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Por que Bolsonaro tem o discurso social como prioridade para a disputa eleitoral de 2022

Para chegar ao segundo turno, presidente terá de manter sua fatia de eleitorado fiel e melhorar sua popularidade

Escrito por Luana Severo , luana.severo@svm.com.br
O presidente do Brasil Jair Bolsonaro segurando um microfone.
Legenda: Em 2018, Bolsonaro se elegeu, principalmente, por um discurso de moralismo e combate à corrupção.
Foto: Alan Santos/PR

Três anos à frente do Governo Federal colocam Jair Bolsonaro (PL), hoje, em uma situação bem diferente de 2018, quando venceu a eleição presidencial com 57 milhões de votos

Avaliado negativamente pela metade dos brasileiros, segundo as últimas pesquisas, Bolsonaro planeja apostar em um discurso social para tentar reverter o cenário e garantir a recondução ao cargo nas eleições de outubro. Isso em meio aos desgastes da gestão, como a fome, o desemprego e a incessante ameaça do coronavírus

Eleito com um discurso de “renovação política” pautado em combate à corrupção e moralismo, o presidente acabou não conseguindo concretizar as ações ao longo dos últimos anos. Apesar disso, mantém o discurso em torno dessa agenda para continuar alimentando o eleitorado.

Ameaçado eleitoralmente pela presença do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) na corrida para a disputa de outubro, Bolsonaro agiu para implementar o Auxílio Brasil, se aproximando mais da agenda social, que é uma das principais bandeiras de seu adversário direto. 

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“Nas eleições de 2022, Bolsonaro já não vai mais ser um outsider, ou seja, uma figura que tenta se colocar, se vender como uma liderança fora do mundo político. Ele já teve um primeiro mandato, tem uma gestão, então, tem que apresentar algo. Não pode simplesmente criticar outros gestores”, entende o cientista político Cleyton Monte. 

Outro ponto é que, na campanha de 2018, Bolsonaro também se ancorou numa promessa de redução da atividade estatal que foi desbancada pela Covid-19, uma vez que, para sobreviver à pandemia, à inflação e ao crescimento acelerado do desemprego, a sociedade se tornou cada vez mais dependente de auxílios do Governo. 

“O ministro (da Economia) Paulo Guedes, um dos principais no início da gestão, acabou secundarizado. Ele foi, durante o Governo, ocupando cada vez menos espaço, principalmente pelas dificuldades em relação à diminuição da atividade estatal. E a pandemia trouxe uma lógica contrária, de aumento da atividade estatal, para garantir auxílio às populações mais vulneráveis e às empresas”, lembra a cientista política Carla Michele Quaresma.   

O que mais preocupa o brasileiro 

De acordo com a pesquisa Genial/Quaest divulgada na última quarta-feira (12), a maior parte dos entrevistados (37%) acredita que o principal problema do Brasil, atualmente, é a economia. Saúde está em segundo lugar (28%), seguida de questões sociais (13%). Já a corrupção, uma das pautas que levaram Bolsonaro à presidência em 2018, aparece em último (9%). 

Para Cleyton Monte, Lula se sai melhor do que Bolsonaro no discurso econômico pela memória de que, sob a sua gestão, as classes C e D ascenderam socialmente, tiveram ganho real no salário mínimo e mais acesso à ampliação de crédito.

“Isso atrai eleitorado para o Lula e afasta esse mesmo eleitorado do Bolsonaro. Por isso essa alteração na ordem discursiva do presidente”, entende o cientista político. Com o Auxílio Brasil de R$ 400 mensais, a ideia de Bolsonaro é, portanto, evitar que a população que mais sofre os impactos diretos da pandemia migre ostensivamente para Lula. 

Carla Michele, por sua vez, ressalta que a avaliação de um presidente da República está diretamente relacionada à condição financeira das pessoas.  

Se elas(pessoas) têm uma situação financeira confortável, se estão podendo acessar bens de consumo, a avaliação do presidente melhora muito. Então, com esses programas (como o Auxílio Brasil), ele (Bolsonaro) vai conseguir (melhoras seus índices de popularidade), principalmente em regiões onde encontra mais dificuldade”. 
Carla Michele Quaresma
Cientista política

Auxílio Brasil 

A imagem mostra um celular no aplicativo da Caixa para receber o Auxílio Brasil. O celular está sobre cédulas e moedas.
Legenda: O Auxílio Brasil começou a ser pago ainda no ano passado às famílias cadastradas.
Foto: Shutterstock

O Auxílio Brasil foi criado ano passado pela gestão Bolsonaro para substituir o Bolsa Família, programa de transferência de renda que marcou a era lulista no País. 

Especialistas entendem a substituição como uma estratégia política do presidente para imprimir sua marca no programa e, assim, conseguir se aproximar da agenda social.  

“Num período pré-eleitoral, ele (Bolsonaro) põe fim a um programa que tem uma marca muito forte relacionada a Lula e inicia um novo para criar uma identidade para o Governo nessa relação com as populações mais vulneráveis, que é onde ele encontra mais dificuldade de inserção”, analisa Carla Michele. 

O empenho do presidente em garantir o pagamento do Auxílio Brasil neste ano de eleições foi tanto que ele pressionou sua base no Congresso para aprovar em dezembro a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) dos Precatórios, que abriu um espaço fiscal em torno de R$ 44 bilhões no Orçamento.

Além disso, antes mesmo de a PEC ser aprovada, o presidente editou uma Medida Provisória que criou um "benefício extraordinário" e garantiu o pagamento do valor cheio do auxílio (R$ 400) ainda em dezembro.  

Segundo turno

Se Bolsonaro conseguir manter sua fatia de 23% do eleitorado fiel, dar uma resposta efetiva às demandas mais urgentes da sociedade e melhorar sua popularidade com o Auxílio Brasil, é possível que chegue ao segundo turno e mude novamente seu tom discursivo, segundo pesquisadores.

"Ele (Bolsonaro) quer manter o percentual que tem para que tenha a possibilidade de chegar ao segundo turno com força. E, para manter esse percentual, tem que estar constantemente alimentando sua base falando dos costumes, fazendo críticas à vacinação, aos governadores, à 'herança maldita do PT'", observa Cleyton Monte.

Além disso, Carla Michele reforça que, uma vez que a situação econômica do País esteja confortável, "as pessoas tendem a confiar no presidente, a dar um crédito e a garantir bons índices de popularidade para ele. Tudo passa a ser secundário, inclusive, a corrupção", diz.

CPI da Covid-19

Se chegar ao segundo turno num cenário contra Lula — a pesquisa da Genial/Quaest aponta que o petista marcaria 54% a 30% contra o presidente —, Bolsonaro deve voltar a falar sobre os escândalos de corrupção envolvendo o PT e o ex-presidente.

Diferentemente de 2018, no entanto, o presidente tem o assunto da corrupção com certa preocupação, tendo em vista as suspeitas de irregularidades na gestão reveladas pela CPI da Pandemia no Senado Federal.

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"Tudo aquilo que foi amplamente discutido, apresentado pela CPI, vai ser retomado. Principalmente no segundo turno, que é quando acho que a questão da corrupção volta mais forte. Mas, todos os candidatos vão utilizar esses elementos para desconstruir seu oponente", projeta Carla Michele.

 

 

 

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