Policiais militares são acusados de praticar série de extorsões contra mulher gestante no Ceará
Três PMs estão presos pelos crimes. Controladoria de Disciplina abriu investigação administrativa contra os agentes
Três policiais militares foram denunciados pelo Ministério Público do Ceará (MPCE) por uma série de extorsões, cometidas enquanto estavam de serviço, contra uma mulher gestante, em Maracanaú, na Região Metropolitana de Fortaleza (RMF). Os PMs estão presos e também viraram alvos de uma investigação administrativa na Controladoria Geral de Disciplina dos Órgãos de Segurança Pública e Sistema Penitenciário (CGD).
Uma portaria da CGD, publicada no Diário Oficial do Estado (DOE) da última terça-feira (9), instaurou Processo Administrativo Disciplinar (PAD) contra o cabo da Polícia Militar do Ceará (PMCE) Antônio Wellington Ribeiro de Andrade e os soldados Lucas Valentim Pinto Andrade e Wiver Rodrigues da Silva.
O documento descreve que os policiais militares foram indiciados pela Delegacia de Assuntos Internos (DAI) por extorsões contra duas mulheres, além de cometerem invasão de domicílio, tortura, ameaças e porte ilegal de drogas. Para a Controladoria, "a documentação apresentada reuniu indícios de materialidade e autoria, demonstrando, em tese, a ocorrência de conduta capitulada como infração disciplinar".
Conforme documentos obtidos pelo Diário do Nordeste, os PMs foram denunciados pelo MPCE pelo crime de extorsão, no dia 15 de fevereiro deste ano. A 2ª Vara Criminal da Comarca de Maracanaú, da Justiça Estadual, recebeu a denúncia, e os militares viraram réus, no dia 21 seguinte. Em caso de condenação, a pena pelo crime de extorsão varia de 4 a 10 anos de reclusão.
As prisões preventivas dos militares foram decretadas pela Justiça Estadual no dia 10 de janeiro último e cumpridas dois dias depois, assim como mandados de busca e apreensão nas residências dos agentes e a quebra de sigilo telefônico e telemático. Os policiais recorreram ao Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE) sobre a prisão, mas tiveram os recursos negados.
A defesa dos soldados Lucas Valentim Pinto Andrade e Wiver Rodrigues da Silva, representada pelo advogado Oswaldo Cardoso, sustentou que "os militares são inocentes e que a denúncia feita é infundada, com diversas contradições. A inocência deles será provada nos autos processuais". "O procedimento correu em Vara judicial errônea e os militares têm conduta ilibada, com diversos bons serviços prestados à sociedade. Acreditamos que a Justiça irá sanar essa injustiça", completou.
[Atualização: 11/04/2024, às 08h22] Após a publicação desta matéria, a reportagem recebeu nota da defesa do cabo Antônio Wellington Ribeiro de Andrade. O advogado Ivá da Paz Monteiro Filho informou que "os processos movidos correm em segredo de justiça e os fatos imputados serão, em tempo oportuno, esclarecidos no bojo do processo judicial" e ainda que "os processos se encontram em fase inicial, não havendo nenhuma condenação, sendo importante frisar que qualquer conclusão neste momento será meramente especulativa e temerária".
"Resguarda-se ao direito de se manifestar no momento processual adequado sobre o que for necessário à elucidação dos fatos e a demonstração da verdade, colocando-se à disposição da justiça e colaborando no que for necessário para reestabelecer o sentimento de paz e de segurança na comunidade. Por fim, informa que tem a plena certeza de que a sua inocência será provada no curso da instrução processual", completa a defesa.
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Como aconteceram as extorsões
Conforme a denúncia do Ministério Público do Ceará, uma mulher gestante foi vítima de uma série de extorsões cometidas por policiais militares, em Maracanaú, entre outubro de 2023 e janeiro de 2024. Uma amiga dela também teria sido abordada e extorquida, em um dos episódios.
As duas mulheres foram presas em flagrante pela Polícia Militar, no bairro Jereissati 1, no dia 9 de outubro do ano passado, na posse de pequenas quantidades de droga. Entretanto, elas foram soltas pela Justiça, em audiência de custódia.
Três dias depois, ao verem as mulheres soltas, policiais militares voltaram a abordá-las. "De acordo com o que a vítima narrou, 03 (três) policiais militares adentraram na mesma residência e reviraram todos os móveis, em busca de ilícitos, mas nada encontraram. Então, iniciaram sessões de torturas, com uso de spray de pimenta e ameaças de que desfeririam uma paulada em... (identidade preservada), a qual inclusive está gestante, caso não dissessem onde havia armas e/ou drogas", narra o MPCE.
A outra mulher entregou crack e cocaína. Mas, ainda assim, os policiais exigiram armas de fogo ou dinheiro, para não levá-las presas, segundo a denúncia. A mulher gestante prometeu levantar R$ 5 mil, no mesmo dia. O dinheiro não foi pago, e os policiais teriam avisado à amiga dela que, se a encontrassem, a matariam.
No dia 25 de dezembro último, a mulher gestante foi surpreendida por uma nova abordagem de uma viatura da Polícia Militar. A vítima contou que foi levada para dentro de uma casa, "onde foi torturada pelos policiais, que deram uma paulada em sua cabeça".
Sob a ameaça de lhe prenderem através de um flagrante forjado, com drogas que os próprios policiais traziam consigo, os agentes de segurança pública exigiram R$3.000,00 (três mil reais) de ... (identidade preservada), para não a levarem para a Delegacia, com esse suposto material ilícito forjado, tendo em seguida baixado o valor para R$ 2.000,00 (dois mil reais) e, por fim, para R$ 1.000,00 (mil reais)."
A vítima conseguiu R$ 900 com o tio e transferiu por Pix para um policial militar, no dia seguinte. Porém, ainda assim, as extorsões continuaram, desta vez pela rede social WhatsApp, no início de 2024, segundo a investigação.