mil para o SUS. Eu não vejo muito bem a lógica por trás disso, mas, para nós empresários, sai mais barato fazer essa doação dupla do que manter o país fechado. Esse é o preço que nós vamos ter que pagar? Sim. Se nós tivermos como ter uma flexibilidade, vamos trabalhar com ela.
P. - Vocês preferiam não ter que pagar a doação da vacina para o SUS?Preferiam ter liberada a possibilidade de comprar só para os funcionários?
CW - Não é nem a questão de preferência. Esse foi o projeto original. No entanto, nós estamos flexíveis. Se essa for a regra, nós vamos seguir. Novamente, baseado na premissa de que o que nós queremos é deixar o país voltar ao normal. Agora, vamos voltar ao terceiro ponto da sua pergunta.
P. - A judicialização?
CW - Aí chega no momento que nós estamos. Na semana passada, no Distrito Federal, motoristas de aplicativos se uniram e conseguiram a liberação de comprar, distribuir e aplicar a vacina para os membros de seu sindicato. Agora, os magistrados entraram com ação pedindo também essa liberação, e, novamente, a Justiça concedeu. Sabe o que vai acontecer? Um efeito dominó. Já tem duas. Agora, é só uma questão de as demais centrais de trabalhadores e entidades de classes fazerem a solicitação. É uma coisa lógica. Por que excluir o restante da população, se nós podemos fazer um trabalho paralelo? Não tem razão.
P. - Vocês estão dispostos a pagar até quanto pela vacina?
CW - Eu fui essa semana a Brasília me reunir com o secretário Elcio Franco [secretário-executivo do Ministério da Saúde] e, devido ao relacionamento e à confiança, eles vão nos indicar e recomendar fornecedores que já têm uma aprovação prévia em relação às negociações, preços e qualidade dos fornecedores que estão variando de US$ 7 até US$ 13 a dose. Estamos fazendo toda a nossa previsão em torno de US$ 10 por dose.
Diariamente, eu recebo contatos de fornecedores querendo vender a vacina a US$ 20 ou US$ 25. Ontem, ouvi uma de US$ 35. Eu falei: 'meu amigo, você está de brincadeira. Por US$ 35, vai ter que vender a sua vacina em Marte'.
P. - Essa compra deve acontecer quando? Vai ter vacina para vocês comprarem?
CW - Não adianta eu avançar em uma negociação agora, se eu não tenho nenhum amparo jurídico. A partir do momento em que tivermos esse sinal verde, aí vamos buscar os fornecedores, que já são os grandes mundialmente.
P. - Na primeira repercussão de compra privada de vacinas, as multinacionais diziam internamente que tinham receio de isso gerar uma imagem negativa de fura-fila internacionalmente. O grupo de vocês tem só empresas brasileiras?
CW - São grupos brasileiros e internacionais. Se nós não atendermos os internacionais, corremos o risco de perder essas grandes empresas. Eles vão fechar as portas no Brasil.
Vão gerar um grande desemprego no país. Os estrangeiros já estão conscientes de que esse é o caminho para salvar suas operações. Esse receio que você citou inicialmente, de fato, havia, mas eu acho que, com essas vitórias jurídicas que estão acontecendo, deixa de existir aquele fantasma da preocupação da imagem.
P. - Funcionários das suas empresas, seus familiares e seus amigos com menos de 40 anos poderiam estar sendo vacinados antes de pessoas com mais idade, antes de quem tem comorbidade? Vocês têm receio da imagem do fura-fila?
CW - Estamos falando dos trabalhadores ligados ao nosso grupo empresarial. Nós não estamos falando de familiares, amigos, vizinhos e conhecidos.
P. - Vocês estão negociando com chineses? O presidente Bolsonaro disse lá atrás que não compraria vacina chinesa. Vocês estão excluindo a China como fornecedor?
CW - A nossa questão não é por origem, nacionalidade de país. A nossa decisão é a eficácia da vacina. E, enquanto não tiver a vacina, tem que fazer o tratamento precoce. Eu sou tão adepto do tratamento profilático, que a cada 15 dias eu tomo hidroxicloroquina. Tomo invermectina, zinco e vitamina D. Já estamos com um ano de pandemia, e, até agora, não tive nenhum sintoma de Covid. Não peguei.
PP. - E máscara? O sr. usa?
CW - Uso duas. Uma não é suficiente. Cada vez que eu vou pegar um voo para Brasília, para o México, para os Estados Unidos, em vez de uma máscara, eu uso duas.