Justiça decide levar PM e comparsa a julgamento por homicídio
Defesas dos acusados já ingressaram com recursos contra a pronúncia, no TJCE. Episódio, no qual um homem também ficou ferido, foi desencadeador da Chacina da Messejana, crime pelo qual o mesmo militar é réu
A 4ª Vara do Júri de Fortaleza, da Justiça Estadual, decidiu levar o soldado da Polícia Militar do Ceará (PMCE) Marcílio Costa de Andrade e o comparsa Giovanni Soares dos Santos, o 'Lorim Giovanni', a júri popular por um homicídio e uma tentativa de homicídio, ocorridos no bairro Curió, na Grande Messejana, em Fortaleza, em outubro de 2015.
As defesas dos dois réus já ingressaram com recursos contra a decisão, no Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE). O episódio teria sido um dos desencadeadores da Chacina da Messejana, que deixou 11 mortos no mês seguinte e que tem Marcílio como um dos 44 réus.
A decisão de levar a dupla a julgamento foi proferida no dia 13 de abril deste ano, mas foi disponibilizada para publicação no Diário da Justiça Eletrônico apenas na última terça-feira (16).
Conforme a acusação do Ministério Público do Ceará (MPCE), Marcílio de Andrade e 'Lorim Giovanni' (namorado de uma sobrinha do PM) mataram o adolescente Francisco de Assis Moura de Oliveira Filho, conhecido como 'Neném', de 16 anos, e balearam o pedreiro Raimundo Cleiton Pereira da Silva, então com 39, por volta de 22h de 25 de outubro daquele ano.
Momentos antes, Raimundo Cleiton questionou duas mulheres (inclusive uma irmã de Marcílio) sobre um boato de que a namorada do pedreiro teria entrado em um motel com outro homem. O militar viu a cena, não gostou, saiu de um veículo armado, bradou "é a Polícia, vagabundo" e agrediu a boca e o tórax do homem com uma pistola.
O pedreiro, então, procurou uma viatura da PM para denunciar a agressão e foi orientado pelos policiais a ligar para a Coordenadoria Integrada de Operações de Segurança (Ciops). 'Neném' e Pedro Anderson Alves Domingos - que teriam envolvimento com o tráfico de drogas na região - ficaram sabendo e, armados, ameaçaram o pedreiro por ter chamado a Polícia, o que poderia "causar problemas" no local. Neste momento, segundo o MPCE, Marcílio e 'Lorim' chegaram atirando contra o trio, e apenas Pedro Anderson não foi atingido.
A defesa de Marcílio, representada pelo advogado Paulo Pimentel, afirma que "não aconteceu da forma que está posta na sentença de pronúncia. A defesa entende que ele (PM) agiu com a excludente de ilicitude, repeliu uma injusta agressão".
Já o advogado Valdir Neto, que patrocina a defesa de Giovanni, alega que "ele (cliente) estava próximo da cena do crime, mas não participou do evento". "Estamos inconformados com a decisão de pronúncia. Porém, caso seja realmente realizado o júri, vamos fazer a defesa buscando a absolvição", completa.
Outros acusados
Mais dois homens foram acusados pelo Ministério Público por participação nos crimes: Pedro Anderson, por tentativa de homicídio contra Raimundo Cleiton; e o irmão de Pedro, Francisco Alan Alves Domingos, por porte ilegal de arma de fogo de uso permitido, por emprestar a arma a 'Lorim Giovanni'.
Entretanto, a 4ª Vara do Júri impronunciou Pedro Anderson por tentativa de homicídio e enviou o processo para uma Vara Criminal, para ele responder por porte ilegal de arma de fogo. Enquanto Francisco Alan foi assassinado a tiros, na Messejana, no dia 17 de março de 2019.
Chacina
O assassinato de 'Neném' e a tentativa de homicídio contra Cleiton formaram o primeiro episódio que acirrou o clima entre policiais militares e traficantes, na Grande Messejana, de acordo com as investigações policiais. No dia 29 de outubro de 2015, o pai de 'Neném' foi morto dentro de casa, e a principal suspeita se recaiu sobre a atuação de PMs.
Na noite de 11 de novembro daquele ano, o soldado Valtemberg Chaves Serpa foi morto em um assalto, no bairro Lagoa Redonda, próximo a Messejana. O crime foi a "gota d'água" para dezenas de policiais militares se reunirem e "caçarem" traficantes. Na madrugada seguinte, 11 pessoas foram mortas (inclusive oito adolescentes), mas a maioria não tinha sequer passagem pela Polícia. 44 PMs são réus pela matança.