Idosos sem agendamentos procuram pontos de vacinação, mas não recebem 2ª dose por falta de vacina
Fortaleza só tem estoque de vacinação de CoronaVac para aplicar nos idosos agendados
A paralisação da vacinação com a CoronaVac em Fortaleza surpreendeu quem estava à espera do reforço do imunizante contra a Covid-19 nesta quinta-feira (29). Mesmo sem agendamento, muitos idosos que receberam a primeira dose e estavam com data-limite marcada para hoje procuraram os pontos de imunização na Capital, porém não foram atendidos.
Conforme a titular da Secretaria Municipal da Saúde (SMS), Ana Estela Leite, o estoque disponível em Fortaleza nesta quinta conseguirá atender apenas parte do público. A gestora da Pasta municipal afirmou que 11 mil pessoas a partir de 60 anos serão vacinadas hoje e orientou que quem não estivesse agendado para esta quinta ficasse ao aguardo de chamado da SMS.
A SMS, inclusive, chegou a divulgar nova recomendação na noite dessa quarta-feira (28) por estar com o estoque reduzido. A partir de então, somente os idosos agendados deveriam ir aos pontos de vacinação.
Diversos idosos, contudo, seguiram as orientações prévias da própria Secretaria, a qual indicava que, no caso do paciente não ser agendado até a data-limite — escrita no cartão de vacinação após o recebimento da primeira dose —, ele poderia buscar um ponto em que a segunda vacina fosse oferecida.
Esse foi o caso da costureira Maria do Carmo Xavier, que se dirigiu com a filha ao drive-thru de vacinação do shopping RioMar Kennedy nesta quinta. "Eles disseram que ela deveria vir hoje", relata a filha da idosa, a advogada Hellen Joice, afirmando ter recebido essa informação pelo "telefone do Governo" às 22h30 dessa quarta-feira. "Quando a gente chegou aqui, eles disseram que só vão vacinar se o nome estiver na lista".
"Eu informei que o nome dela não estava na lista, e eles informaram que ela tinha de vir hoje", ressalta, destacando que tem o protocolo da ligação. Aos prantos, a filha da costureira se sente desesperada em razão da falta do reforço: "Muito difícil".
A situação é a mesma da idosa Regina Célia da Costa. Com o dia 29 de abril estampado como data-limite em seu cartão de vacinação, ela também foi ao RioMar Kennedy nesta quinta em busca da segunda dose. De acordo com a idosa, ela recebeu a orientação antiga da Secretaria em um posto de saúde.
"A segunda dose podia ir em qualquer posto onde tivesse saindo a vacina. Cadê?", indaga a idosa, acrescentando que buscará o reforço da CoronaVac no Centro de Eventos do Ceará, outro ponto de vacinação.
Bastante decepcionada, a idosa Helena Moreira Lima, com data-limite marcada para esta quinta-feira, também não conseguiu obter a segunda dose no RioMar Kennedy. "Pelo que os cientistas e laboratórios dizem, se passar dos 28 dias da primeira dose, a segunda dose já não tem validade", diz, indicando que centenas de pessoas estão na mesma situação no ponto de imunização.
"E aí, como que a gente vai fazer se a orientação aqui é só vacinar quem está na relação?", questiona.
Centro de Eventos
Já no Centro de Eventos, a situação foi distinta. O ponto de vacinação segue com organização e sem muitas aglomerações, apesar de registrar longa fila de carros. Entretanto, a imunização estava ocorrendo de modo diferente do indicado pela SMS na noite dessa quarta, segundo profissionais da saúde que estão ministrando as vacinas no local.
Uma trabalhadora da saúde que não quis se identificar afirmou, ao Sistema Verdes Mares, que recebeu a informação sobre a mudança de protocolo apenas no fim desta manhã. Em razão disso, eles vacinaram, até então, pessoas com a data-limite agendada para hoje, contrariando a nova esquematização da Pasta municipal.
Agora, após a informação ser repassada aos profissionais, a aplicação da segunda dose só está ocorrendo a quem estava agendado para hoje. A mudança de protocolo gerou transtornos a alguns presentes no ponto de vacinação.
Por volta das 10h, o advogado José Bonifácio de Macêdo Filho foi ao Centro de Eventos com a mãe, a aposentada Vera Lúcia Macêdo, 67 anos, cuja data-limite estava marcada no cartão para esta quinta-feira, mas não foi agendada. Seguindo a orientação anterior da SMS, eles foram ao local para receber o reforço.
