Prestes a deixar Prefeitura de Fortaleza, Sarto não teve nenhuma conta de gestão julgada pelo TCE-CE
Todo o trâmite até o plenário do TCE, como consta na Lei Orgânica do órgão, deve ser finalizado até 12 meses após a chegada das contas ao Tribunal

A um mês da troca na condução da Prefeitura de Fortaleza, o Tribunal de Contas do Estado do Ceará (TCE) ainda não julgou nenhuma das contas do governo de José Sarto (PDT). As finanças do primeiro biênio da gestão apenas receberam parecer do Ministério Público de Contas (MPC) no segundo semestre de 2024.
Todo o trâmite até o plenário do TCE, como consta na Lei Orgânica do órgão, deve ser finalizado em até 12 meses após a chegada das contas ao Tribunal. O prefeito tem até 31 de janeiro do exercício seguinte para enviar as contas à Câmara Municipal, que deve remetê-las à Corte até 10 de abril.
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Pelo que se observa, contudo, as contas do primeiro ano da Gestão Sarto, 2021, ainda estão sob análise. Por outro lado, esse prazo pode ser prolongado quando:
- For determinada a suspensão da instrução ou do julgamento do processo;
- Houver decisão judicial que impeça o prosseguimento da instrução ou do julgamento;
- Houver parcelamento do pagamento do débito apurado ou da multa aplicada, até o seu recolhimento integral;
- Outras situações que justifiquem a suspensão do prazo, mas não detalhadas na Lei Orgânica e no Regimento Interno.
O PontoPoder buscou o Tribunal de Contas do Estado para entender por que os processos estão atrasados. Quando houver resposta, a matéria será atualizada.
O processo relacionado ao exercício financeiro de 2021 está sob relatoria do conselheiro Edilberto Pontes, enquanto o relativo a 2022 está sob responsabilidade da conselheira Patrícia Saboya. O primeiro recebeu parecer da 1ª Procuradoria de Contas em agosto deste ano, e o segundo recebeu em 22 de novembro.
Na última segunda-feira (25), Saboya demandou audiência com a Prefeitura a fim de “apresentar justificativa e/ou documentos sobre os fatos elencados” no relatório técnico que embasou o encaminhamento contido no parecer do Ministério Público de Contas. Já o processo sob Pontes não teve nenhum andamento desde então.
O MPC emite pareceres técnicos opinativos nos processos de prestação de contas, mas a emissão do Parecer Prévio é de competência do Plenário do TCE, que analisa o processo em sua integralidade, como esclarece o Tribunal.
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“Cabe ao colegiado, com base nas informações apresentadas no relatório técnico, no parecer ministerial e nos documentos encaminhados pelo gestor, apreciar o relatório e o voto elaborados pelo conselheiro relator e emitir o Parecer Prévio, que pode ser pela aprovação, aprovação com ressalvas ou desaprovação das contas”, completa a Corte, em nota.
Ainda segundo a Lei Orgânica e o Regimento Interno do TCE, não havendo interposição de embargos de declaração, o parecer prévio será encaminhado à Câmara Municipal e ao prefeito. O Legislativo vai apreciar o documento e a decisão decretada nessa instância será conclusiva, não cabendo mais qualquer apreciação por parte do Tribunal de Contas.
Nos dois primeiros anos, os problemas apontados nas contas da Gestão Sarto foram os mesmos: repasses menores que o necessário ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e a abertura de créditos suplementares sem recursos para lhes cobrir.
Contas de 2021
O último relatório de instrução, considerado pelo MPC no parecer, relacionado ao exercício financeiro de 2021 foi emitido em fevereiro e opinou pela emissão de parecer prévio com desaprovação das contas pelo TCE à Câmara Municipal.
O texto aponta como problema a abertura de créditos suplementares, indicados em seis decretos, sem saldo suficiente no momento da publicação. Essa modalidade garante recursos oriundos do excesso de arrecadação daquele ente federado para áreas que demandem reforços orçamentários ao longo do ano.
Segundo o relatório, o montante total de abertura de créditos utilizando a fonte de recursos “Excesso de arrecadação” foi de R$ 702.871.025. Contudo, como diz o TCE, não houve excedente “suficiente para amparar o valor utilizado nos decretos como fonte de recurso”.
Para isso, recomendou que a administração municipal, ao utilizar a fonte de recursos “Excesso de arrecadação” para esse fim, adote medidas para se certificar da existência desse orçamento e busque viabilizar a concretização do referido excesso de arrecadação ao fim do exercício.
Outro problema identificado pelo Tribunal foi o repasse de R$ 4.598.277,77 a menos ao INSS, na diferença de valores consignados a título de Contribuição Previdenciária. Nesse caso, o relatório de instrução recomendou que o Município adote medidas para repassar ao INSS, “em tempo hábil e de forma integral”, os valores devidos.
