Bolsonaro, Ciro e Lula: como os principais pré-candidatos a presidente querem conquistar o Nordeste
Busca por alianças nos estados é a principal estratégia da pré-campanha
O Brasil tem 149,8 milhões de eleitores aptos a votar, segundo o Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Desses, 40,2 milhões (26,8%) são só no Nordeste. É a segunda maior fatia do eleitorado, perdendo apenas para a do Sudeste, que concentra 42,5%. Conquistar os nordestinos é, portanto, estratégico para quem quer vencer numa disputa a presidente da República.
Faltando menos de seis meses para as eleições presidenciais, o presidente Jair Bolsonaro (PL) e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) são os que, neste momento, mais mostram que movimentam peças para articular forças no território.
"Os pré-candidatos, em geral, estão vendo o Nordeste com relevância, importância. Deixou de ser um discurso apenas de que 'o Nordeste é importante' para ele ser, de fato, estratégico. Essas movimentações direcionadas vêm se intensificando pela percepção de que o eleitorado nordestino pode decidir a eleição", acredita a cientista política e professora da Universidade Federal de Pernambuco, Priscila Lapa.
Lula tem apostado em encontros com líderes políticos para estruturar seus palanques nos estados, e, Bolsonaro, tem feito visitas recorrentes, inaugurando obras estruturantes, discursando sobre programas assistenciais como o Auxílio Brasil e acirrado ataques aos governadores de oposição à sua gestão.
Terceiro colocado nas recentes pesquisas de intenção de voto, o ex-ministro Ciro Gomes (PDT), por sua vez, se mantém mais reservado, tentando angariar apoio político nos bastidores. Nas redes sociais do pré-candidato, por exemplo, Nordeste ainda nem é o foco.
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E tem o ex-governador de São Paulo João Dória (PSDB), que apareceu no último levantamento do Instituto de Pesquisas Sociais, Políticas e Econômicas (Ipespe) com 3% das intenções de voto. Ele é o que mais encontra dificuldade de inserção no Nordeste, tanto pela força dos outros três adversários na região como por ainda não conseguir mobilizar forças dentro do próprio partido — no Ceará, por exemplo, o senador Tasso Jereissati (PSDB), líder tucano, é mais alinhado ao ex-governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB), que disputou a vaga de pré-candidato da sigla com Dória e perdeu.
Para analisar como os principais pré-candidatos ao Planalto têm tentado se aproximar do eleitorado nordestino, o Diário do Nordeste ouviu cientistas políticos de diferentes estados da região. Veja as opiniões.
Diminuir rejeição
Nas muitas visitas que tem feito a estados nordestinos no último ano, Bolsonaro tenta reverter o cenário político de 2018. Isso, porque foi no Nordeste que ele teve o pior desempenho na última campanha presidencial e porque é onde sua popularidade é uma das mais baixas do País, segundo pesquisas.
O presidente também sabe que a região é reduto histórico do PT e berço político de Ciro, o que garante uma vantagem aos dois principais adversários.
“Com o aumento da rejeição de Bolsonaro em outras regiões do país, o Nordeste passou a ser visto como um lugar estratégico para repor parte dos votos perdidos”, acredita o cientista político Cláudio André de Souza, professor da Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (Unilab) na Bahia.
É por isso que, de todos os principais pré-candidatos, Bolsonaro é o que mais se preocupa em mostrar nas redes sociais que investe no Nordeste e que está presente, inaugurando obras estruturantes de recursos hídricos e discursando sobre programas sociais de Governo, como o Auxílio Brasil e a Casa Verde e Amarela — antigos Bolsa Família e Minha Casa, Minha Vida, programas criticados por ele e que marcaram as gestões Lula e Dilma Rousseff (PT).
Na semana passada, em transmissão ao vivo no Instagram, o presidente, que estava em viagem à Paraíba, comentou com seus seguidores que “vale a pena ver como o nordestino nos trata”. Antes e depois disso, ele publicou vários vídeos de manifestações de apoiadores locais.
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Na manhã da quarta-feira (11), para reforçar a proximidade com os nordestinos, Bolsonaro publicou na mesma rede social um vídeo gravado durante a inauguração de um sistema adutor na região, no qual disse: "Cada vez mais libertamos o povo do Nordeste da escravidão do carro-pipa".
Além do contato direto com os eleitores, o presidente também tem articulado suas bases políticas para fortalecer palanques em estados estratégicos como Rio Grande do Norte, Pernambuco e Ceará.
