A cada 15 dias uma pessoa é atingida por bala perdida no Ceará

"Não vi sangue na minha mãe, mas ela já estava morta. A bala perfurou pulmão e coração", conta filho de idosa atingida por bala perdida no bairro Pici

Escrito por Redação , seguranca@svm.com.br
Foto: Rafaela Duarte

Em menos de um ano e seis meses, 33 pessoas foram alvejadas por balas perdidas no Ceará. Todas elas vítimas da violência, que não tinham ligação com a situação do confronto armado. Estavam na hora e no lugar errado, como muitos resumem os episódios.

Em média, ocorre um caso a cada 15 dias. O dado disponibilizado pela Rede de Observatórios da Segurança é referente aos anos de 2020 (24 registros) e 2021 (de janeiro a maio, com nove fatos). Nesta soma estão inclusos casos que expressamente existia a informação de ferimento de arma de fogo por bala perdida, sem necessariamente a morte.

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A socióloga da Rede e do Laboratório de Estudos da Violência da Universidade Federal do Ceará (LEV-UFC), Ana Letícia Lins, destaca que a presença de conflitos e de arma de fogo nos territórios projeta um cenário de vulnerabilidade para todos.

As vítimas de bala perdida em sua maioria, estavam em territórios periféricos e estavam próximas ou presenciaram algum conflito armado. Chama a atenção, principalmente, a vitimização de crianças e adolescentes vítimas de bala perdida, um problema enfrentado também em outros estados (Rio de Janeiro, por exemplo)"
Ana Letícia Lins

CRIANÇA ATINGIDA

Nas estatísticas da Rede está o caso de uma criança de 10 anos de idade atingida por bala perdida, na Avenida Presidente Costa e Silva. O caso aconteceu em novembro do ano passado, e o menino foi socorrido a uma unidade hospitalar após ser alvejado no tórax.

A criança e o pai estavam em uma oficina quando começou um tiroteio. Uma mulher, alvo dos criminosos, também foi atingida e morreu. A Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS) afirma que a Polícia Civil concluiu inquérito acerca deste caso e remeteu o documento à Justiça.

"Um suspeito foi indiciado por homicídio doloso e tentativa de homicídio. As apurações foram conduzidas pela 9ª Delegacia do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP)", disseram por nota.

"MINHA MÃE FOI BALEADA NAS COSTAS"

Carmen Silva Evangelista, 61, estava na esquina de casa, conversando com as amigas quando foi atingida por uma bala perdida. A idosa é o caso mais recente de morte por bala perdida registrado no Estado. A morte foi registrada no último domingo (24), no bairro Pici. 

Um dos filhos, Diego Evangelista, tentou socorrer a mãe acreditando que ela estava apenas desmaiada, mas quando chegou à unidade hospitalar mais próxima foi comunicado sobre o óbito. "Era tudo para nós", resume o filho sobre a saudade sentida pela família.

carmen vitima bala perdida pici fortaleza
Legenda: Carmen tinha 61 anos e era mãe de três filhos
Foto: Arquivo Pessoal

Diego conta que no último domingo viu a mãe conversando com a esposa dele. Em seguida, Carmen desceu as escadas e saiu de casa. Ele lavava o carro e pensou que a matriarca já tinha voltado para casa, mas não. Ouviu dizer que dois homens passaram em uma moto aparentemente em busca de um desafeto. Quando o rival teria percebido de quem se tratava, correu, e um dos disparos acabou atingindo Carmen.

Ouça o áudio

"Ouvi o barulho. Quando chego na esquina me deparo com minha mãe caída ao solo. Peguei ela e socorri. Vi o outro rapaz e socorri, coloquei no carro também. Não vi sangue na minha mãe, mas ela já estava morta. A bala perfurou pulmão e coração", diz.

Diego pede que o ocorrido não fique impune e que as autoridades encontrem os responsáveis pelo homicídio: "Ela deixou três filhos órfãos, deixou os netos. Agora vamos recomeçar nossas vidas e queremos que os culpados sejam punidos. Quem souber quem foi, peço que denuncie para o crime não ficar em vão. Esperamos punição. Eles mataram uma mãe de família, não foi qualquer pessoa".

Ela era uma pessoa alegre, só andava sorrindo, ajudando a quem precisava e cuidando das plantinhas dela. Agora ela cumpriu o plano na terra e está com Deus"
Diego Evangelista

A SSPDS destaca que, sobre os dados de bala perdida, eles são inseridos em ocorrências de lesão corporal dolosa ou em tipificação criminal mais adequada para os casos em que há óbito. "Dessa maneira, as estatísticas compiladas pela Superintendência de Pesquisa e Estratégia de Segurança Pública abrange também outras ocorrências".

BUSCAS CONTINUAM

Nessa segunda-feira (25), a Pasta  informou por nota que equipes da Polícia Militar e da Perícia Forense (Pefoce) foram acionadas e realizaram os primeiros levantamentos da ocorrência no bairro Pici.

O caso é investigado pelo DHPP, que realiza diligências para identificar e capturar os suspeitos. Não há informação atualizada sobre o estado de saúde atual do homem baleado que o filho da idosa morta ajudou a socorrer.

 

* A Rede de Observatórios destaca que o monitoramento  se dá a partir de matérias produzidas por jornais locais. "Os dados monitorados sobre vítimas de bala perdida no Ceará são dados onde, na matéria jornalística, existia a informação expressa de que a vítima foi ferida por disparo de arma de fogo em situação de bala perdida. A produção cidadã de dados joga luz em circunstâncias de violência que muitas vezes não são perceptíveis apenas com os dados oficiais", explicam os pesquisadores.

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