Analise detalhada
A Prefeitura de Fortaleza esclareceu, nos autos, que no cálculo do excesso foram considerados o saldo positivo das diferenças acumuladas mês a mês entre a arrecadação prevista e a realizada, além da tendência do exercício – apesar de este argumento não ter sido citado nos próprios decretos.
A arrecadação, contudo, foi cerca de R$ 86 milhões a menos que o previsto, constatou o TCE, configurando insuficiência de arrecadação. Apesar disso, a gestão argumentou que somente executou despesas “dentro da disponibilidade financeira para cada fonte de recurso, prezando pelo equilíbrio e responsabilidade fiscal”.
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Ainda assim, não foi isso que o Tribunal detectou em alguns gastos. “Ressalta-se que na presente análise não se está avaliando a regularidade da etapa de execução da despesa relacionada ao referido crédito aberto, não sendo acatadas as justificativas do interessado, as quais citaram a disponibilidade financeira das fontes de recurso”, o que não ocorreu, apontou o relatório.
Quanto aos repasses do INSS, a gestão municipal chegou a informar que o déficit seria cerca de R$ 2,5 milhões em relação ao calculado pelo TCE. De fato, a Corte constatou o pagamento desse valor em 2021, mas referente ao exercício de 2020.
A Prefeitura também argumentou que os repasses podem ser feitos até o dia 20 do mês subsequente à consignação, estendendo um pouco o prazo até janeiro de 2022. O Tribunal não recebeu documentação comprobatória dos processos de pagamentos ao INSS nesse período, mas verificou uma parte do valor em consulta ao Sistema de Informações Municipais (SIM).
Foram pagos R$ 3.350.576,88, mas ainda restaria o montante de R$ 1.247.700,89 sem comprovação de registro no SIM.
O relatório acrescentou que, a partir do exercício de 2019, “tal irregularidade seria considerada como determinante para desaprovação das contas, não sendo suficiente a apresentação da Certidão Positiva com Efeitos de Negativa de Débitos de Tributos Federais”.
Contas de 2022
O último relatório de instrução relacionado ao exercício financeiro de 2022 foi emitido em setembro e opinou pela emissão de parecer prévio com desaprovação das contas pelo TCE à Câmara Municipal.
Quanto à abertura de créditos suplementares utilizando a fonte de recursos “Excesso de arrecadação”, o Tribunal indicou o empenho de R$ 1.284.947.468 em valores.
Novamente, o relatório de instrução diz que, “ao final do exercício, não houve a concretização do excesso de arrecadação suficiente em relação ao montante total dos decretos, ou seja, restou abertura de crédito sem a correspondente fonte de recurso”.
Para isso, recomendou que a administração municipal, ao utilizar a fonte de recursos “Excesso de arrecadação” para esse fim, adote medidas para se certificar da existência desse orçamento e busque viabilizar a concretização do referido excesso de arrecadação ao final do exercício.
Já o outro problema foi um repasse de R$ 7.423.473,70 a menos do que deveria ao INSS. A recomendação do Tribunal foi a mesma de 2021.
Análise detalhada
Na análise das contas de 2022, a Prefeitura usou os mesmos esclarecimentos do ano anterior nos autos sobre o cálculo do excesso de arrecadação. De fato, em alguns decretos, o TCE constatou a existência de excedentes que justificassem a abertura dos créditos adicionais. Em outros, contudo, não existia essa possibilidade.
“Ressalta-se que na presente análise não se está avaliando a regularidade da etapa de execução da despesa relacionada ao referido crédito aberto, não sendo acatadas as justificativas do interessado, as quais citaram a disponibilidade financeira das fontes de recurso, destacando-se a informação de utilização do superávit financeiro para compensar insuficiências em alguns decretos, sendo que os referidos decretos foram abertos por meio da utilização de excesso de arrecadação”, acrescenta o relatório.
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Quanto aos repasses do INSS, a gestão municipal chegou a informar que o déficit seria de cerca de R$ 4 milhões, em relação ao calculado pela Corte de Contas. Contudo, nesse caso, o valor declarado para as Contribuições Previdenciárias engloba os repasses relativos a 2021 e 2022, sendo que a análise em questão aborda apenas o exercício do segundo ano.
Mesmo que os repasses possam ser realizados até o dia 20 do mês subsequente à consignação, o tribunal não localizou nos autos documentação comprobatória dos processos de pagamentos ao INSS referentes a 2022 e efetuados no ano posterior.
Assim, repetiu-se a situação de 2021: o pagamento foi verificado apenas em consulta ao SIM, no valor de R$ 4.164.367,62, mas restam ainda R$ 3.259.106,08 a comprovar.
Último biênio da Gestão Sarto
As contas relativas ao exercício de 2023 foram remetidas à Câmara Municipal e enviadas ao Tribunal. O processou chegou à Diretoria de Contas de Governo do TCE em abril deste ano para andamento inicial. Como o ano de 2024 ainda não acabou, as contas relativas a esse período só serão enviadas posteriormente.