No primeiro estado, ele tem o apoio do ex-ministro do Desenvolvimento, Regional, Rogério Marinho (PL), que pretende se lançar ao Senado. No segundo, Bolsonaro também conta com o suporte do ex-ministro do Turismo, Gilson Machado (PSC), que quer concorrer ao mesmo cargo. No terceiro, tem o apoio do deputado federal Capitão Wagner (União Brasil), que reúne cada vez mais aliados e se fortalece como o principal pré-candidato de oposição à base governista.
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Reunir força política
Para os cientistas políticos ouvidos para esta reportagem, Lula é o pré-candidato à presidência que, hoje, mais reúne vantagens políticas no Nordeste.
Consciente disso e tentando manter acesa no eleitorado a memória de suas duas gestões à frente do comando nacional, o petista usa seu tempo de pré-campanha para organizar alianças políticas e construir palanques na região — sejam puros, duplos ou até triplos, dependendo dos arranjos que se desenham para concorrer aos comandos estaduais.
O governador Rui Costa, por exemplo, da Bahia, já se articula para formar uma frente de apoio a Lula no Estado. O mesmo acontece em Pernambuco, onde Lula já declarou apoio ao deputado federal Danilo Cabral (PSB), correligionário do atual governador Paulo Câmara.
No Ceará, o ex-presidente tem apoio do ex-governador Camilo Santana (PT), pré-candidato ao Senado, que deixou o Palácio da Abolição com altos índices de popularidade. Ele também deve contar com o ex-senador Eunício Oliveira (MDB), que tem declarado apoio publicamente, e com líderes do Psol no palanque.
“O Nordeste é onde Lula guarda maior recall, tem capacidade de pautar eleição focada na agenda econômica, pode resgatar o que foi feito, tem uma vantagem competitiva muito grande. (...) A estratégia, com certeza, é voto de retrospectiva. Tratar o Nordeste com prioridade, direcionar para a pauta econômica, para a insegurança alimentar, enfim, todas essas pautas que são caras ao Governo Lula”, acredita a cientista política Priscila Lapa.
Adriano Oliveira, cientista político e professor da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), acredita ser “muito difícil, para qualquer candidato, ter uma estratégia para enfrentar o lulismo no Nordeste”, especialmente devido à memória do eleitorado.
Apostar na identificação e na divisão do eleitorado
Um trunfo que Lula e Ciro Gomes têm em comum, segundo os cientistas políticos, é conhecer bem as distintas realidades dos nordestinos e, por isso, compreender demandas e saber dialogar sobre elas.
Priscila acredita que, como Lula, o pedestista prioriza “investir nessa questão do recall” e mostrar que também conhece a realidade da região, que pode planejar o País sob a ótica do eleitor do Nordeste e que pode consertar o que foi feito de “errado” ou fazer o que não foi feito pelos outros governantes.
No entanto, Adriano acredita que, por existir Lula na equação, Ciro precisa se esforçar mais para superar o petista no Nordeste, mesmo já sendo forte liderança política local junto ao seu irmão, o senador Cid Gomes (PDT). “Ciro tem dificuldade de conquistar o eleitor nordestino simplesmente por existir o lulismo”, pontua o especialista.
No primeiro turno das eleições de 2018, quando disputou a presidência da República contra Bolsonaro e Fernando Haddad (PT), o único estado nordestino em que Ciro foi preferência entre eleitores foi o Ceará. Em todos os outros estados da região, venceu o candidato petista.
“Ciro tem se reunido com lideranças dos estados, mas sabe que é muito difícil obter palanques fortes”, reforça o cientista político Cláudio André de Souza. Tanto que, recentemente, o pedetista tentou forçar uma separação no Ceará entre o seu partido e o PT, ao afirmar que há um “lado corrupto” nos quadros estaduais da legenda.
Nas redes sociais, inclusive, Ciro se mostra mais preocupado em atacar Lula e Bolsonaro, seus dois principais adversários, e em mostrar que dialoga com lideranças políticas de outras regiões da federação, como Sul e Sudeste, principalmente.
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Disputa pelo centrão
Para Cláudio André, ainda não está bem definido como as forças políticas do chamado "centrão", no Nordeste, vão se portar nas eleições. Isso deve pesar nas movimentações dos pré-candidatos à presidência, especialmente Lula e Bolsonaro, que protagonizam o cenário de polarização política.
"A (estratégia) de Lula é reforçar palanques competitivos que necessariamente não estejam longes do centrão. O ex-presidente busca uma atração direta e também indireta de aliados para um eventual segundo turno. (...) No Nordeste, a força do centrão ainda não está clara quanto ao envolvimento das lideranças no apoio ao atual presidente, se farão um embate efetivo pró-Bolsonaro. É algo a se perceber nos próximos dois meses, em consonância com as disputas estaduais", observa o especialista.