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Perda de prefeitos, derrota nas urnas e cerco na Justiça: os rumos da oposição do Ceará para 2024

Grupo oposicionista ganhou espaços na eleição de 2020, mas acabou perdendo aliados e enfrentando derrotas nas urnas no pleito seguinte

Escrito por Igor Cavalcante , igor.cavalcante@svm.com.br
Grupos políticos de Wagner e Bolsonaro no Ceará têm enfrentado percalços após bons resultados em 2020
Legenda: Grupos políticos de Wagner e Bolsonaro no Ceará têm enfrentado percalços após bons resultados em 2020
Foto: Camila Lima

Enquanto PT e PDT disputam espaço nas prefeituras cearenses, nos parlamentos e no Estado, o grupo oposicionista mais tradicional do Ceará acumula reveses mesmo com uma base eleitoral fiel.

Após 2020, quando o principal nome da oposição no Ceará, o então deputado Capitão Wagner (União Brasil), quase foi eleito prefeito de Fortaleza e aliados dele conquistaram municípios estratégicos, a oposição no Ceará tem enfrentado percalços com a perda de prefeitos, derrotas recentes nas urnas e disputas na Justiça.

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Wagner, por exemplo, chegou a disputar a eleição de 2022 em um partido com amplo tempo de propaganda eleitoral e recursos, além do apoio do então presidente Jair Bolsonaro (PL), no entanto, foi derrotado ainda no primeiro turno por Elmano de Freitas (PT) para o Governo do Ceará. Com o resultado, ele também ficou sem mandato nacional e, atualmente, é secretário da Saúde de Maracanaú, município comandado pelo prefeito Roberto Pessoa (União).

“É inegável que o grupo de oposição sofreu um baque com a derrota do grupo do Bolsonaro no plano nacional, embora não tenha sido uma derrota considerável, foi por uma margem pequena. Os oposicionistas também saíram bem do ponto de vista de votação: o André Fernandes, o Capitão Wagner, o Carmelo Neto, mas eles não dominam mais, não gerem mais a máquina pública federal. Isso, por si só, dá uma certa baqueada na força ou pelo menos na performance”
Emanuel Freitas
Professor de Teoria Política da Universidade Estadual do Ceará

A derrota nacional do grupo, no entanto, é um dos elementos da lista de percalços da direita cearense que começou antes mesmo da eleição do ano passado. Aliados do hoje secretário da Saúde começaram um movimento em direção ao grupo governista há meses da campanha. O prefeito de Caucaia, Vitor Valim, foi o primeiro deles. 

Debandada de prefeitos

O mandatário chegou ao fim do ano passado fazendo campanha para o presidente Lula (PT), para o ministro Camilo Santana (PT) e para seu ex-adversário em Caucaia, o hoje governador Elmano de Freitas (PT). O prefeito de São Gonçalo do Amarante, Professor Marcelão (União), outro aliado de Wagner até a eleição do ano passado, anunciou nesta semana que irá se filiar ao PT. Quem também se aproximou do grupo governista foi o prefeito de Juazeiro do Norte, Glêdson Bezerra (Podemos), atualmente integrante de um partido que compõe a base governista.

Em entrevista recente ao Diário do Nordeste, o chefe do Executivo de Juazeiro do Norte evitou se classificar como oposição. “Estou completamente aberto a todo mundo para conversar e entender quem é que tem o melhor projeto”, sinalizou.

Até mesmo o prefeito de Maracanaú, Roberto Pessoa, de quem Wagner é auxiliar, tem se aproximado do Palácio da Abolição. A deputada federal Fernanda Pessoa (União), filha do prefeito, é parte da base do Estado. Além dela, o vice-prefeito da cidade, Neton Lacerda, se filiou nesta semana ao Republicanos, legenda governista. Além dele, o chefe de gabinete da Prefeitura, Rodrigo Mota, se filiou nesta semana ao PT. 

O próprio Roberto Pessoa já reconheceu essa proximidade com o Governo do Estado. "Eu estou me aproximando administrativamente", disse o prefeito em entrevista ao PontoPoder em março deste ano.

"Fiz uma amizade pessoal com Elmano, com o (Waldemir) Catanho, com a Lôra (deputada federal Luizianne Lins), muito minha amiga. Esse lado do PT ligado à Lôra é mais ligado a mim, sempre fui ligado a eles, porque… Eu fui do PFL, mas do PFL do Ceará, como dizia o Lula. No Governo Lula, o segundo, eu fiquei do lado dele no Congresso Nacional…"
Roberto Pessoa (União Brasil)
Prefeito de Maracanaú

Apesar de ver os aliados se afastando, o líder oposicionista Capitão Wagner avalia como “natural” a aproximação de mandatários municipais com o Estado.

