Edifício São Pedro não será tombado; decisão abre caminho para demolição

Prefeitura de Fortaleza formalizou o indeferimento do tombamento definitivo do prédio histórico

A história do Edifício São Pedro, na Praia de Iracema, em Fortaleza, está próxima de um desfecho. Envolto em dilemas, o tombamento definitivo do bem, apesar de aguardado, foi indeferido pela Prefeitura. A decisão do prefeito Sarto Nogueira (PDT) pelo não tombamento, oficializada em decreto no Diário Oficial do Município desta quinta-feira (19), baseia-se na atual condição da estrutura do prédio e abre caminho para que os proprietários particulares executem a demolição do imóvel.

Erguido em 1951, o São Pedro foi o primeiro da orla da Capital com mais de um andar e hoje está extremamente deteriorado. 

O tombamento provisório do São Pedro é mencionado pela gestão municipal formalmente desde 2006, no decreto 11.960. Em 2015, a portaria 31/2015 da Secretaria da Cultura de Fortaleza (Secultfor) o reiterou. Mas, após anos de espera, a avaliação é de que a manutenção da estrutura é inviável, e a proteção, portanto, não foi consolidada - conforme o decreto 15.096/2021. 

Motivos alegados pela Prefeitura

Segundo o decreto, "constata-se que o imóvel Edifício São Pedro possui inúmeras patologias em alto grau, notadamente em sua estrutura de concreto armado, sendo inviável economicamente recuperar a estrutura do imóvel, conforme Relatório nº 0142/2018, exarado pelo Grupo de Pesquisa em Materiais de Construção e Estruturas,
da Universidade Federal do Ceará – GPMATE/UFC."

Ainda conforme o texto, "o processo de reparo do imóvel, para além da inviabilidade técnica e econômica, demonstra-se incompatível com a preservação do bem, por implicar, necessariamente, mutilação e destruição da estrutura do imóvel."

O que diz o proprietário

“Todas as vistorias no prédio apontam que ele não tem mais condições de ficar em pé. Exauriu o plano de vida dele e é notório que ele oferece riscos para as pessoas que passam por perto”, ressaltou, em entrevista ao Diário do Nordeste na última segunda-feira (16), um dos proprietários do Edifício São Pedro, Francisco Philomeno Junior. Rumores sobre o cancelamento do tombamento circulavam desde o início da semana.

De acordo com ele, a decisão da Prefeitura está conectada às evidências já constatadas pelos proprietários, por técnicos e estudiosos da área de patrimônio. “Estrutura chegou à exaustão", reiterou. 

Philomeno já havia explicado que, constatada a impossibilidade de continuar com o prédio erguido, "o prefeito estaria disposto a dar por encerrado o processo de tombamento e com isso o prédio estaria liberado para a demolição". 

Questionado sobre como ocorrerá a demolição e os planos de uso para a área, ele afirmou que há diversos planos para a área. Contudo, explicou que cumpre etapas e, como empreendedor, “fica difícil até planejar um projeto novo” já que “meia dúzia de projetos já foram apresentados e até hoje (a Prefeitura) não se manifestou. Certamente, vamos achar uma solução porque é um terreno de potencial infinito”. 

Dilemas de um bem não tombado

Com o tombamento provisório estabelecido pela gestão municipal, o São Pedro tinha o mesmo status, no sentido da necessidade de conservação, dos imóveis tombados definitivamente na Capital. Mas, na prática, a estrutura do edifício de oito pavimentos, se perde a cada dia.

No decorrer nos últimos anos, inúmeros foram os debates sobre o uso e o futuro do imóvel. Poucos foram os consensos entre proprietários e poder público nesse processo.  

Os impasses fizeram o Edifício São Pedro, que já abrigou o Hotel Iracema Plaza e tem a estrutura parecida com a de um navio, protagonizar, no decorrer das últimas décadas, os dilemas da ausência de um tombamento definitivo, as perdas das características, e a transformação em ruínas. 

Em abril de 2021, o imóvel foi cenário de uma situação trágica e extrema, quando uma jovem grafiteira de 23 anos morreu no local, após parte da estrutura do prédio ceder. 

Tombamento em Fortaleza

Para ser tombado em Fortaleza, o bem precisa passar pela análise do Conselho de Proteção ao Patrimônio Histórico e Cultural (Comphic). Na Capital, a Lei 9.347/2008, que rege os processos de proteção do patrimônio histórico-cultural e natural, não impõem um prazo para Secultfor avaliar e apresentar um parecer quanto às solicitações de tombamento. Mas, determina que, após a solicitação, os estudos técnicos para elaboração da Instrução de Tombamento devem ser executados em seis meses. 

Impasses e decisões

Em 2015, mesmo ano da publicação da portaria de tombamento provisório do São Pedro, os proprietários submeteram à Secretaria Municipal do Urbanismo e Meio Ambiente (Seuma) um projeto de incorporação de uma torre, com 95 metros no centro da edificação. Em 2018, o Conselho de Preservação do Patrimônio Histórico e Cultural (Comphic) reviu a instrução de tombamento do São Pedro, após a proposta em uma área que na instrução de tombamento era preservada. 

A instrução, necessária em todos os processos de tombamento, contém a descrição e documentação do bem, a justificativa, a delimitação da preservação do entorno e os parâmetros de usos. O projeto idealizava uma torre a ser incorporada ao São Pedro que funcionaria como hotel, mantendo os apartamentos periféricos à área central. 

Com a revisão, o Comphic, à época, deu permissão para intervenções no edifício, desde que respeitados, prioritariamente, os aspectos da fachada, já que a instrução de tombamento estabelecia duas zonas de preservação: uma "rigorosa", na fachada, e outra "diferenciada", no meio da edificação. A intervenção foi defendida como o único caminho para justificar um investimento econômico na restauração do edifício. 

Mas, o projeto não teve continuidade. Em setembro de 2018, o Ministério Público solicitou à Justiça e teve decisão favorável para que a Prefeitura fosse proibida de conceder permissão de demolição, destruição ou mutilação da estrutura do São Pedro.

Em 2021, provocada novamente pelo MPCE, a Justiça estabeleceu que os proprietários deviam providenciar a vigilância diuturna do imóvel.