Ameaças, agressões e homicídios: qual o retrato da violência política no Brasil e no Ceará em 2023
Apenas nos três primeiros meses do ano, os casos violentos relacionados à política foram superiores a 110
Nos três primeiros meses do ano, o Brasil registrou 114 casos de violência política e eleitoral. Apesar de o número ser menor do que o registrado no último trimestre de 2022 - quando foram 131 episódios -, os números de 2023 estão, até agora, semelhantes aos de anos eleitorais, quando existe um aumento nesta violência.
O Ceará, por sua vez, teve uma diminuição do número nos últimos anos. Enquanto nos primeiros meses de 2020, por exemplo, foram oito casos de violência política, em 2023, foram apenas dois.
Contudo, os tipos de violência registrados neste ano no Estado foram mais graves: os dois episódios tratam de homicídio - de liderança política ou dos familiares. Além do Ceará, apenas três estados brasileiros tiveram notificação de dois casos de assassinato.
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Os dados são do boletim do Observatório da Violência Política e Eleitoral, publicação sob responsabilidade do Grupo de Investigação Eleitoral da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (GIEL/Unirio).
Quais violências políticas são cometidas?
Em 2023, houve um salto dos casos de violência política em março. O mês registrou, sozinho, mais episódios do que os dois meses anteriores.
As notificações nestes três primeiros meses do ano são bem próximas ao mesmo período em 2022 - quando foram registrados 113.
Os números de 2023 são ainda superiores ao de outros anos não eleitorais. Em 2021, por exemplo, foram 89 casos de violência política no primeiro trimestre, enquanto em 2019, foram 20.
Quanto aos tipos de violência, as ameaças se destacam. Elas representam mais de 50% dos casos registrados em 2023 - o equivalente a 63 casos. Na sequência, estão agressões, com 17 casos, e homicídios, com 13. Também foram notificados 11 atentados e um sequestro.
Em relação à violência contra familiares de lideranças políticas, foram registrados sete homicídios, um atentado e um sequestro.
Violência política no Ceará
Desde 2020, quando os dados por estado começaram a ser disponibilizados pelo Observatório da Violência Política e Eleitoral, os números de casos deste tipo no Ceará permaneceram estáveis.
Na maioria dos trimestres, os registros eram inferiores a 5 - números superiores a isto foram registrados apenas em 2020, ano de eleição municipal.
Apesar de poucos episódios, a gravidade dos registros feitos no Ceará em 2023 deve ser considerada: os dois foram assassinatos políticos - contra lideranças ou familiares (o relatório não diferencia as duas categorias).
Os homicídios têm sido frequentes nos casos registrados no Ceará, desde de 2020. No total, o relatório traz 16 assassinatos políticos no Estado neste período. Apenas o número de ameaças é maior - foram 17.
Perfil de quem sofre a violência
O relatório do Observatório da Violência Política e Eleitoral também delimitou o perfil das vítimas mais atingidas pela violência política de 2023.
Apesar de terem existido, por exemplo, ameaças contra o presidente Lula, o vice, Geraldo Alckmin, e cinco senadores, a maior parte dos casos registrados ainda é relacionada a lideranças municipais.
"Entre janeiro e março, 54 vereadores (47,4%) e oito prefeitos (7%) sofreram algum tipo de violência. Ao somarmos com ex-prefeitos, ex-vereadores, ex-candidatos a vereador e funcionários da administração municipal, o número sobe para 80 episódios - 70,2% de todos os casos do trimestre", elenca o relatório.
Homens continuam sendo os mais atingidos, com 78,1% dos casos. Já a média de idade das vítimas reduziu de 50,4 para 44,6 anos. Outros dados descritos pelo relatório sobre o perfil de quem sofreu violência política são:
- 57,9% tinham ensino superior; 23,7% com ensino médio; e 14% com ensino fundamental.
- 59,6% se declara brancas; 22,8% pardas; e 10,5% pretas.
Quanto aos partidos políticos, pelo menos 24 foram atingidos neste ano por episódios violentos - em alguns casos não foi possível identificar a filiação partidária. Os três mais atingidos foram PT, com 22 casos, e PP e PL, com nove casos cada.
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Violência política de gênero
O relatório não traz dados específicos sobre os casos de violência política de gênero. Apesar disso, o texto chama atenção para o aumento de 5,1% dos casos de violência contra lideranças femininas.
O Diário do Nordeste indagou o Ministério Público Federal (MPF) sobre qual o número de denúncias recebidas relacionadas à violência política de gênero, desde que esta foi criminalizada, em 2021.
Segundo o órgão, desde então, foram abertos 117 procedimentos relacionados ao tema. Canal de denúncias foi criado, no âmbito do órgão, para ser possível processar estas denúncias feitas por mulheres vítimas desse tipo de violência.
Esta é uma das iniciativas do Grupo de Trabalho sobre o tema, do qual também participaram integrantes da Procuradoria da República, representantes da Câmara dos Deputados, do Senado Federal, do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, da sociedade civil e de organismos internacionais como as Nações Unidas.
Entre os procedimentos abertos no MPF, apenas um dos casos faz referência ao Ceará. Tipificado como violência "econômica e estrutural", o caso se refere à suspeita de fraude à cota de gênero que teria sido cometida pela chapa de candidatos do PTB à Assembleia Legislativa.
"Além desses, há casos que foram encaminhados diretamente às promotorias eleitorais (MP Estadual), sem a necessidade de abertura no MPF", explica o órgão.
Coordenador do Centro de Apoio Operacional Eleitoral, órgão vinculado ao Ministério Público do Ceará, Emmanuel Girão relata que, nas promotorias eleitorais, ainda são poucas as denúncias recebidas. "São poucos os casos que chegam ao conhecimento do Ministério Público. (As denúncias) Para desaguar, seja no MP ou no Judiciário, ainda são poucas", afirma.
Uma delas, foi o caso do vereador de Russas que atacou as deputadas estaduais do PT, Larissa Gaspar, Jô Farias e Juliana Lucena. Ainda em abril, logo após o episódio de violência, a Promotoria da 9º Zona Eleitoral acolheu Notícia-Crime contra o parlamentar e ingressou com Ação Penal Eleitoral para apurar o caso.