27 de janeiro, Forró do Gago, bairro Cajazeiras, em Fortaleza. Nessa data, ainda na madrugada, no ano de 2018, uma festa era interrompida por tiros. Correria e vítimas por todos os lados. O episódio ficou conhecido como Chacina das Cajazeiras. Cinco anos depois, na noite desta sexta-feira (27), os sons ouvidos no local serão de louvores a Deus. Um cenário de paz e fé.
O local em que funcionava o Forró do Gago, na Rua Madre Tereza de Calcutá, virou o Santuário da Palavra de Deus, há quase 5 anos. "A igreja acolhe as famílias e traz uma tranquilidade para as pessoas, que ficaram assustadas. Quando a gente chegou aqui, poucas pessoas andavam nessa rua. E a igreja chega também para consolar as famílias que foram atingidas", explica o pastor César Serafim.
Tem uma irmã que congrega com a gente, que perdeu o esposo, na Chacina. Essa é a nossa função, acolher as pessoas, tentar ajudar, trazer uma nova expectativa."
A ideia não foi aceita de imediato. Mas, aos poucos, o local virou ponto de encontro e união para a comunidade. "Tinha uma igreja aqui perto, na minha rua. Quando aconteceu isso (a Chacina), a gente decidiu vir para cá, falou com o proprietário. Claro que, no começo, teve uma resistência, as pessoas tinham medo de vir para a igreja. Mas a gente foi conversando, mostrando para as pessoas que não precisavam temer. A igreja é importante para trazer um consolo, um refrigério, a partir da palavra de Deus", conta o pastor.
A comunidade em volta ainda guarda cicatrizes profundas provocadas pela matança ocorrida em 2018. Os moradores fogem de entrevistas e ficam angustiados ao ouvir a palavra "chacina". Querem esquecer aquele dia e seguir a vida. Os cultos no Santuário da Palavra de Deus, nas noites de quartas, sextas-feiras e domingos, são momentos de liberdade: lá as pessoas oram, cantam e externalizam suas emoções.
Sensação de segurança e pichações de facção
Moradores da Rua Madre Tereza de Calcutá que conversaram com o Diário do Nordeste, mas pediram para não serem identificados, afirmaram que se sentem seguros e que a criminalidade diminuiu bastante na região, após a Chacina das Cajazeiras - que deixou 14 mortos no Forró do Gago e entorno.
Contribuem, para a sensação de segurança, segundo a comunidade, a passagem com frequência da viatura da Polícia Militar do Ceará (PMCE), obras de qualificação viária (as ruas, antes sem pavimentação, agora têm piso intertravado) e melhorias na iluminação.
Entretanto, pichações indicam a presença de uma nova facção de origem cearense na região. O grupo criminoso em questão é formado por dissidentes de uma facção carioca, que antes dominava o tráfico de drogas naquele local.
A Chacina das Cajazeiras teve como autores integrantes de outra facção cearense (mais antiga), que tinha o objetivo de tomar o território da facção carioca, segundo as investigações policiais. A matança levou à prisão dos principais líderes da facção local.
Apesar da maior sensação de segurança, moradores da Rua Madre Tereza de Calcutá testemunharam um homicídio, ocorrido em uma rua próxima, há uma semana, no dia 20 de janeiro último.
Segundo a Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social do Ceará (SSPDS), "a vítima, um homem de 33 anos, com antecedentes por homicídio doloso, porte ilegal de arma de fogo, roubo a pessoa e três passagens por tráfico de drogas, foi lesionada em uma via pública, por disparos de arma de fogo".
"Além do DHPP (Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa, da Polícia Civil do Ceará), a Polícia Militar do Ceará (PMCE) e Perícia Forense do Estado do Ceará (Pefoce) estiveram no local da ocorrência. As investigações estão a cargo da 7ª Delegacia do DHPP", informou a Pasta.
Questionada na última terça-feira (24) sobre o policiamento na região onde aconteceu uma das maiores chacinas da história do Ceará, a Secretaria respondeu que "o patrulhamento da PMCE é realizado 24 horas por dia pelo Policiamento Ostensivo Geral (POG), Força Tática (FT) e motopatrulhamento do 19º Batalhão Policial Militar (19º BPM)".
"O bairro conta ainda com o reforço do Comando de Policiamento de Rondas e Ações Intensivas e Ostensivas (CPRaio) e Comando de Policiamento de Choque (CPChoque), que intensificam a segurança nos locais e horários de maior necessidade. No âmbito da Polícia Civil, o bairro é coberto pelo 13º Distrito Policial", completou.
Ainda de acordo com a SSPDS, houve "uma redução de 25% nos Crimes Violentos Letais e Intencionais (CVLIs) ocorridos no bairro, ao longo de 2022. Foram 6 registros, contra 8 em 2021".
O resultado positivo se estende para outros indicadores relacionados às Cajazeiras em 2022. Considerando as prisões e apreensões em flagrante realizadas no bairro, foram 77 capturas, contra 73 em 2021. O aumento nas capturas é estimado em 5,5%. Já sobre as apreensões de arma de fogo, a Geesp (Gerência de Estatística e Geoprocessamento, da Superintendência de Pesquisa e Estratégia de Segurança Pública) contabilizou um aumento de 5,6% em 2022. Foram 19 apreensões no período, contra 18 em 2021."
O bairro Cajazeiras integra a Área Integrada de Segurança (AIS) 7, que teve redução de CVLIs de "9,4%, durante 2022, com 116 mortes, contra 128 em 2021. Considerando as prisões e apreensões em flagrante realizadas no ano passado nos bairros da região, houve aumento de 11,7% com 1.187 capturas realizadas no período, contra 1.063 em 2021. Levando em conta as armas de fogo apreendidas na AIS 7, foram 272 apreensões, entre janeiro e dezembro de 2022. Em comparação com 2021, quando 221 armas foram retiradas de circulação, o aumento ficou em 23,1%".