Escolas indígenas só devem voltar às aulas presenciais em 2021, defende organização

O Estado conta com 44 escolas indígenas, sendo 39 estaduais e cinco municipais. Só pela rede estadual são mais de 7,5 mil alunos

Escrito por Rodrigo Rodrigues , rodrigo.rodrigues@svm.com.br
Legenda: A rede estadual de escolas indígenas conta com 39 unidades, em 16 municípios, atendendo um total de 7.602 alunos da Educação Infantil ao Ensino Médio Regular, além da modalidade de Educação de Jovens e Adultos (EJA).
Foto: Madson Pitaguary

As escolas indígenas cearenses só devem retomar às aulas presenciais em 2021, mesmo com eventual decreto do governo do Estado autorizando o retorno. A informação foi confirmada pela coordenadora da Organização dos Professores Indígenas do Estado do Ceará (Oprince), Cristina Pitaguary, em entrevista ao Sistema Verdes Mares nesta sexta-feira (25). A representante defende que as escolas recebam melhorias estruturais para uma volta segura.

O Ceará conta com 44 escolas indígenas, sendo 39 estaduais e cinco municipais. Só pela rede estadual são mais de 7,5 mil alunos atendidos, em 16 municípios, da Educação Infantil ao Ensino Médio Regular, além da modalidade de Educação de Jovens e Adultos (EJA). 

Em agosto, 72 representantes - entre gestores escolares, professores e lideranças se reuniram para debater a atual situação das instituições e ficou decidido que, mesmo com decreto, as atividades presenciais só retornarão em 2021. “A maioria das escolas foi contra o retorno às aulas. Como encaminhamento, a Oprince ficou de criar um documento informando a Seduc que as escolas indígenas só retornariam em 2021, mas que eles viessem fazer as melhorias dentro das escolas”.

“O que as comunidades pedem é que as escolas possam ser estruturadas para a gente poder voltar, mesmo em 2021. A gente tem escola que ainda funciona em casas alugados, em cômodos pequenos, que nem água tem, escola que não tem pátio, quadro que possa estar distribuindo esses alunos”.

Após a reunião, em agosto, os gestores escolares encaminharam um ofício com o parecer das comunidades locais e, somente depois, foi elaborado o documento geral. A orientação foi protocolada, segundo a liderança, em 15 de setembro, antes da autorização de retorno para algumas macrorregiões. Cristina explica que, agora, aguarda uma reunião com a Seduc para debater estes pontos. “Ontem (24), a gente sentou para definir as pautas, mas ainda não temos a data marcada”.

“A gente vai ficar firme com esse documento. Só vamos retornar em 2021 e com a melhoria estrutural das escolas indígenas”.

Pandemia

A representante questiona, ainda, que foi criado um Comitê, na Seduc, para debater o retorno às aulas presenciais na rede pública, porém, sem representatividade da Oprince. Segundo ela, houve participação apenas da Federação dos Povos e Organizações Indígenas do Ceará (Fepoince), que, apesar de importante no cenário estadual, é uma representatividade geral dos direitos indígenas. “Nesse comitê, eu enquanto organização, não fui convidada”.

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Weibe Tapeba, assessor jurídico da Fepoince, concorda que a decisão exige maiores ponderações entre as comunidades indígenas. Segundo ele, a situação da pandemia entre os povos tradicionais ainda é alarmante. “Sou um dos defensores de que as comunidades ainda precisam de uma ação governamental para garantir, primeiro, o apoio às famílias em situação de vulnerabilidade. Garantir as condições mínimas dessas famílias se manterem isoladas é fundamental”

Oprince

Um dos receios deste possível retorno é que as comunidades tradicionais, já consideradas mais vulneráveis, acabem registrando um aumento na circulação do vírus. Por isso, as aulas estão ocorrendo de forma remota. “Os professores estão fazendo seu trabalho através do Whatsapp e temos os alunos que não têm internet, que são poucos, que as escolas imprimem as atividades e fazem a entrega”, explica Cristina. 

“Às vezes, é marcado na própria escola um horário que os pais podem ir pegar as atividades, com limite para não aglomerar. Há também o atendimento de alunos especiais. Na minha escola, eu faço esse acompanhamento. São cinco alunos, com horário marcado, uma hora cada”.

Cristina leciona há 15 anos no município de Pacatuba, na escola indígena Ita-Ara.

Secretaria da Educação

O Sistema Verdes Mares tentou contato com a Secretaria da Educação (Seduc) do Ceará, que respondeu, em nota, que o processo de retomada será "realizado com segurança e responsabilidade, por meio do diálogo, considerando o contexto, as condições estruturais de cada escola e a comunidade indígena, com intuito de promover um ensino de qualidade e com equidade”.

"Estão autorizadas a retornar a partir do dia 1º de outubro as escolas da rede estadual, incluindo as indígenas, que apresentarem condições estruturais e de segurança, conforme o Protocolo 18 - das Atividades Educacionais. O processo de retomada das Escolas Indígenas segue os mesmos critérios (usados nas demais instituições)". 

A Secretaria informou que “fará visitas de monitoramento, na próxima semana, às escolas da rede pública estadual que estão aptas às atividades presenciais, para definir a possível data de retorno. Também haverá a realização de consulta pública com estudantes para avaliar o interesse pelo retorno". O processo de retomada seguirão nos seguintes critérios para as instituições de ensino: 

  • Que apresentem infraestrutura adequada; 
  • Possuam Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) para alunos e funcionários; 
  • Que estejam aptas quanto ao cumprimento das normas de segurança sanitária estabelecidas no Procolo 18 – Atividades Educacionais divulgado pelo Governo do Ceará; 
  • Que todos os profissionais tenham feito o exame para Covid-19.

Pandemia

Segundo boletim da Fepoince desta semana, o Ceará já soma 760 casos confirmados (45 atualmente) e 17 dos 19 municípios cearenses com territórios indígenas já têm registros da Covid-19. A grande maioria (708) das pessoas conseguiram se recuperar da Covid-19, mas, sete indígenas foram vitimados. O Estado apresentou uma redução de 8% no número total de novos casos na última semana epidemiológica. Apesar disso, houve um avanço da doença nos territórios indígenas nos municípios de Crateús e Monsenhor Tabosa, na macrorregião do Sertão dos Crateús. 

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