Baú da Política: Prefeito cearense perde cargo por conta de renúncia escrita dois anos antes
Reportagem conta a história do prefeito de Varjota que renunciou ao cargo sem querer
Eleito em 1996 e prestes a disputar a reeleição em 2000, o então prefeito Antônio Pires, de Varjota, a cerca de 260 quilômetros de Fortaleza, foi surpreendido na reta final de seu mandato com uma decisão judicial que validou uma carta-renúncia e o obrigou a deixar o cargo. O pedido para sair da prefeitura tinha sido assinado pelo próprio político, mas dois anos antes e, segundo ele, em um “papel em branco”.
Quando a história veio à tona, Antônio Pires rejeitou a hipótese de que a memória o tivesse traído ao ter assinado a renúncia e esquecido logo depois.
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De acordo com o político, em entrevista a jornais à época, a carta-renúncia foi uma manobra do vice-prefeito, Moacir Farias Martins, e da procuradoria jurídica de Varjota, que era comandada por um familiar de Pires.
Eles teriam usado folhas de papel em branco assinadas e redigido o pedido de afastamento na mesma página. Ainda conforme o ex-prefeito, os papéis foram assinados por ele pouco antes de tirar licença médica para ser submetido a uma cirurgia cardíaca.
Na trama narrada por Pires, o vice teria escrito o texto de renúncia sobre a assinatura dele e espalhado pela cidade.
Essa história integra a série Baú da Política Eleições, que resgata a memória política cearense, buscando histórias curiosas e inusitadas envolvendo atores políticos do Estado.
TRAJETÓRIA POLÍTICA
Com o falecimento de Antônio Pires em 2006, quem reconta essa história hoje é seu sobrinho, Renato Pontes, chefe de gabinete do atual prefeito de Varjota, Elmo Monte.
“Meu tio foi o primeiro prefeito de Varjota, ele lutou muito pela emancipação da nossa cidade, que ocorreu em 5 de fevereiro de 1985. Ele ficou até a eleição de 1988 e voltou em 1996, quando governou até 2000, o ano que teve toda essa história”, narra Pontes.
“Depois da decisão da Justiça, ele não voltou mais para o cargo, já era ano eleitoral, então ele se candidatou novamente e o vice, que fez a maracutaia, foi candidato, mas perdeu. Quem ganhou (a eleição de 2000) foi um terceiro candidato, o Gentil de Sousa Magalhães, que era adversário histórico do meu tio”, conta.
TROCA DE COMANDO
A carta de renúncia, que começou a circular em 1998, logo foi levada à Justiça pelo vice-prefeito, mas o documento foi considerado inválido. Contudo, já próximo às eleições, em maio de 2000, diante da recusa do Legislativo de empossá-lo, o vice-prefeito voltou à Justiça, que decidiu considerar a renúncia válida.
Com a vacância do cargo mais alto do Executivo de Varjota, Moacir Martins foi empossado pela Câmara Municipal logo em seguida. Ao todo, Antônio Pires governou por pouco mais de três anos e Moacir Martins concluiu o último ano da gestão.
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COMPANHEIROS DE CHAPA
Por outro lado, Moacir Farias Martins sempre negou a acusação e se diz amigo do colega de chapa. Em entrevista ao Diário do Nordeste, o empresário de 62 anos contou a sua versão da história.
O ex-vice-prefeito culpa a antiga procuradoria do município pela armação.
“Me falaram que alguém teria que assumir, se não fosse eu, seria o presidente da Câmara, então eu aceitei assumir, mas surgiu outro problema, no dia da minha posse, o presidente da Câmara, José Ferreira Linhares, que era do lado do ex-prefeito, sumiu com o termo de posse e eu não pude assumir"
“A Justiça determinou a minha posse faltando seis meses para a eleição, em 23 de maio de 2000. Ele (o ex-prefeito) já ia ser candidato à reeleição, eu também fui, tinha o Gentil Magalhães, que já tinha sido prefeito também, e o Ari Ximenes. O Gentil ganhou com mais de dois mil votos”, contou.
Rompidos após o episódio envolvendo a carta de renúncia, Moacir Martins relembra que voltou a disputar eleição ao lado de Antônio Pires em 2004. “Política tem dessas coisas, né? Os aliados dele sempre falaram que eu tomei a prefeitura, mas foi ordem da Justiça por conta da carta”, concluiu.