Ameaçado de extinção, periquito cara-suja tem melhor temporada de reprodução em Baturité
Atualmente, segundo a entidade, existem 561 ovos em ninhos artificiais, a melhor marca desde o início do projeto, em 2010
Com grave risco de extinção na última década, o periquito cara-suja tem se reproduzido e aumentado sua população nos últimos anos, com o trabalho da Associação de Pesquisa e Preservação de Ecossistemas Aquáticos (Aquasis). Atualmente, segundo a entidade, existem 561 ovos em ninhos artificiais, a melhor marca desde o início da contagem, em 2010. Este método adotado para a preservação da espécie, que ocorre principalmente em Guaramiranga, no Maciço do Baturité, foi fundamental para evitar o desaparecimento da ave.
O número de ovos de 2021 já supera o registrado no ano passado, quando foram contabilizados 541 ovos nas caixas-ninho, sendo que 445 eclodiram (foram abertos pelos animais) e 388 filhotes conseguiram voar. Já neste ano, de acordo com os dados parciais, já nasceram 190 filhotes nestes ninhos, com expectativa de superar o ano passado.
O biólogo e coordenador do projeto de conservação do periquito cara-suja, Fábio Nunes, explica que a reprodução da ave acontece uma vez por ano, no período chuvoso. Ao todo, são 83 caixas-ninho instaladas pela Aquasis, em 33 propriedades de Guaramiranga.
“Em janeiro, normalmente, já tem ovos e pode durar até junho, dependendo da estação chuvosa. Lembrando que a serra de Baturité chove mais que o sertão”, pontua Nunes.
Ninhos artificiais
O trabalho com ninhos artificiais começou como experiência, em 2010, quando a população do periquito cara-suja era inferior a 250. “A situação era mais crítica que se imaginava. Muito grave, principalmente por dois motivos: o desmatamento, que prejudica a reprodução, já que ele usa as cavidades de árvores para se reproduzir; e a captura, já que era, e ainda é, um bicho muito vendido, que se criar cedo se torna dócil”, explica Nunes.
Além disso, a pesquisa mostrou que a ave vem desaparecendo em pelo menos 15 áreas do Nordeste, em estados como Pernambuco e Bahia, ainda que existam fortes indícios de que possam ter ocorrido também em Alagoas, Paraíba, Rio Grande do Norte. “Tudo isso registrado ou relatado”, ressalta o biólogo. No Ceará, apesar de ainda ser encontrada em Quixadá, Canindé e Ibaretama, a ave deixou de habitar regiões como a serra da Ibiapaba. “Aqui, estava indo pelo mesmo caminho”, lembra.
Foi quando começou o trabalho com as caixas-ninho de maneira experimental, proporcionando um ambiente adequado para a reprodução. No primeiro ano, apenas uma foi ocupada. Depois, o número aumentou consideravelmente. De 2010 para cá, sem contar os indivíduos que foram vítimas de predadores ou morreram por causas naturais, o projeto proporcionou um aumento de 1.553 em sua população. O resultado permitiu que o periquito cara-suja avançasse um grau na lista vermelha de espécies em extinção, mas permanece “em perigo”. Por outro lado, das aves brasileiras, apenas ela e a arara-azul estão em crescimento populacional, enquanto o restante está estável ou em declínio.
Na prática, o projeto conta com cinco pessoas. Além do biólogo, outros quatro ajudantes de campo que acompanham, diariamente, a reprodução das aves. “A gente faz visitas, mas tem locais mais prioritários. Tem alguns que não tinham, pediam e hoje tem e agora colocamos. A espécie está fazendo expansão de território. Este ano, comemoramos porque praticamente se reproduziu na sede da cidade”, exalta Nunes.
Umas propriedades que recebeu os ninhos artificiais é do economista Ceza Montenegro, que além de ceder o local para a reprodução das aves, doou dez caixas de madeira para o projeto.
“É um trabalho importantíssimo de preservação, sério. Aqui na nossa área também mantemos com muito cuidado. Quando cheguei, a população estava em extinção crítica. Agora, deu uma renovada. A gente nota que aumentou bastante”, observa Montenegro.
Campanha por caixas-ninho
As caixas-ninho, em sua maioria, foram doadas por moradores. A primeira remessa, em 2010, foram de apenas 30, mas ao longo do trabalho os pesquisadores perceberam que eram insuficientes. Ao todo, hoje, são 110 (83 instalados), mas a Aquasis segue recebendo, pois, as estruturas têm uma vida útil. “Aquele que quiser doar, pode nos procurar pelo Instagram. Em breve, vamos lançar uma nova campanha. Lá, terá o manual de como confeccionar, o tipo de madeira”, detalha.
O trabalho tem o apoio da organização Loro Parque Fundación, da Espanha, da ZGAP, da Alemanha e da Fundação Grupo Boticário, do Brasil, que financiaram as pesquisas. Além disso, em 2018, a espécie ganhou um grande reforço: a criação do Refúgio de Vida Silvestre Periquito Cara-Suja, Unidade de Conservação com 39,12 hectares e com 855 metros de altitude, uma área pública localizada em Guaramiranga.
“Lá, não existia nenhum periquito cara-suja reproduzindo. Depois de criada essa UC e que começamos essa parceria com a Sema, a partir de 2019 começou a ocupação deles, sendo que 22 cara-sujas já voaram dos ninhos. Hoje é um território estabelecido deles e em 2021 já são 5 caixas ocupadas, com uma expectativa de termos mais de 30 filhotes voando dos ninhos apenas no REVIS”, projeta Nunes.