Segundo o advogado, a entrada da mãe e de outras pessoas foi permitida pela coordenadora de imunização do Centro de Eventos. Assim, eles foram para a fila e esperaram por duas horas até chegar a vez de Vera Lúcia.
No entanto, na hora em que a aposentada receberia a segunda dose, a coordenadora impediu a vacinação por ela não estar na lista de agendados para hoje, já seguindo o novo protocolo determinado.
De acordo com José Bonifácio, outras pessoas na mesma situação da mãe dele chegaram a receber a vacina antes da mudança de orientação. Depois de Vera, houve mais pessoas impedidas, e uma grande aglomeração se formou no local.
Em razão do contratempo, o advogado afirmou que seguirá buscando uma "solução" para a imunização da mãe no local. Caso não consiga, ele vai entrar com ação judicial contra os responsáveis pela vacinação, inclusive criminalmente.
O problema persistiu ao longo da tarde. O Sistema Verdes Mares registrou diversas pessoas discutindo com profissionais da saúde que atuam no local em devido à orientação de buscar o ponto de imunização com a data-limite indicada no cartão.
Sarto diz que Capital seguiu orientação nacional
Em post nas redes sociais na tarde desta quinta-feira (29), o prefeito Sarto Nogueira disse que Fortaleza tem capacidade atual de vacinar mais de 30 mil pessoas por dia, a depender, no entanto, da aquisição e envio dos imunizantes pelo Governo Federal.
"O plano de imunização contra a Covid-19 em Fortaleza segue as orientações do Ministério da Saúde, que recomendou a todos os municípios do Brasil a aplicação das doses disponíveis de CoronaVac, com a garantia de envio de novos lotes, o que não ocorreu no ritmo necessário", disse.
"Com isso, seguimos agora aplicando as doses em estoque de AstraZeneca e aguardamos o envio de mais vacinas CoronaVac para darmos continuidade à nossa estratégia de vacinação plenamente", concluiu o prefeito.
Validade da primeira dose
A Secretaria da Saúde do Estado (Sesa) informou, na última terça-feira (27), que quem perdesse o prazo estipulado para a segunda dose deveria concluir a vacinação mesmo assim. A indicação foi respaldada por nota técnica divulgada pelo Ministério da Saúde na segunda (26), o qual recomendou a aplicação mesmo depois do fim do prazo definido pelos fabricantes.
Na terça-feira, a Sesa orientou que os municípios avançassem com a segunda dose em vez de usar o estoque disponível para ministrar a primeira.
Mudança no esquema de vacinação
O Ministério da Saúde mudou os protocolos de vacinação no dia 21 de março. Na ocasião, houve autorização de que a reserva da segunda dose fosse utilizada para ampliar a vacinação dos públicos prioritários com a primeira dose.
A Pasta federal se posicionou dessa forma porque havia uma "regularidade" do fornecimento da CoronaVac, — situação que deixou de ocorrer posteriormente, segundo Ana Estela Leite. "Essa regularidade não aconteceu e essas doses não foram repostas como havia sido previsto pelo Ministério", pontua.
Atualmente, em razão da falta de estoque, a Capital tem 40 mil doses a menos do que o ideal.
Dificuldade de abastecimento
Na segunda-feira (26), o atual ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, indicou que havia dificuldades no fornecimento da segunda dose da CoronaVac devido a atraso na chegada de insumos oriundos da China. O problema foi reiterado nessa quarta-feira, quando o ministro informou que a entrega de novas doses estava prevista para o início de maio.
Estado avalia alternativas
Em nota divulgada pela Sesa nesta quinta-feira (29), a Pasta diz que "vem avaliando alternativas a fim de sanar os obstáculos que impactam diretamente no ritmo e rumo da vacinação, tais como: planejamento de aquisição de vacinas para incorporar nas ações de vacinação contra a Covid-19; solicitação de reajuste das metas ao MS e remanejamento de doses entre os grupos prioritários quando houver viabilidade".
No comunicado, o Estado reconhece que as metas estipuladas pelo Ministério da Saúde são subestimadas e não correspondem com a realidade dos municípios, reforçando a necessidade do fracionamento das doses em estoque.
"Diante dos envios em quantidades reduzidas, faz-se necessário o fracionamento das distribuições, visto que o esquema de vacinação corresponde a duas doses (D1 e D2), ocasionando em escassez de vacinas para avançar nas fases de forma homogênea", diz.
Ainda conforme a Sesa, o problema se agrava pelo fato de alguns municípios usarem doses enviadas para segunda dose como primeira, não seguindo a recomendação quanto à reserva das doses para completar o esquema de imunização.