“Infelizmente, por conta da pobreza e da necessidade que os municípios têm de ajuda do Estado, a maioria dos prefeitos acabam se rendendo ao Governo do Estado. A gente sabe como é que funciona a política do Ceará, então se um prefeito não for aliado ele pena, sofre muito, a pressão é muito grande. Então isso é mais do que natural e eu não imaginei que seria diferente nesse momento”
Capitão Wagner (União Brasil)
Liderança da oposição e secretário da Saúde de Maracanaú

Governismo

A tendência governista das prefeituras cearenses não é de hoje, apontam cientistas políticos. Conforme a professora de graduação e pós-graduação em Direito da Unifor e doutora em Ciência Política pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Mariana Dionísio de Andrade, os mandatários buscam a manutenção dos bons resultados eleitorais mesmo que para isso tenham que “mudar o discurso e negociar a filiação a um partido completamente oposto (...) justamente para se utilizar da virada à esquerda da maioria dos eleitores aqui no Ceará”.

“Isso não significa necessariamente o enfraquecimento da extrema direita, mas sim um posicionamento estratégico que é até previsível, na medida em que nenhuma candidatura sobrevive sem o apoio da maioria. Essa abertura de um diálogo mais ameno entre os antigos apoiadores de Bolsonaro com o partido da situação demonstra claramente que a ideologia de alguns candidatos cede espaço para a articulação sempre que os riscos de perder o poder se aproximam”
Mariana Dionísio de Andrade
Professora de Direito da Unifor e doutora em Ciência Política pela UFPE

A aproximação de opositores do Governo aparece ainda em nível federal, o deputado federal Yury do Paredão (PL), eleito apoiando Bolsonaro e Wagner, já passou a integrar a base governista federal nos primeiros dias na Câmara dos Deputados e tem tido constantes encontros com o governador Elmano de Freitas.

O parlamentar, inclusive, foi motivo de insatisfação de petistas após ter sido um dos poucos políticos do Ceará que conseguiu recepcionar o presidente Lula na chegada ao Cariri, em maio, e ainda esteve ao lado do petista no palco. “Estamos ansiosos para discutir ideias e soluções para o desenvolvimento do nosso Estado. Juntos, podemos construir um Ceará mais forte e justo para todos”, escreveu o deputado à época em foto ao lado de Lula, Camilo, Elmano e do deputado federal José Guimarães.

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Bolsonaristas fiéis

A ala da oposição mais tradicionalmente ligada ao bolsonarismo no Ceará é uma das poucas que se mantém na oposição. Contudo, os percalços são outros. O deputado estadual Carmelo Neto (PL) e o deputado federal André Fernandes (PL), por exemplo, têm suas próprias dores de cabeça.

O deputado estadual corre risco de perder seu mandato já que a chapa do PL foi cassada pelo Tribunal Regional Eleitoral do Ceará (TRE-CE) por fraude na cota de gênero. Além dele, correm risco de perder as cadeiras na Assembleia Legislativa (Alece) o deputado Alcides Fernandes e as deputadas Dra. Silvana e Marta Gonçalves.

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Já em nível federal, o Supremo Tribunal Federal (STF) investiga André Fernandes por ter, supostamente, promovido os atos de 8 de janeiro contra a Praça dos Três Poderes em Brasília.

Durante os atos de terrorismo de apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro, o cearense publicou imagem de partes do gabinete do ministro do STF Alexandre de Moraes, justamente o responsável pelo inquérito que investiga os atos antidemocráticos.

A falta da máquina pública nas mãos

Conforme o professor Emanuel Freitas, os obstáculos enfrentados pela oposição no Ceará demonstram a dificuldade de não se ter a “máquina pública” nas mãos.

“Estar fora da máquina federal, que é aquela que pode distribuir cargos, dar visibilidade e produzir capital político, causa certa redução da evidência e expõe a concorrência de uns com outros, porque eles precisam encontrar outros meios para se pôr em evidência, isso em um contexto que antecede as eleições municipais em que tem muitos candidatos para poucos cargos”, ressalta. 

Contudo, Freitas é cauteloso sobre um possível enfraquecimento da direita no Estado.

“Não é um grupo enfraquecido, eles saíram muito bem votados na eleição, o Wagner foi o que mais recebeu voto na Capital para governador, tem ainda o André Fernandes, a Dra. Silvana, o Carmelo Neto, todos esses sujeitos foram muito bem votados”
Emanuel Freitas
Professor de Teoria Política da Uece

“Ocorre que eles estão fora da máquina federal. Eles têm capilaridade política, eles têm visibilidade das redes, eles têm recall eleitoral, o que lhes falta, neste momento, é a exibição a partir da máquina pública federal e também da estadual, que eles não têm”, conclui.

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