Mulher acusada de chefiar a GDE e ordenar expulsões e mortes no Conjunto José Euclides é condenada
Tamiris Santos Almeida, conhecida como "Tamirão", foi sentenciada a cumprir 11 anos e 1 mês de prisão em regime fechado
A Justiça do Ceará condenou a ré Tamiris Santos Almeida, conhecida como "Tamirão", por liderar a facção criminosa Guardiões do Estado (GDE) no Residencial José Euclides, no bairro Jangurussu, em Fortaleza. A sentença foi publicada na última quinta-feira (23) pela Vara de Delitos de Organizações Criminosas (VDOC).
Conforme a decisão, obtida pelo Diário do Nordeste, Tamiris deverá cumprir 11 anos e 1 mês de prisão em regime fechado. Ela não poderá responder em liberdade, pois "há intensa gravidade nas suas condutas e a manutenção de sua custódia faz-se imprescindível para desestruturar a organização criminosa da qual faz parte".
Tamiris já cumpre prisão preventiva desde agosto de 2024, quando foi autuada pela Polícia Civil do Estado do Ceará (PCCE) acompanhada de Emanoel Marques Palhano, conhecido como “Manoel Gordão”, outra liderança da GDE no mesmo conjunto habitacional.
Antes da publicação da sentença, a defesa da ré tentou solicitar a nulidade do processo e pediu a liberdade de Tamires. No entanto, os dois pedidos foram negados, e Tamiris seguiu respondendo pelo crime de associação criminosa, com os agravantes de emprego de arma de fogo e por exercer cargo de comando no grupo.
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Ré encomendava homicídios e expulsava moradores
As dívidas de Tamiris Santos com a Justiça do Ceará não são recentes. Ela responde por tráfico de drogas e roubo desde 2017, quando foi presa pela primeira vez. Segundo as investigações, a acusada teria passado a integrar a GDE um ano depois, em 2018, agindo como braço direito de "Manoel Gordão" no Residencial José Euclides.
Entre as provas utilizadas pelo Ministério Público do Estado do Ceará (MPCE) para solicitar a condenação da Tamiris, estão depoimentos de agentes públicos da Polícia e testemunhas de outros processos onde o nome dela é citado como uma das líderes da facção criminosa no Jangurussu.
A acusada passou a exercer o comando no Residencial José Euclides, ordenando e participando de homicídios, organizando invasões contra territórios rivais, gerenciando o tráfico de drogas e determinando a expulsão de moradores que não se submetiam às ordens da organização.
O papel de liderança de Tamiris dentro da GDE é ainda mais evidente, conforme o MPCE, se analisado um "salve" publicado por uma facção rival nas redes sociais. Nele, o nome da acusada é citado como um exemplo de pessoa cujos moradores do José Euclides não poderiam se envolver, sob pena de morte.
Defesa contesta materialidade das provas
Outra evidência apresentada pelo órgão foi o depoimento prestado por Tamiris logo após ser presa, em agosto de 2024, em que confessa integrar a facção e dá detalhes sobre os diversos delitos cometidos pelo grupo.
Em contrapartida, a equipe de defesa utilizou essa adição para contestar a materialidade do processo. Conforme os advogados, em audiência de instrução ocorrida no início desse ano, Tamiris negou qualquer envolvimento com a GDE, e afirmou que nunca voltou a possuir ligações com o grupo após ser solta, em 2022.
Além disso, a defesa relembrou que um o processo criminal da ré sobre envolvimento com organização criminosa, levado em consideração pelo Ministério Público para traçar o histórico de criminalidade dela, foi reconhecido com litispendência. Isso ocorre quando duas ou mais demandas idênticas são propostas perante o Judiciário, dificultando a análise e perícias.
Sobre o novo depoimento da acusada, o magistrado da Vara de Delitos de Organizações Criminosas, entendeu que ele não é suficiente para embasar o argumento da defesa. "A retratação em juízo, desprovida de qualquer elemento que a sustente, não tem o condão de invalidar a confissão extrajudicial, especialmente quando esta se encontra em harmonia com as demais provas dos autos", decidiu o juiz.
Já com relação à litispendência, o órgão reitera que o processo atual não poder ser contaminado por decisões passadas, já que não se tratam de duas ações penais sobre o mesmo fato investigado, mas sim sobre os mesmos delitos cometidos por Tamiris.
Tais circunstâncias são específicas do crime narrado nestes autos, em que o acusado integra essa organização criminosa, diferente de outras organizações. Essa organização detém essas características próprias, merecendo, por isso, maior reprovação penal o fato do acusado a ela pertencer. Seria injusto tratar da mesma forma um integrante da GDE, dando a pena mínima, e um integrante de uma organização criminosa qualquer, sem os graves atributos desta.
Medo e insegurança no Residencial José Euclides
Uma onda de episódios violentos marcou o conjunto habitacional José Euclides, fruto do programa Minha Casa Minha Vida, do governo federal, nos últimos anos. O mais recente deles aconteceu em julho, quando quatro pessoas ficaram feridas, entre elas uma criança de três anos, durante uma tentativa de chacina no local.
Segundo reportagem publicada no Diário do Nordeste na época do crime, um grupo de homens armados, a bordo de um veículo Ford Ka branco, chegou ao conjunto e efetuou diversos disparos. Conforme o relato dos moradores, um suspeito do ataque foi preso por policiais militares.
Em março do ano passado, disputas de facções rivais levaram a queima de veículos, troca de tiros e arrastões nas proximidades do residencial. As ações teriam sido efetuadas por uma facção carioca, já que o local é dominado por integrantes de uma facção com origem no Ceará. Os confrontos entre os dois grupos na região são frequentes.